Proseando com meu amigo Giba do Pandeiro, ele disse: “Buenão, quero te dar um CD que é uma raridade, até porque acho que você não tem”. Respondi: “Será? Tenho tantas raridades, mas manda aí, quero ver.” E ele: “É um CD do Renato Teixeira em que o Sócrates canta uma música com ele.” Dei uma olhada pro pandeirista e devolvi: “Giba, meu parceiro, que eu saiba, Magrão nunca gravou com Renato Teixeira, sei que são amigos, mas gravar, pra mim é novidade”.
“Pois é, meu amigo”, disse Giba. Renato Teixeira compôs uma bela música onde cita as papagaiadas do Vicente Matheus, presidente do Corinthians na época, colocou o nome Vicente Pedra porque ele tinha pedreiras lá pras bandas do Tatuapé. Quando foi gravar, convidou o Doutor da bola pra cantar a segunda parte e olha que ele mandou bem, isso foi na época do Magrão no Timão.
Curioso como sou, sempre buscando novos causos, fui ouvir Renato Teixeira e ele, numa bela sacada, deixou sua criatividade passear pela letra, usou palavras que o presidente fazia uso em suas entrevistas, as confusões nos trocadilhos que Matheus falava, como “quem tá na chuva é pra se queimar”, “o pato é um bicho aquático e terráqueo”, “quero agradecer a Antártica pelas Brahmas que me mandou”.
Como diz Rolando Boldrin, Vicente Matheus era um caboclo “simprão”, foi pobre, mas a vida lhe sorriu, montou suas pedreiras no bairro do Tatuapé, naquele tempo ficava longe do centro da cidade de São Paulo. Corintiano como poucos, se aproximou dos antigões da diretoria, chegando à presidência do Timão por muitos anos.
Seu jeito de ser cativava até as torcidas adversárias. Lembro-me de uma vez quando o Corinthians veio jogar aqui em Ribeirão Preto, com o Comercial FC, eu estava na deliciosa sombra das sociais quando percebi um alvoroço lá embaixo, entre o alambrado e a arquibancada. Estiquei o pescoço e vi Vicente Matheus chegando e sendo aplaudido, estava acompanhado de diretores do Comercial, procurando a escada para a cabine de honra onde o clube recebe autoridades.
Jogando no Corinthians, o primeiro contrato do Sócrates estava vencendo e começou a demorada negociação da renovação com o pão duro Vicente Pedra. Toda a imprensa em cima e no dia que bateram o martelo, ao sair da sala do presidente, a pergunta era uma só: “Sócrates, por quanto você reformou?” Ele deu uma resposta curta e grossa: “Por mais do que preciso e menos do que mereço”.
Na mesma época, Matheus foi questionado se o Doutor poderia ser vendido para outro clube. Vicente Pedra foi incisivo: “Sócrates é inegociável, invendável e imprestável”. Matheus tornou-se amigo do Sócrates e todas as festas que dava em sua casa, o Magrão era convidado.
Numa delas, estavam na maior resenha, Matheus estava feliz e muito falante, chacoalhando seu copo de uísque com pedrinhas de gelo, quando o Doutor lhe perguntou: “Matheus, como foi seu casamento com a Marlene?” Ele deu enorme risada e se abriu: “A Marlene era minha secretária na pedreira e corintiana como eu, minha mulher estava muito doente, o tempo foi passando e sabe como é, eu comecei um rolinho com a Marlene, a gente só não assumia porque minha mulher não morria”.
E continuou: “Um belo dia, Marlene chegou pra mim e disse: ‘Vicente, estou ficando velha, você não pode me assumir, então decidi me casar com antigo namorado, e casou’”. Meses depois, a mulher do Matheus morreu, ele foi correndo atrás do marido da Marlene e foi logo falando: “Ô, fulano, minha mulher morreu e você sabe que eu e Marlene, a gente se gosta (simprão), daí vim ver quanto você quer pelo passe da Marlene!!!”
A resenha virou só risadas. Surpreso, o marido retrucou: “Mas o que é isso, seu Matheus?” O velho e teimoso espanhol continuou: “Vim falar com você primeiro porque, com certeza, a Marlene vem comigo.” Resumo da ópera: o caboclo ficou sem Marlene, mas se deu bem com o valioso passe (rsrrssr).
Abreijos amigos, sexta conto mais.