A vereadora Gláucia Berenice (PSDB), autora do polêmico projeto “Infância sem pornografia”, respondeu a questionamentos do Tribuna sobre como serão implementadas as medidas preconizadas na lei. A proposta foi aprovada na Câmara de Ribeirão Preto e foi vetada integralmente pelo prefeito Duarte Nogueira Júnior (PSDB), mas o Legislativo derrubou o veto na última terça-feira, 28 de novembro. A legislação será promulgada pelo presidente do Legislativo, Rodrigo Simões (PDT).
Na sessão de terça-feira, ao usar a tribuna da Câmara para agradecer aos colegas pela derrubada do veto, Gláucia Berenice disse que o assunto não vai se resumir à nova lei e que “vem mais coisa pela frente”. Em entrevista por e-mail, ela sustenta que, apesar da alegação inicial da prefeitura para o veto, de vício de iniciativa, o prefeito Duarte Nogueira não irá ingressar com ação direta de inconstitucionalidade (Adin) para derrubar a legislação, mas sim baixar um decreto regulamentador.
O Tribuna encaminhou ao gabinete da vereadora dois questionamentos sobre artigos contidos na lei. O primeiro trata do parágrafo “os pais ou responsáveis têm o direito a que seus filhos menores recebam a educação moral e religiosa que esteja de acordo com suas convicções”. Indagada sobre qual a postura de um professor em uma classe com alunos cujos pais professam diferentes religiões, a tucana respondeu: “O projeto de lei não trata de religião. Trata da proteção da criança contra a pornografia”.
O segundo questionamento foi acerca do parágrafo que diz: “Órgãos ou servidores públicos municipais podem cooperar na formação moral de crianças e adolescentes, desde que, previamente, apresentem às famílias o material pedagógico, cartilha ou folder que pretendem apresentar ou ministrar em aula ou atividade”.
O Tribuna indagou qual seria o procedimento no caso do envio às escolas pelo Ministério da Educação de uma cartilha para aulas de educação sexual, já que a lei prevê que os pais sejam consultados previamente. No caso de os pais dos alunos de uma classe se dividirem (parte apoiando e outra parte rechaçando a cartilha), perguntou-se à vereadora qual seria o procedimento a ser adotado pela escola.
Gláucia Berenice respondeu: “Situações concretas serão resolvidas por meio de decreto regulamentar a ser editado pelo Poder Executivo”, demonstrando sua convicção de que Duarte Nogueira irá relevar a justificativa para o veto, de 14 páginas. Na justificativa para o veto, o prefeito escreveu que “o mesmo invade a esfera de competência de iniciativa do Poder Executivo”. Também disse que “a matéria tratada no projeto de lei está inserida no âmbito da competência atribuída pela Constituição Federal ao chefe do Poder Executivo Municipal, existindo, pois, vício de iniciativa a violar o princípio da separação dos poderes”.
Na longa justificativa de 14 páginas, o prefeito ainda cita leis análogas que tiveram a inconstitucionalidade declarada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) após ações diretas de inconstitucionalidade – casos ocorridos nas cidades de Sumaré, Mirassol e Itu. Apesar de Gláucia Berenice afirmar que a prefeitura não irá ingressar com Adin, mas sim baixar um decreto regulamentador, a Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Sindicato dos Servidores Municipais (SSM/RP) já anunciaram que se a lei entrar em vigor vão recorrer à Justiça para derrubá-la.
Segundo os críticos da polêmica lei, a iniciativa da vereadora tucana, que é evangélica, é dificultar ao máximo, nas aulas de educação sexual nas escolas da rede municipal, a inclusão do debate sobre a diversidade, na medida em que confere aos pais o direito de vetar o material didático.
Apesar de lei municipal estabelecer que todo assunto relacionado à educação deva ser submetido previamente ao Conselho Municipal da Educação (CME), o projeto da vereadora Gláucia Berenice não foi debatido com os conselheiros do CME. O polêmico assunto também não foi discutido com a sociedade por meio de audiência pública. E os professores da rede municipal de ensino também não foram consultados. Ela tem razão quando diz que pode haver excessos, mas uma discussão mais ampla poderia até sanar essas dúvidas.