Tribuna Ribeirão
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Um tempo, um lugar e uma saudade 

Edwaldo Arantes * 
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O Rio foi um momento marcante na minha vida, história e trajetória. 
 
Trabalhava nos escritórios da Biblioteca Nacional no majestoso Palácio Gustavo Capanema, um marco da arquitetura moderna brasileira. 
 
Obra dos geniais, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Ernani Vasconcelos e Jorge Machado Moreira, com a consultoria do arquiteto franco-suiço Le Corbusier. 
 
Minha sala no 11º andar, as paredes de vidro onde eu admirava o céu azul sobre a Baía de Guanabara, avistando com olhos deslumbrados a secular Igreja de Santa Luzia. 
 
Simplesmente chegar ao Capanema já é momento divino, seu vão livre e a Livraria Mário de Andrade. 
 
No primeiro andar, a Sala Sidney Miller com espetáculos de teatro e música, o auditório Gilberto Freyre, salão de exposições com acesso ao Jardim Suspenso, talvez brotando dos sonhos de Roberto Burle Marx, que marcou o paisagismo no Brasil com uma configuração inédita no mundo. 
 
O visitante pode caminhar entre Bromélias, Quaresmeiras, Paineiras, Lírios e dezenas de plantas tropicais, Guaimbê, Camará, Bela Emília, Trapoeraba Roxa, Giesta e Agave. 
 
No segundo andar, um marcante e belíssimo painel de Cândido Portinari. 
 
Entre 1938 e 1945 trabalhou no Palácio Capanema onde desenvolveu um grupo de 12 pinturas representando o laboro do povo brasileiro. 
 
Desnecessário escolher o andar, cada canto, mesmo os mais escondidos remetem a um mundo de fantasias, sonhos e o sentimento de ainda existir um local no mundo, onde mísseis, ditadores e genocidas não habitam. 
 
Abro os olhos e volto a caminhar pelo Centro, seus becos e vielas, fecho os olhos e ouço a história, os cascos das carruagens estalando retirando faíscas das pedras mudas que a tudo assistem inertes durante séculos. 
 
Cada esquina é um convite ao sonho, tal qual um passaporte carimbado de lembranças, seus lugares, histórias e passado, biografia eterna de uma constelação e ícones da memória. 
 
Igreja da Candelária, ao chão um monumento que retrata a barbárie onde oito jovens em uma madrugada, enquanto dormiam sob a soleira, cobertos pelo manto das estrelas foram brutalmente assassinados pela polícia. 
 
O Centro imortal, Ouvidor, Carioca, Lavradio, Alfândega, Gamboa, Uruguaiana, Rosário, Riachuelo, Lavradio, Arcos da Lapa, Confeitaria Colombo, Circo Voador, Escadaria Selaron, Cais do Valongo, Porto Maravilha, Museu do Amanhã e o Angu do Gomes, sob as bênçãos da Catedral Metropolitana de São Sebastião, guiados pelo Bondinho de Santa Tereza. 
 
O silêncio, penumbra e mistérios das suas igrejas postas em crenças e orações desde o Império, onde seus bancos acolhem os desesperados e desvalidos. 
 
Ao adentrar o Real Gabinete Português de Leitura imagino entrando no céu, sem anjos, cornetas, harpas e santos, apenas livros, à porta, recebendo e desejando boas vindas, “São Drummond”, sem chaves, apenas um poema às mãos. 
 
Anos e anos atrás foi Chefe de Gabinete do Ministro Gustavo Capanema, teço sérias dúvidas sobre o “Curriculum Vitae” de alguns, hoje, em seus gabinetes refrigerados. 
 
Afasto um pouco os devaneios e busco uma mesa no Amarelinho, palco de chopinhos e descobertas que embalaram minhas noites, ainda vejo o Teatro Municipal, Biblioteca Nacional, Cine Odeon, Museu Nacional de Belas Artes e Palácio Pedro Ernesto, hoje Câmara Municipal, onde brilhou a lutadora e mártir, Marielle Franco. 
 
Cinelândia, palco da cultura e da resistência onde muitos passos foram aniquilados pela sanguinária e nefasta ditadura militar, muitos corpos ainda clamam para serem devolvidos e ungidos como os verdadeiros heróis nacionais, sepultados com honras e dignidade.  
 
O Rio e o sorriso da Marina, pititinha com um milho verde cheio de areia às mãos, amigos que nunca mais vou rever como o Gustavo Roxo, “Tio Gu” onde sentados no “Alla Zingara”, Copacabana, madrugadas, pimenta-malagueta, bolinho de bacalhau, cervejas e cachaças Lua Nova e Havana. 
 
Foram noites inacabáveis de amizade, sintonia e ternura, incrustadas nas saudades, longos papos intercalados com melodias, onde foi mestre e batuta batucando na caixa de fósforos, cantarolando e encantando com as páginas mais lindas da música popular brasileira. 
 
Foi um Rio que passou em minha vida e meu coração se deixou levar”. Paulo César Baptista de Faria, o Paulinho da Viola. 
 
* Agente cultural 

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