Tribuna Ribeirão
Ciência e Tecnologia

UFRJ descobre astro com anel ‘impossível’

Pesquisadores da Universi­dade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) descobriram, em torno de um pequeno astro do Sis­tema Solar, um anel que, sim­plesmente, não poderia exis­tir. Pelo menos não de acordo com as leis da física vigentes. Por isso, o estudo publicado na edição de quarta-feira, 8 de fevereiro, da revista Nature desafia, pela primeira vez, uma teoria do século XIX aceita in­ternacionalmente.

Localizado em uma região do espaço depois de Netuno, Quaoar vinha sendo observa­do por especialistas do Obser­vatório do Valongo em busca de pistas sobre as origens do Sistema Solar. Para surpresa de todos, eles identificaram que o pequenino astro tem um anel – o que, por si só, já é considerado raro. Até hoje foram descobertos anéis em apenas três astros de pequenas proporções.

Mas ainda mais extraordi­nário do que a própria presen­ça do anel é que ele se revelou “impossível” de acordo com os conceitos astronômicos vigen­tes. Segundo a definição usada hoje na astronomia, anéis são estruturas não sólidas que reú­nem asteroides, poeira e outras partículas em torno de um as­tro maior.

Até 2013, os pesquisadores só conheciam anéis circundan­do planetas gigantes, como Sa­turno e Júpiter. Desde então, no entanto, astrônomos detectaram anéis no planeta anão Haumea e no centauro Chariklo, abrindo precedentes para novos estudos sobre o tema. No caso do Quao­ar, o maior enigma está relacio­nado às dimensões do anel.

Segundo ficou definido pelo astrônomo francês Edouard Ro­che (1820-1883) em meados do século XIX, para que tais partí­culas mantenham o formato de um anel elas precisam estar a uma distância máxima de 1.750 quilômetros do astro que cir­cundam. Para além desse limite, estabeleceu Roche, as partículas começariam a se aglutinar e aca­bariam por formar um satélite. Conhecido como Limite de Ro­che, esse princípio nunca tinha sido desafiado até hoje.

Ocorre que o anel de Quao­ar está localizado a 4.100 qui­lômetros de seu corpo central, portanto muito fora do Limite de Roche. “Pela primeira vez, estamos vendo um anel além do limite de Roche”, constatou o astrônomo Bruno Morgado, do Observatório do Valongo, prin­cipal autor do estudo. “A primei­ra pergunta que a gente se fez é se não estaríamos presenciando o exato momento em que o anel está se transformando em um satélite natural.”

Essa hipótese, ainda que incrível, é improvável, segun­do o próprio Morgado. “Esse processo demoraria algumas poucas dezenas de anos e, con­siderando toda a longa história do Sistema Solar, é improvável que estejamos no lugar certo e na hora certa para testemunhá­-lo”, afirma.

“Mas é uma possibilidade. Se for verdade, será muito interes­sante podermos testemunhar a formação de uma lua.” O astrô­nomo brasileiro considera mais provável, no entanto, que algum outro fator (não levado em con­ta por Roche) torne possível a existência do anel. O desafio agora é tentar determinar que fator seria esse.

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