Rui Flávio Chúfalo Guião *
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José Maurício Nunes Garcia nasceu no Rio de Janeiro no dia 22 de fevereiro de 1767, filho do alfaiate e “pardo forro “ Apolinário Nunes Garcia e de Vitória Maria da Cruz, neta de escravos. Tinha a tez escura, que lhe traria grandes dissabores e preconceito na rígida sociedade de então.
Como a família era pobre, encaminhou-o ao sacerdócio, a fim de conseguir boa formação em humanidades e desenvolver os dotes musicais que desde cedo apresentava.
Na sua meninice, o Rio de Janeiro havia se transformado na capital do Vice-Reinado, recebendo vários melhoramentos. Com a vinda da família real portuguesa, em 1808, a capital passaria por uma revolucionária modernização.
Os Bragança portugueses sempre deram muita importância para a música. Todos tocavam vários instrumentos, como o Príncipe D. Pedro, que viria a ser nosso primeiro Imperador. Dele, conhecemos e cantamos o atual Hino da Independência, que foi o Hino Nacional do Império do Brasil de 1822 a 1831, mas sua obra musical é vasta e pouco conhecida.
Adolescente, José Maurício dava aulas de música, forma de conseguir sustento material e – mais importante- poder usar os instrumentos musicais dos alunos, pois não tinha dinheiro para tê-los.
Além de música, recebeu sólida formação em história, geografia, francês, italiano, alemão, grego, latim, retórica e filosofia, tornando-se um intelectual de escol.
Sua carreira teve uma grande alavancagem quando compôs e tocou Te Deum em homenagem à chegada de D. João. O soberano entusiasmou-se com o virtuosismo do músico, que nomeou Mestre da Capela Real, iniciando amizade entre os dois. Um ano depois, como a sociedade se opusesse a ter um mestre de capela com “defeito evidente” de ser mulato, D. João outorgou-lhe o manto da Ordem de Cristo, demonstrando seu respeito pelo compositor.
Em 1811, chega ao Brasil o grande músico português Marcos Portugal, compositor oficial da Corte. Começa então uma divergência entre os biógrafos de José Maurício, que se dividem em dizer que os dois se tornaram amigos e colaboradores, enquanto outros indicam uma rivalidade estimulada por Marcos Portugal e apoiada pelos preconceituosos membros da corte.
A verdade é que a carreira brilhante de José Maurício entra em declínio, até sua morte em 18 de abril de 1830, na mais completa miséria. Não fosse a iniciativa da Irmandade de Santa Cecília, que arcou com o sepultamento, teria sido enterrado como indigente.
A produção musical de José Maurício é uma das mais prolíficas de nossa país. Foi, sem dúvida, o maior compositor de sua época. Estão registradas e catalogadas 240 obras suas, mas, estima-se que tenha composto mais de 600, entre missas, matinas, vésperas, antífonas, réquiens, Te Deum, além de modinhas e outras peças dramáticas. Sua música representa as agitações da passagem do Brasil colônia para sede do Império Português e refletem os embates entre o Barroco e o Neoclássico.
Ouvir a melodia religiosa de suas obras sempre nos enleva e nos conduz a uma época que já passou, mas que ficou como uma das mais importantes de nossa história.
Desse período histórico, permaneceram obras esculturais, que nos encantam. Como a música é etérea, pouca coisa ficou. Mas, o suficiente para reconhecer o talento e a genialidade do Pe. José Maurício Nunes Garcia.
* Advogado, empresário, presidente do Conselho da Santa Emília Automóveis e secretário-geral da Academia Ribeirãopretana de Letras