A Câmara de Vereadores de Ribeirão Preto deverá iniciar discussões para a criação do chamado “Orçamento Impositivo” na cidade. A proposta é encabeçada pelo vereador e presidente da Comissão de Orçamento e Finanças do Legislativo, Renato Zucoloto (PP). Ela tem como objetivo garantir que parte das emendas feitas pelos parlamentares – todos os anos -, no projeto de Lei que define a destinação do orçamento municipal, não sejam vetadas pelo prefeito e sejam obrigatoriamente cumpridas pelo chefe do Executivo.
Como o próprio nome diz, orçamento impositivo significa obrigatório. Portanto, o Executivo passaria a ser obrigado a executar as despesas propostas pelos vereadores através de emendas parlamentares. Só para exemplificar, no orçamento deste ano, aprovado no final de 2021, os vereadores apresentaram 201 emendas ao projeto encaminhado pela prefeitura, que prevê uma arrecadação de R$ 3.726.647.052. Entretanto, elas acabaram sendo vetadas pelo prefeito Duarte Nogueira (PSDB).
Apenas duas, que não tratavam de destinação de recursos foram acatadas. Segundo a prefeitura, a maioria das propostas eram inconstitucionais por vários motivos – 135 criavam despesas para o Executivo sem indicar a fonte de receita, 30 citavam como fonte de recursos “excesso de arrecadação”, onze traziam como fonte de recursos remanejamento de outras secretarias e encargos, 22 propunham a anulação de dotações de outras pastas e encargos e três referiam-se à incorporação de texto.
Vale lembrar que para ter validade o orçamento precisa ser votado e aprovado pela Câmara de Vereadores antes do início de cada ano fiscal. Ou seja, o orçamento deste ano precisou obrigatoriamente ser votado até o dia 31 de dezembro de 2021.
Regras rígidas
Para que o Orçamento Impositivo seja implementado em Ribeirão Preto é preciso inseri-lo na Lei Orgânica do Município (LOM), considerada a Constituição Municipal. É através dela que as cidades se organizam e está para o município como a Constituição Federal está para a União. Mudanças na Lei têm regras mais rígidas do que a de um projeto de lei convencional.
Tais modificações precisam, por exemplo, serem votadas em duas sessões extraordinárias – com intervalo de dez dias entre elas – e com exigência de maioria qualificada, ou seja, dois terços dos votos. No caso de Ribeirão Preto, que tem 22 vereadores, serão necessários 15 votos.
O debate sobre a implementação do orçamento impositivo no Brasil não é novo. Desde a redemocratização, surgiram várias propostas. Em 2015, o Congresso tornou obrigatória a execução de emendas individuais; e, em 2019, tornou impositivas emendas de bancadas, de comissões (permanentes e temáticas) e do relator do Orçamento.
Antes da aprovação do Orçamento Impositivo, em 2019, o Governo Federal, em tese, não era obrigado a destinar verba para essas emendas coletivas. A liberação de dinheiro era muitas vezes usada como “moeda de troca” pelo parlamento e por deputados e senadores para a aprovação de uma lei ou às vésperas de uma votação importante no Congresso.
A defesa de Zucoloto para o Orçamento Impositivo
Tribuna Ribeirão – A proposta de criação do Orçamento Impositivo tem de ser feita por emenda à Lei Orgânica?
Renato Zucoloto – Sim. A proposta de orçamento impositivo está disciplinada na Constituição Federal e na Constituição Estadual. Assim, pelo princípio da simetria das formas, entendo que o modo adequado e legal de ser veiculado esse instrumento, será através da Lei Orgânica Municipal.
Tribuna Ribeirão – É preciso concordância da prefeitura para implantá-lo?
Renato Zucoloto – Não. A alteração da Lei Orgânica Municipal é atribuição exclusiva do Poder Legislativo, estando disciplinada entre as competências privativas do ente federativo, através de seu Poder Legislativo. Assim, o Executivo não tem competência para, no processo legislativo de emendas à LOM, vetar ou fazer qualquer tipo de ingerência, cabendo ao próprio Poder Legislativo a sua promulgação.
Pelo princípio da simetria das formas, a Câmara poderá fazer as alterações, sem que isso tenha a participação do Executivo. Tanto a Constituição Federal quanto a Estadual tratam da matéria, razão pela qual, caso discorde o Chefe do Executivo, deverá se valer de Ação Direta de Inconstitucionalidade, o que acredito ser difícil de conseguir diante das previsões expressas nas legislações correlatas.
Tribuna Ribeirão – Existe previsão do valor que seria destinado por ano para cada vereador?
Renato Zucoloto – A Constituição Federal disciplina a matéria reservando o percentual de 1,2% da receita corrente líquida (Art. 166, § 11 da C.F.) e 0,3 %, na esfera estadual (art. 175, § 6.0, da Constituição Estadual), devendo metade desses valores ser aplicado, obrigatoriamente, em ações e serviços de saúde. Acredito que cada vereador poderia ter direito a R$ 1 milhão por ano em emendas.
Tribuna Ribeirão – A implementação do Orçamento Impositivo demoraria quanto tempo para ser viabilizada?
Renato Zucoloto – Inicialmente preciso tratar do tema com meus colegas vereadores e também com a Comissão Permanente de Orçamento e Finanças, da qual sou presidente. Lembro que este processo legislativo é bem mais rígido, devendo ser amplamente discutido com meus pares, que deverão ser consultados sobre a proposta.
Também gostaria de fazer uma audiência pública para discutir com a sociedade civil e com o Executivo porque, muito embora, não seja de sua competência, a ele cabe a execução orçamentária, sendo, portanto, conveniente que seja discutido com ele. Gostaria de esclarecer que o orçamento do Município é da ordem de R$ 3 bilhões e que hoje apenas o Poder Executivo detém o poder de estabelecer as prioridades e investimentos a serem feitos.
Os vereadores são eleitos e representam um percentual significativo da população, e não possuem nenhum poder ou ingerência sobre a destinação desses recursos. Por sua vez, o Poder Executivo não tem tido a sensibilidade de ouvir a Câmara Municipal, vetando sistematicamente todas as emendas que lhe são feitas. De outro lado, cabe ao Executivo a execução dessas emendas, de tal sorte que elas devem ser feitas com responsabilidade e com as devidas formalidades legais, sob pena de não poderem ser implementadas.
Entendo também que a transparência, tanto na sua formulação quanto na aplicação dos recursos, seja a ferramenta mais adequada para que a sociedade civil e a população possam acompanhar e fiscalizar esse importante instrumento que democratiza o orçamento municipal.