Edwaldo Arantes *
[email protected]
Em uma sexta-feira do mês de julho, logo cedo, estávamos tomando café quando a Taís me falou:
– Quero comprar um xale para a avó Maria hoje, no que imediatamente concordei, dizendo:
– Perfeito, no final de tarde nos encontramos e vamos comprar.
Engraçado que a Taís me telefonou umas dez vezes, falando do xale.
No final da tarde ela pegou-me na sede do Instituto do Livro, no Centro Cultural Palace e fomos direto adquirir o manto.
Assim que entramos na loja ela foi em direção ao produto, acredito que já o tenha visto, mostrando-me com ele nas mãos, realmente uma peça muito bonita, toda branca, com rendas, digna realmente da nossa mãe.
Ela estava residindo com o meu irmão Ewaldo para onde nos dirigimos para entregar o presente.
Tenho nas lembranças a felicidade dela, ficamos conversando, as duas se gostavam e se davam extremamente bem, depois de boas conversas, fomos embora, mamãe com o xale nos ombros toda garbosa, nos acompanhou até a porta.
No outro dia, sábado eu tinha um encontro no Pinguim I, o autêntico, o primeiro, no térreo do “Edifício Diederichsen” tendo sido inaugurado em 1936 como um misto de bar e choperia, bem nas esquinas das ruas General Osório e Álvares Cabral.
O interessante que os turistas que buscam o local não sabem, bem como os mais novos acreditam que o estabelecimento único seja o que se localiza no térreo do Edifício ‘Meira Júnior’, integrante do Conjunto Arquitetônico do “Quarteirão Paulista”, ledo engano, pois este é de meados de 1977.
Bem, voltemos ao sábado de 2008, às 11h, onde me encontrava em pé, saboreando um chopp com colarinho alto, quando meu celular soou, era minha cunhada Solange, muito triste e profundamente abatida, comunicando a súbita morte da mamãe.
Fiquei meio aturdido, sem ação, localizei a Taís, dando início a toda melancolia, desalento, uma amargura pungente apertando o peito e ainda tomando providências e procedimentos diante do surpreendente infortúnio.
A Taís que mesmo em desespero, teve um papel fundamental, solidário e único, cuidando de tudo assim que o corpo chegou ao agente funerário, depois de vesti-la, fiquei sabendo que ela pegou um batom, sob os olhares de uma funcionária, que indagou:
– Mas para que o batom?
No que a Taís imediatamente respondeu:
– Ela era muito vaidosa e elegante, não atendia a porta sem sequer estar bem vestida e com um batom rosa.
– Perfeito, verdade.
O velório da minha mãe foi na Saudade com muitos amigos, me lembro que lá pelas onze horas o então Prefeito, Dr. Welson Gasparini e o Secretário da Cultura, Valdemar Corauci Sobrinho, muito amigo da família, foram até lá se despedir dela.
Não vou esquecer nunca da dor e do sofrimento do meu irmão mais velho, Ewaldo, os dois eram muito íntimos e próximos, de uma amizade e ligação que extrapola a relação de mãe e filho, tanto assim o é que ela veio a falecer na casa dele.
Meu saudoso irmão caçula que hoje deve estar com ela chegou com os filhos e esposa, um ambiente de solidariedade, envolto em amargo desgosto, saudade e uma tristeza de apunhalar o coração.
No outro dia cedinho o cortejo se dirigiu para São Sebastião do Paraíso, Minas Gerais, sua terra natal onde ela exerceu o magistério por longos anos, foi considerada professora emérita, a cidade inteira foi aluna dela, possuía o apelido carinhoso de “Professora Maricada”, desde os tempos de jovem normalista, iniciando a brilhante carreira em uma escola rural, muito comum naqueles tempos.
Criou três filhos absolutamente só, dedicou sua vida ao magistério e a nós, sem nunca desistir ou deixar de lutar.
Foi algo inesquecível em homenagens, pessoas chegando de todos os lados, familiares, amigos, amigas, ex-alunos, com uma lúdica e lírica surpresa na hora de descer à sepultura, levando os acordes da “Banda Municipal”, sob uma chuva de aplausos e flores.
Um detalhe marcante, dormiu com o xale e faleceu com ele, nada mais justo que também fosse embora para outro tempo e espaço na companhia dele sobre os bravos e heróicos ombros.
* Agente Cultural