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Violência nas unidades de saúde

Adalberto Luque

Noite de sexta-feira, 19 de maio. O acompanhante de um paciente inicia uma série de agressões contra funcio­nários na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Norte, localizada no bairro Adelino Simioni, em Ribeirão Preto.

Por volta de 23 horas, um segurança do local teria pedi­do ao homem que se retirasse de uma área destinada exclu­sivamente a pacientes da uni­dade de saúde. O homem, in­conformado e alterado, inicia uma discussão. Em seguida, parte para a agressão.

Tenta chutar o segurança duas vezes. Alguns funcioná­rios chegam ao local e outros pacientes tentam intervir. O homem segue em suas tenta­tivas, até que se desvencilha e parte para cima do segurança novamente.

A luta continua até que ele apanha uma cadeira e arre­messa na direção do seguran­ça. A cadeira atinge uma por­ta de vidro, que se estilhaça. A Polícia Militar foi chamada e o homem acabou detido. Felizmente ninguém se feriu e o atendimento aos pacien­tes não foi prejudicado. Toda a ação foi filmada pelo celular de uma pessoa que aguardava atendimento.

Nesta mesma UPA Norte, no dia 30 de janeiro, outro homem já havia quebrado a porta de vidro. Inconforma­do com a demora no aten­dimento, ele teria chutado a porta, que se estilhaçou. O homem acabou preso e foi levado para a Central de Polí­cia Judiciária (CPJ), no Cen­tro de Ribeirão Preto, onde o delegado estipulou fiança de R$ 1,3 mil, mas por não pa­gar, continuou detido.

UPA Leste: excesso de pacientes, demora no atendimento e casos de depredação

Aumento
Os casos registrados na UPA Norte não são exclusi­vidade daquela unidade de saúde. Somente nos últimos dois meses, as UPAs, geridas pela Fundação Santa Lydia, registraram o total de oito ocorrências. São casos de agressão e ameaça a funcio­nários das unidades e outros onde acompanhantes ou pa­cientes depredaram o patri­mônio público.

A UPA Leste, na avenida 13 de Maio, registrou uma ocorrência entre abril e maio. Já as UPAs Norte (Si­mioni) e Sul (Vila Virgínia) registraram dois casos cada uma. A que mais ocorrências registrou foi a UPA Oeste, no Sumarezinho, onde ocor­reram três casos de agres­sões/ameaças a funcionários ou depredação.

Nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e Unidades Básicas Distritais de Saú­de (UBDSs) a situação não é diferente. São relatos de ameaças, agressões verbais, portão quebrado durante ato de fúria, furtos, tentativa de assalto e por aí a violên­cia prossegue, assustando médicos, funcionários da saúde em geral, seguranças, pacientes e acompanhantes.

Rompendo fronteiras
O crescimento da violên­cia, todavia, não se limita a Ribeirão Preto. A situação vem rompendo fronteiras. Segundo estudo da Asso­ciação Paulista de Medici­na (APM), a maioria das agressões é verbal (70%). São casos de xingamentos e ofensas. Já os ataques físicos correspondem a 15% dos re­latos e as ameaças a 12% das ocorrências.

De acordo com a pesqui­sa, familiares dos pacientes são responsáveis por 50% dos casos de agressões. Já os pró­prios doentes acabaram ata­cando alguém em 43% dos registros. A principal justifi­cativa, segundo a pesquisa da APM, é a demora no atendi­mento ao paciente. Casos em que o paciente discorda do atestado de comparecimento representam 21%.

Entre as questões obser­vadas na pesquisa, a violência de pacientes que pediram en­caminhamento, procedimen­to ou exame que os médicos julgaram desnecessários está no topo das queixas. Em ou­tros casos, pacientes criaram conflitos tentando furar filas.

A pesquisa constata que a maioria das agressões ocorre em alguma unidade do Sis­tema Único de Saúde (SUS). São 70% dos casos, sendo 41% em hospitais e 29% em postos de saúde. Outros 22% dos registros ocorreram em hospitais privados e 6% em consultórios particulares.

O número de agressões está diretamente ligado ao sucateamento da saúde, alerta a advogada Amanda Bernardes

Sucateamento da saúde pública
Segundo a advogada Aman­da Bernardes, especialista em defesa médica, o progressivo aumento das agressões é di­retamente proporcional ao aumento das dificuldades da própria saúde pública.

Ela explica que o profis­sional de saúde fica na linha de frente de todo e qualquer problema relativo à falta de es­trutura básica do atendimento público de saúde, como a falta de medicamento, por exemplo.

