Bazileu Margarido *
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O aumento da demanda por água para abastecimento humano e irrigação agrícola tem intensificado a exploração do Aquífero Guarani em Ribeirão Preto e região, acendendo um alerta sobre o futuro hídrico da cidade. As consequências do uso excessivo, como o rebaixamento do lençol freático e a vulnerabilidade em tempos de seca, exigem ações urgentes e coordenadas. Este artigo aborda o contexto global e local da exploração de águas subterrâneas, os dados disponíveis sobre o uso do Aquífero Guarani em Ribeirão Preto, as possíveis consequências e as medidas que podem garantir o abastecimento sustentável da cidade.
A exploração de águas subterrâneas tem crescido em todo o mundo, impulsionada pelo aumento populacional, urbanização e expansão da agricultura irrigada. No entanto, o uso excessivo e a má gestão podem levar ao esgotamento de aquíferos, à contaminação e a outros problemas ambientais.
No Brasil, o Aquífero Guarani, um dos maiores do mundo, é uma importante fonte de água para diversas regiões, incluindo Ribeirão Preto. O Estado de São Paulo consome cerca de 80% da água extraída do Aquífero Guarani no país, que pode se intensificar nos períodos de seca prolongada, e Ribeirão Preto é uma das regiões de maior preocupação. Em artigo recente do geólogo Heraldo Campos destacou que um estudo da Universidade de São Paulo (USP) de 2021 revelou uma redução de 120 metros no nível do aquífero na região de Ribeirão Preto ao longo de 70 anos. Não é pouco e aponta a insustentabilidade de seu uso nos padrões atuais.
Ribeirão Preto, com seus 700 mil habitantes, depende 100% do Aquífero Guarani para o abastecimento de água. A região também se destaca no agronegócio, com grande demanda por água para irrigação, o que aumenta a pressão sobre o aquífero.
A exploração excessiva do Aquífero Guarani pode ter diversas consequências negativas para Ribeirão Preto, incluindo risco de desabastecimento, o que pode comprometer o acesso à água, especialmente em períodos de seca prolongada, aumento de custos, devido a necessidade de perfuração de poços mais profundos e bombas mais potentes, e impactos ambientais como a redução da vazão de rios e comprometimento de nascentes.
Isso já está acontecendo em outras regiões. Estudo publicado no ano passado na revista ‘Nature Communications’ revelou que mais da metade dos rios brasileiros apresenta risco de perda de fluxo devido à percolação da água para aquíferos subterrâneos, principalmente na Bacia do Rio São Francisco e na região do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia).
Outro estudo, também publicado em 2024 e conduzido por pesquisadores da Unesp durante 8 anos, mediu a contribuição das águas pluviais e subterrâneas para a manutenção de nascentes e rios na região de Brotas. O estudo constatou que cerca de 80% do volume de água dessas nascentes é proveniente da descarga de águas subterrâneas do Aquífero Guarani, mas as recargas propiciadas pelas águas pluviais são bem mais lentas, gerando um desequilíbrio no sistema que pode comprometer o uso futuro.
Diante desse cenário, é fundamental que Ribeirão Preto adote medidas para garantir o uso sustentável do Aquífero Guarani. É preciso reduzir o desperdício que ainda é alto, em torno de 45%, apesar da redução nos últimos anos com a substituição da rede mais antiga e construção de mais reservatórios. A realização de estudos, como o contratado pela SAERP recentemente, é essencial para conhecer a real situação do aquífero e definir estratégias de gestão. O pré-projeto de avaliação técnica da captação de águas superficiais também é um passo importante.
Na agricultura, é preciso incentivar práticas agrícolas que reduzam o consumo de água, como a irrigação por gotejamento e o uso de variedades de plantas mais resistentes à seca. Na área urbana, é fundamental que a população seja informada sobre a importância da água e a necessidade de economizar.
As ações para garantir o uso sustentável do Aquífero Guarani não podem ser adiadas. O risco de desabastecimento não deve ser afastado, considerando o aumento da temperatura e da estiagem, consequências das mudanças climáticas. Ribeirão Preto precisa se preparar para enfrentar os desafios hídricos do futuro, investindo em tecnologia, gestão eficiente e conscientização da população.
A preservação do Aquífero Guarani é fundamental para garantir o abastecimento de água para as futuras gerações. Com ações coordenadas e responsáveis, é possível construir um futuro mais sustentável para Ribeirão Preto.
* Ex-presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e consultor de projetos de sustentabilidade