O papa Francisco anunciou nesta segunda-feira, 1º de julho, durante o Consistório Ordinário Público, a data de canonização de Irmã Dulce, que será celebrada em um domingo, 13 de outubro de 2019, no Vaticano, durante o Sínodo para a Amazônia. Ela se torna santa apenas 27 anos após seu falecimento. Só a santificação do papa João Paulo II, nove após sua morte, e de madre Teresa de Calcutá, 19 anos após o falecimento, exigiram menos tempo.
Irmã Dulce será a primeira santa nascida no Brasil, que até agora só tem um santo brasileiro de nascimento – Santo Antônio de Sant’Ana Galvão, o Frei Galvão. O pontífice também anunciou ontem a canonização de cinco beatos – John Henry Newman, cardeal, fundador do Oratório de São Filipe Néri na Inglaterra; Giuseppina Vannini (no século Giuditta Adelaide Agata), fundadora das Filhas de São Camilo; Maria Teresa Chiramel Mankidiyan, fundadora da Congregação das Irmãs da Sagrada Família e Margherita Bays, Virgem, da Ordem Terceira de São Francisco de Assis.
O papa Francisco autorizou a promulgação do decreto de canonização no dia 14 de maio, em audiência com o prefeito da Congregação das Causas dos Santos, cardeal Angelo Becciu, após o reconhecimento do segundo milagre da freira. Embora não tenham sido divulgados detalhes, a arquidiocese confirmou que o milagre seria a cura de uma pessoa cega, um baiano que mora no Recife, em Pernambuco.
Conforme o arcebispo, o milagre validado pelo Vaticano passou por três etapas de avaliação, incluindo o aval científico dado por peritos médicos, os pareceres de teólogos e a aprovação final pelo colégio cardinalício. “É importante ressaltar que uma graça só é considerada milagre após atender a quatro pontos básicos: a instantaneidade, que assegura que a graça foi alcançada logo após o apelo; a perfeição, que garante o atendimento completo do pedido; e a durabilidade e permanência do benefício e seu caráter preternatural, não explicado pela ciência”, informa.
O milagre é atribuído à intercessão da Beata Dulce Lopes Pontes (nome de batismo: Maria Rita Lopes de Sousa Brito), conhecida como Irmã Dulce – “O Anjo bom da Bahia”, recordada por sua obras de caridade e de assistência aos pobres e necessitados. Religiosa da Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, ela nasceu em Salvador em 26 de maio de 1914 e ali faleceu em 22 de maio de 1992.
O processo para o reconhecimento da santidade de Irmã Dulce foi iniciado em janeiro de 2000, quando os restos mortais da freira, que estavam na Igreja da Conceição da Praia, em Salvador (BA), foram transferidos para a Capela do Convento Santo Antônio, na sede das Obras Sociais Irmã Dulce, também na capital baiana.
Etapas
Depois do início do processo, em 2000, o papa Bento XVI reconheceu, em abril de 2009, as virtudes heroicas da Serva de Deus Dulce Lopes Pontes, autorizando oficialmente a concessão do título de Venerável à religiosa. O título é o reconhecimento de que Irmã Dulce viveu, em grau heroico, as virtudes cristãs da fé, esperança e caridade.
Em outubro de 2010, a Congregação para a Causa dos Santos, por meio de voto favorável e unânime de seu colégio de cardeais e bispos, atestou a autenticidade do primeiro milagre atribuído à Irmã Dulce, cumprindo, dessa forma, a última etapa do processo de beatificação. Já no dia 10 de dezembro de 2010, o papa Bento XVI autorizou a promulgação do decreto do primeiro milagre.
Irmã Dulce foi então beatificada no dia 22 de maio de 2011, em cerimônia realizada no Parque de Exposições de Salvador, reunindo mais de 70 mil pessoas. Na ocasião, a freira baiana foi coroada como a primeira beata nascida na Bahia e passou a se chamar Bem-aventurada Dulce dos Pobres, tendo o dia 13 de agosto como data oficial de celebração de sua festa litúrgica. Faltava apenas a validação de um segundo milagre para que a religiosa fosse então canonizada.
Trajetória
Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes nasceu em 26 de maio de 1914 em Salvador. Segunda filha do dentista Augusto Lopes Pontes e de Dulce Maria de Souza Brito Lopes Pontes, a menina que gostava de soltar pipa e jogar futebol manifestou o interesse pela vida religiosa no início da adolescência.
Segundo a instituição Obras Sociais, Irmã Dulce, por volta de 1927, aos 13 anos de idade, ainda adolescente, começou a atender doentes no portão de casa, conhecida mais tarde como “A Portaria de São Francisco”, tal a aglomeração de desassistidos.
Em 1933, a jovem ingressou na Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, no Convento de Nossa Senhora do Carmo, em São Cristóvão (Sergipe). No mesmo ano, recebeu o hábito e adotou, em homenagem à sua mãe, o nome de Irmã Dulce.
Em 1935, iniciou um trabalho assistencial nas comunidades carentes, sobretudo nos Alagados, conjunto de palafitas que se consolidara na parte interna do bairro de Itapagipe. Nessa mesma época, começou a atender também aos operários, criando um posto médico e fundando, em 1936, a União Operária São Francisco – primeira organização operária católica do estado.
Em 1939 ocorreu o fato que definiu o futuro de sua ação social: a invasão de cinco casas, na Ilha dos Ratos, para abrigar doentes que não tinham onde ficar. Dez anos depois, Irmã Dulce ocupou, com autorização da sua superiora, o galinheiro do Convento Santo Antonio (inaugurado dois anos antes), levando para lá 70 doentes.
A iniciativa deu origem à tradição oral propagada pelo povo baiano de que a freira construiu o maior hospital da Bahia a partir de um galinheiro. Em 1959, foi estabelecida oficialmente a Associação Obras Sociais Irmã Dulce e, no ano seguinte, inaugurado o Albergue Santo Antônio.
Doentes, albergados, deficientes e órfãos: o trabalho assistencial de Irmã Dulce que respirava com apenas 20% da capacidade pulmonar, atingiu proporções ainda maiores nas três décadas seguintes, sendo definido pela própria freira como “a última porta” a quem recorrem os menos assistidos.
Irmã Dulce morreu no dia 13 de março de 1992, aos 77 anos, no Convento Santo Antônio, ao lado de seus doentes. O túmulo da freira está na Capela das Relíquias, local para onde seus restos mortais foram transferidos após exumação, em 9 de junho de 2010. A visitação está aberta durante todos os dias, das sete às 18 horas. A capela fica no Santuário de Irmã Dulce, no bairro do Bonfim, em Salvador.