“Ainda, temos o baixo número de profissionais con­tratados, que acaba deixando as portas do PS [Pronto So­corro] lotadas, isso somado à expectativa e ao momento crítico que as famílias vi­vem, tendo seu parente ali, passando mal e aguardando atendimento, torna-se uma verdadeira bomba relógio. O número de agressões sem dúvida está diretamente liga­do ao sucateamento da saúde pública e, até mesmo, parti­cular, como nos atendimen­tos feitos via planos de saúde”, avalia Amanda.

A advogada enumera as principais condutas que de­vem ser adotadas por médi­cos e funcionários da saúde em geral.

“Agressão verbal ou amea­ça: evite discussão. Não perca sua razão. Neste momento de ânimos aflorados, será im­possível qualquer concilia­ção. No entanto, caso consiga contornar a situação, ao tér­mino do atendimento, redija todo o ocorrido em prontuá­rio. Se não for possível termi­nar o atendimento, retire-se do consultório [no caso de médico], vá para a recepção ou local com aglomeração de pessoas ou equipe. Hoje em dia temos a facilidade do celular, então, de imediato, quando possível, grave.”

A advogada orienta a sempre constar nomes de testemunhas. No caso de agressões físicas, ela aconse­lha a evitar o contato físico e, se necessário, requisitar ajuda de seguranças, outros profissionais e pacientes e que tudo conste em livro de ocorrências. “Em seguida, entre em contato com seu advogado, para ser correta­mente orientado dos próxi­mos passos, como boletim de ocorrência”, informa.

“Procure o resguardo de seus direitos em qualquer tipo de agressão. O paciente não tem direito de ofender a honra, a imagem e/ou o físico do profissional, seja qual for o fundamento. Não se deve mais admitir passividade. As omissões têm consequências maléficas. Um círculo perni­cioso é formado, onde cada vez mais profissionais da saú­de são agredidos/ofendidos por pacientes, na certeza de não haver represálias”, con­clui Amanda.

Combate à violência
Por mais que um pacien­te ou acompanhante possa se irritar com a demora de um atendimento médico de ur­gência ou emergência, nada justifica atitudes de violência. E a Secretaria Municipal da Saúde de Ribeirão Preto tem procurado combater isso.

Jane Aparecida Cristina, secretária municipal da Saúde: respeito aos servidores

A Coordenação de Aten­ção Primária à Saúde do Departamento de Atenção à Saúde das Pessoas (DASP) reúne os casos de violência notificados em uma planilha do grupo Saúde Mais Segu­ra, onde o departamento ali­menta, através de e-mails en­caminhados pelas unidades de Saúde quando surgem tais ocorrências.

Além do Saúde Mais Segu­ro, a secretaria está realizando um estudo para modernizar e diversificar os dispositivos utilizados nas unidades de saúde, para melhorar no sen­tido de minimizar situações que possam incorrer em ques­tões de segurança.

Durante as constantes reu­niões, são discutidos temas como instalação de câmeras de vigilância nas unidades de saúde, mais vigilantes e cam­panhas de conscientização junto à população, sobretudo os usuários das unidades do município.

“É importante que a po­pulação tenha o entendi­mento da necessidade da preservação do bem públi­co, visto que os mesmos são para o benefício das pessoas que dependem do SUS, as­sim como o respeito aos ser­vidores da saúde”, observa a secretária municipal da Saú­de de Ribeirão Preto, Jane Aparecida Cristina.

Polícia para quem precisa
Além das agressões e ame­aças, ocorrências de furtos e vandalismo têm assustado os funcionários. No dia 12 de maio, por exemplo, uma funcionária da UBS da Vila Tibério foi vítima de uma tentativa de furto no es­tacionamento da unidade. Dois homens tentaram levar celular e outros objetos, mas fugiram assustados após a mulher gritar por ajuda.

A Polícia Civil tomará providências, garante o diretor do órgão na região, Jorge Amaro Cury Neto

Nesta mesma unidade, no dia 28 de março, um homem teria dito que voltaria no dia seguinte para atirar contra as pessoas por conta de um agendamento que ele não conseguiu concluir. Até um bilhete anônimo ameaçando servidores foi deixado em outra unidade.

Furtos de celular também ocorrem em grande quantidade. Além disso, furtos de fios de ele­tricidade, aparelhos de ar-condi­cionado, grades de ralos da rede fluvial e torneiras estão entre os casos anotados pela pasta.

Nunca é demais lembrar que, em qualquer das situações descritas nesta reportagem, os autores estarão sujeitos às penalidades previstas em lei, seja o caso de furto, depredação, vandalismo, agressão ou ameaça. “Todo crime que for noticiado, a Polícia Civil tomará providência, dentro de suas atribuições legais”, lembra o delegado Jorge Amaro Cury Neto, diretor da Polícia Civil na região de Ribeirão Preto.

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