Criada em 280 a.C. por Ptolomeu I Sóter (o Salvador), nas proximidades do palácio real, a Biblioteca de Alexandria contou com o visionarismo do filósofo Demétrio de Falera que, interessado em tornar Alexandria uma rival cultural de Atenas, expôs ao soberano Ptolomeu que este só seria um bom governante se conhecesse melhor o povo por ele governado e as obras sobre como exercer o poder. Constituída por duas coleções, a maior, e principal, foi construída no século III a.C., no interior do Mouseion (ou Templo das Musas), ao passo que a menor foi criada um século depois, no interior do Templo de Serápis, deus egípcio helenizado e protetor de Alexandria, ambas no Bruquíon, parte da cidade onde estavam os palácios reais.
Durante sete séculos, entre os anos de 280 a.C. a 416 d. C., a Biblioteca de Alexandria, partindo dos 200 rolos iniciais, chegou a acomodar mais de 700.000 rolos em volumes diversos, reunindo o maior acervo de cultura e ciência da Antiguidade. Ainda que esse número não signifique o total de obras, uma vez que, uma mesma obra podia ter vários rolos, seu acervo foi formado desde a aquisição, pelo rei, de todos os papiros e rolos possíveis a bibliotecas inteiras. Já em casos de manuscritos raros, ou originais estrangeiros, encontrados em navios, a ordem real era clara: que fossem apreendidos e levados à biblioteca para que deles fossem providenciadas cópias. Prontas, estas eram devolvidas aos donos, acompanhadas de certa quantia em dinheiro, enquanto que o original era confiscado para a biblioteca.
De acordo com historiadores, a Biblioteca de Alexandria, em sua organização física, foi planejada de forma muito especial, com as estantes circundadas por colunas abertas expostas a brisa, formando corredores cobertos nos quais seus freqüentadores podiam realizar estudos e discussões. Sua organização? Etiquetados os rolos com os nomes dos autores e os títulos das obras, os mesmos eram dispostos em pilhas para consulta. Em que foi inspirado tal projeto? Segundo especialistas, na biblioteca escolar de Aristóteles, uma das mais importantes, senão a mais importante, bibliotecas de Alexandria. No Liceu que fundou em Atenas, Aristóteles, interessado em agrupar, junto aos livros, tanto sábios quanto alunos, de forma a estes dois últimos colaborarem de forma útil para com o progresso da ciência, promoveu uma aproximação estratégica entre a escola e tal espaço intelectual. Demétrio de Falera, ampliando esse projeto, visualizou seus possíveis frutos: o Museu e a Biblioteca de Alexandria, marcos pontuais da história da humanidade.
Os bibliotecários da Biblioteca de Alexandria? Renomados humanistas e filólogos que, encarregados da tutoria dos príncipes, ao organizarem as obras, a eles orientavam a leitura das mesmas, moldando o gosto da realeza. Exemplos? Zenótodo de Éfeso, Apolônio de Rodes, Erastótenes de Cirene, Apolônio Eidógrafo, Aristarco de Samotrácia, Aristófones de Bizâncio e, certamente, o mais importante e sábio de todos, Calímaco de Cirene
Os incêndios que a destruíram? Quatro. Em 48 a.C, quando Júlio César, cercado no palácio real, incendiou os barcos ancorados no porto em defesa de sua amante, Cleópatra, ocasionando que o fogo se espalhasse e atingisse os armazéns e a biblioteca do Mouseion, destruindo 40 mil rolos de uma só vez. Em 272 d.C, quando o Imperador Aureliano, em guerra contra a famigerada Zenóbia, Rainha de Palmira, devastou o Bruquíon. Em 392, quando o Imperador Teodósio I, ajudado por Teófilo, Patriarca de Alexandria, arrasou-a juntamente com outros edifícios pagãos. E em 642, pelos muçulmanos, sob a chefia do Califa Omar I, informação, esta, contestada por outros historiadores, os quais atribuem este feito ao bispo Teófilo, que, em 392 aproximadamente, vendo-a apenas como um depósito de maldades pagãs e do ateísmo, mobilizou a multidão cristã para demoli-la.
Seu legado? Em sua longa permanência na história, ao todo, cerca de seis séculos, a Biblioteca de Alexandria tornou-se um exemplo de resistência dos que preservam o conhecimento e dos que lutam contra a intolerância. Exemplos estes cujo fascínio motivou a inauguração, em meados de 2002, da Nova Biblioteca de Alexandria, reconstruída pela iniciativa do governo do Egito em parceria com a UNESCO.