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USP – SÃO CARLOS – Pesquisadores criam luva que detecta pesticidas em alimentos

NATHALIA GOMES/USP

Cientistas da Universida­de de São Paulo – USP cria­ram um dispositivo sensor vestível embutido em uma luva de borracha sintética capaz de detectar resíduos de pesticidas em alimentos. O trabalho, apoiado pela Fundação de Amparo à Pes­quisa do Estado de São Pau­lo – Fapesp, foi idealizado e liderado pelo químico Paulo Augusto Raymundo-Pereira, pesquisador do Instituto de Física de São Carlos (IFSC).

O dispositivo tem três ele­trodos, localizados nos dedos indicador, médio e anelar. Eles foram impressos na luva por meio de serigrafia, com uma tinta condutora de car­bono, e permitem a detecção das substâncias carbendazim (fungicida da classe dos car­bamatos), diuron (herbicida da classe das fenilamidas), paraquate (herbicida incluí­do no rol dos compostos de bipiridínio) e fenitrotiona (inseticida do grupo dos or­ganofosforados).

No Brasil, carbendazim, diuron e fenitrotiona são empregados em cultivos de cereais (trigo, arroz, milho, soja e feijão), frutas cítricas, café, algodão, cacau, banana, abacaxi, maçã e cana-de-açú­car. Já o uso de paraquate foi banido no País pela Agência Nacional de Vigilância Sani­tária (Anvisa).

A análise pode ser fei­ta diretamente em líquidos, apenas mergulhando a ponta do dedo contendo o sensor na amostra, e também em frutas, verduras e legumes, bastando tocar na superfície da amostra.

Não há igual no mercado
Sergio Antonio Spinola Machado, professor do Insti­tuto de Química de São Car­los (IQSC) da USP e coautor da pesquisa, diz que não há nada semelhante no merca­do e que os métodos mais utilizados atualmente para detecção de pesticidas se ba­seiam em técnicas como cro­matografia (técnica analítica de separação de misturas), espectrofotometria (método óptico de análise usado em biologia e físico-química), eletroforese (técnica que uti­liza um campo elétrico para separação de moléculas) ou ensaios laboratoriais.

“No entanto, essas meto­dologias têm custo alto, de­mandam mão de obra espe­cializada e um tempo longo entre as análises e a obtenção dos resultados. Os sensores são uma alternativa às téc­nicas convencionais, pois, a partir de análises confiáveis, simples e robustas, fornecem informação analítica rápida, in loco e com baixo custo.”

Na luva criada pelo gru­po, cada dedo é responsável pela detecção eletroquímica de uma classe de pesticida. A identificação é feita na superfície do alimento, mas em meio aquoso. “Precisa­mos da água, pois é neces­sário um eletrólito [subs­tância capaz de formar íons positivos e negativos em so­lução aquosa]. Basta pingar uma gotinha no alimento e a solução estabelece o con­tato entre este e o sensor. A detecção é feita na interface entre o sensor e a solução”, detalha a química Natha­lia Gomes, pesquisadora do IQSC e integrante da equipe.

Sensores
O processo de verifica­ção de presença de pestici­das é simples. Coloca-se um dedo de cada vez na amos­tra: primeiro, o indicador; depois, o médio e, por últi­mo, o anelar. No caso de um suco de frutas, basta fazer a imersão dos dedos no líqui­do, um de cada vez. A detec­ção é feita em um minuto e, no caso do dedo anelar, em menos de um minuto.

“O sensor no dedo anelar usa uma técnica mais rápida. Ele é composto de um eletro­do de carbono funcionaliza­do, enquanto os dos outros dois dedos de eletrodos mo­dificados com nanoesferas de carbono [dedo indicador] e carbono printex, um tipo es­pecífico de nanopartícula de carbono [dedo médio]. Após a detecção, os dados são ana­lisados por um software ins­talado no celular”, explica Raymundo-Pereira.

O pesquisador ressalta que a incorporação de ma­teriais de carbono conferiu seletividade aos sensores, uma das propriedades mais importantes e difíceis de al­cançar em dispositivos seme­lhantes. “Uma escolha crite­riosa de materiais à base de carbono permitiu a detecção sensível e seletiva de quatro classes de pesticidas dentre os mais empregados na agricul­tura: carbamatos, fenilamidas [subclasse das fenilureias], compostos de bipiridínio e organofosforados. Assim, um dos diferenciais da invenção está na capacidade de detec­ção seletiva em presença de outros grupos de pestici­das, como triazinas, glicina substituída, triazol, estro­bilurina e dinitroanilina. Com os métodos tradicio­nais isso não é possível.”

Outro destaque do dis­positivo está na possibilida­de de detecção direta, sem exigir preparo de amostra, o que torna o processo rápido. Além disso, o método preser­va o alimento, permitindo o consumo após a análise.

A luva não tem prazo de validade e pode ser usada enquanto não houver da­nos nos sensores. Osvaldo Novais de Oliveira Junior, professor do IFSC e coautor da pesquisa, explica que os sensores podem ser danifi­cados por solventes orgâni­cos (como álcool e acetona) ou por algum contato mecâ­nico impróprio na superfí­cie do sensor (um objeto que o arranhe, por exemplo).

Mercado
Raymundo-Pereira salien­ta que o produto é inovador e que já está em andamen­to o processo de requisição de patente junto ao Institu­to Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). Ele afirma que não há um procedimen­to simples para a detecção de pesticidas, principal ra­zão pela qual os testes para discriminação de diferentes classes de pesticidas e outros contaminantes ainda não es­tão disponíveis no mercado. Para ele, o uso de dispositivos como a luva, que permitem a análise química de materiais perigosos in loco, seria rele­vante em aplicações alimen­tares, ambientais, forenses e de segurança, permitindo um rápido processo de tomada de decisão no campo.

“Representantes das agên­cias internacionais que fazem o controle da entrada de ali­mentos nos diversos países do mundo já usam luvas para manipulá-los. Imagine se ti­vessem um sistema de sen­soriamento de pesticidas em­butido? Alimentos contendo pesticidas proibidos seriam descartados já na fronteira. O dispositivo pode ser usado durante a colheita também.”

Segundo o pesquisador, o custo do dispositivo é ba­sicamente o custo da luva, sem o sensor. “Os sensores custam menos de US$ 0,1. O custo principal é a luva. Usamos uma luva nitrílica porque é menos porosa que a de látex. Com a pandemia, o preço dela disparou. E o cus­to individual subiu. Mas, ain­da assim, o dispositivo que criamos é um produto muito barato. Mais acessível que os testes feitos atualmente.” (Ka­rina Ninni|Agência Fapesp)

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