Alexandre Nero volta ao horário mais nobre da Globo. Depois do sucesso de Fina Estampa no ano passado, ele volta nesta segunda, 12, à faixa das 21 h com Império. Duas novelas de Aguinaldo Silva e a segunda, que conta a saga do comendador, venceu o Emmy internacional em 2015. Em Fina Estampa, e contra todas as probabilidades, ele virou queridinho do público feminino – e do gay Crô – como o motorista Balthazar. Mais que machão, era machista, um troglodita que batia na mulher. José Alfredo também é machão, mas tem outro perfil.
Como o comendador, cria um império do nada. Inicia um processo sucessório que implode sua família. Império marcou o estouro do ator. “Veio como um tsunami, mudou muita coisa na minha vida. Foi meu primeiro protagonista, e ainda por cima no horário nobre da Globo. Isso mudou a perspectiva do público em relação a mim, que vinha de papéis secundários.” Virou uma loucura. “As pessoas passam a te seguir na rua, dormem na porta de casa, o assédio é permanente. O comendador se transformou em fenômeno de massa. Virou fantasia de carnaval. Entrou para o rol dos personagens eternizados pela dramaturgia.”
Nero experimentou algum incômodo ao interpretar esses machões de carteirinha? Bastava o texto de Aguinaldo ou ele fez alguma pesquisa? “Todos os personagens que faço têm coisas minhas. Muito do temperamento do comendador tem a ver com o meu, tanto o lado mais rude como o mais doce, até porque nenhum personagem é uma coisa só. Não quisemos desenhá-lo como herói ou vilão, mas como um personagem mais maduro, com todas essas contradições.” E ele acrescenta: “O texto é importante, a pesquisa de campo também, mas existem outros fatores – o figurino, a caracterização, os companheiros de cena, o set de gravação, a equipe, tudo importa.” E tem mais: “O comendador que a gente vê na novela é fruto daquela época, daquele meu momento. Há seis anos, eu ainda não tinha vivido a experiência de ser pai, então o comendador tinha muito do meu pai. Acredito que hoje ele seria diferente. Tudo o que a gente vive interfere de alguma maneira na criação dos personagens.”
José Alfredo tem um lado romântico, sensual muito forte. “Como todo bom folhetim, a novela conta a saga de um personagem que supera muitas dificuldades e vence na vida, mas tudo começa com uma história de amor que não se concretiza. No caso dele, esse amor não correspondido faz o personagem ir atrás de poder, de dinheiro, como compensação. E, na ausência desse amor, quase como uma vingança por ter sido rejeitado, ele acaba indo atrás de romances.” Império começa com um José Alfredo jovem, interpretado por Chay Suede. Fizeram algum laboratório para dar unidade ao personagem? “Fizemos um mês de preparação com o Eduardo Milewicz antes de iniciar as gravações. Foi muito intenso e transformador para todos nós do elenco, tanto para o Chay, que estava estreando na dramaturgia, como para o mestre Othon Bastos. Foi uma experiência incrível e reveladora para todos.”
Na origem de tudo, Curitiba. Foi onde ele nasceu – em 13 de fevereiro de 1970 – e se iniciou profissionalmente. “Todas as minhas referências artísticas continuam sendo de lá. Eu me transferi fisicamente para o Rio, mas continuo mantendo vínculos afetivos com a cidade e com meus amigos curitibanos.” Antes de ser ator, a música era seu ofício, ainda no Paraná. “Foi ela que me levou para o teatro e, depois, para a TV. Talvez por isso cantar e atuar são coisas que sempre estiveram juntas, entrelaçadas. Quando atuo, o texto é música. Tem ritmo, melodia. E, enquanto músico, quando estou no palco, também estou atuando ” Seu entendimento do texto é totalmente musical. “Nunca consegui separar as coisas.” Como foi cantar com o rei no especial de Roberto Carlos? “Foi um presente que o comendador me deu.”
Antes das novelas, o cinema. Papéis que foram crescendo de intensidade e tamanho, até chegar a João, o Maestro e Albatroz. A par dos dramas, Nero fez também comédia – Crô. A comédia exige timing, o drama parece vir mais de dentro. Onde se sentia mais à vontade? “Acho que depende muito de cada projeto, de como se quer surfar em cada um deles e até avaliar se queremos surfar ou mergulhar. A comédia também vem de dentro, o drama também tem timing. E timing é tempo, é musical, são coisas que se misturam. A gente vai aprendendo a surfar trabalhando, experimentando, e já são muitos anos de experiência, no meu caso.”
Lilia Cabral é parceira em Império. “Foi minha terceira novela com ela. Lilia foi parceira em A Favorita, minha estreia na TV, aos quase 40 anos de idade. Devo muito da repercussão desse personagem a ela, à maneira generosa como Lilia me acolheu.” E como ele vê seu retorno, pela segunda vez, ao horário nobre? “Está sendo uma surpresa. A Globo tem um acervo gigantesco de novelas que caíram no gosto popular. Fico feliz por terem escolhido Império. Vai ser bem interessante revê-la seis anos depois.” Reconhece que deve muito à coragem do autor – Aguinaldo Silva – que o bancou no papel de protagonista.
“Ele enxergou no meu trabalho o comendador que queria e apostou que daria certo, apesar de ser um personagem bem mais velho do que eu, de uma realidade completamente diferente da minha e do que já tinha feito na TV. O mais curioso é que nunca conversamos, nem antes, nem depois da novela. O comendador foi meu elo de conexão com o Aguinaldo.”
Cem por cento isolado com a família no início da pandemia, Nero foi vivendo uma abertura gradual, mas segura, quando os filhos voltaram à escola e recomeçaram as gravações de Nos Tempos do Imperador. “Temos procurado nos manter bem, física e mentalmente Quando escrevo, escrevo música e tenho me dedicado à produção de um disco, que será meu quarto solo. O plano é lançá-lo ainda este ano.” Num novo normal, qual a primeira coisa que ele gostaria de fazer? “Encontrar os amigos, abraçar, dar risada. E também levar meus filhos ao parque, deixar que façam muita bagunça.”