Entendendo por silêncio a quietude e tranqüilidade do corpo, e de seus membros e sentidos, nós o identificamos, de modo geral, pela ausência de fala e de qualquer outra comunicação vocal. Condições, estas, nas quais reside muito da quietude e serenidade da mente, da imaginação, da fantasia e do pensamento, fazendo com que o coração, livre de imagens e de desejos, torne o ser humano vigilante, buscando disponibilidade mais intensa para o bem. Como a natureza lhe responde? Sentindo sua influência, acolhendo-o para realizar tal busca. Por que o tomamos por virtude? Por ser, o mesmo, uma qualidade e atitude, dispondo o ser, por atos reiterados, a exercê-lo habitual e firmemente, ao lado da prudência e da temperança.
Entretanto, vivemos um século fervilhante de barulhos e estrondos, de todo tipo. Barulhos que vão de um tom exageradamente alto na fala à necessidade de ouvir músicas para si e para o outro, em lugares públicos, ou em horários, e situações, inadequados, desinteressados do desalento que isso acarreta a quem é obrigado a compartilhá-los. Por que o fazem? Pelo fato de sua prática ser difícil, muitas vezes dolorosa e penosa, acarretando, a quem tem os problemas desnudados diante dos próprios olhos, o incômodo de ter que lidar com o sofrimento, a dor, a pena, o fastio, o tédio, a tristeza e a melancolia que tais lembranças lhe acarretam. Isso leva à conclusão parcial de que o silêncio não é fácil de ser praticado por todos, característica que o torna incomum, escasso, quase excepcional e fora de moda. Exercitá-lo revelando-se, assim, atitude preciosa, de grande apreço, valor e valia, merecendo a mais viva estima dia após dia.
Talvez venha daí a dificuldade que as pessoas têm de exercitar a leitura. Mas o que essas pessoas precisam saber é que, páginas lidas no silêncio têm aumentada a ressonância das idéias que suas palavras congregam. De que forma? Por ser no silêncio exterior que o ser alcance o silêncio interior. Limiar indispensável e imprescindível à reflexão, é neste que recuperamos a liberdade da vida. Neste contexto, à medida que o alcançamos, a atenção se apura, elevando a agudeza dos juízos e tornando mais firme nossa vontade.
Estamos finalizando 2017. Não foi um ano fácil. Muitos, abalados pela perda de emprego, viram-se às portas do desespero e da insegurança. Na sequência, tornaram-se presas fáceis da dor e do desespero. É certo que o mercado reagiu e novos empregos vêm sendo gerados. Mas serão precisos muitos meses para que a situação se normalize. A estes, e aos outros tantos que se viram desamparados pela perda de entes queridos, de bens materiais e de amizades e similares, nós desejamos esperança, resiliência e silêncio. Nenhum ano é fácil. Na verdade, nada é fácil na vida. Porém, o último dia do ano é como uma mudança de residência.
Passemos, então, as chaves no portão e levemos nossas coisas para o novo lar que nos abre as portas. Adentremos a ele observando o silêncio de seus cômodos vazios, paredes brancas, janelas sem cortinas. É nossa oportunidade de remobiliá-lo, transformar a vida, fazê-la reacontecer. Não desperdicemos essa oportunidade. Aos nossos leitores, um 2018 de paz, silêncio, reflexão e compreensão. Que a esperança nos abra a porta da nova casa e o bem nos aconselhe por todos os dias que virão. Feliz Ano Novo a todos.