O título desse artigo não é uma utopia, mas uma realidade em várias cidades do Brasil e do mundo, que entenderam o transporte público como um ativo importante para seu desenvolvimento. Municípios que criaram um vetor de vitalidade econômica e humana, proporcionando mais oportunidades de trabalho, saúde, estudo e lazer aos seus usuários e para a cidade como um todo, por força do círculo virtuoso que construíram. Ribeirão Preto não está entre elas.
Décadas sem um bom diagnóstico da mobilidade para instruir uma licitação ética e um contrato que resolva os problemas históricos e atenda as necessidades dos usuários, nos legaram esse transporte público precário, excludente, ineficiente e até cruel.
E por que é prioritário falarmos de transporte público? As razões são muitas. A maioria da população e o perfil demográfico dos que mais utilizam transporte público no Brasil nos colocam diante dessa urgência. É um desafio ético por ser uma questão de alta relevância humana e de justiça, além de ambiental. Mobilidade é um direito assegurado pela Constituição.
As pesquisas nos mostram que muitas pessoas com esse perfil, em alguns casos 70% delas, por sofrerem com a pressão orçamentária, não marcam consulta médica, deixam de visitar parentes e faltam a entrevistas de trabalho por conta do preço da tarifa. São dados alarmantes e inaceitavelmente menosprezados. É injusto e desumano precarizar a vida dessas pessoas. Somos uma cidade rica e há soluções para esses problemas. Temos que romper esse círculo vicioso e buscar um impacto humano e ambiental positivos.
Uma cidade que se desloca mais por automóveis não é uma cidade para todos e o transporte público é a espinha dorsal das grandes e médias cidades, como é o caso da nossa. A pandemia deixou claro que o transporte público é um ativo essencial para garantir a vida nas cidades, para que as cidades tenham resiliência diante das emergências sanitária e climática. Os problemas já existiam, mas a pandemia os escancarou.
Essa Administração, que não fez a lição de casa apontada no primeiro parágrafo, na pandemia colocou a população em pandemônio. A falta de transparência com os custos do sistema somada às externalidades negativas, como o transporte por aplicativo e a insegurança sanitária, pioraram o que já era muito ruim.
Onde estão esses números? Por que a Prefeitura não os publica para que todos nós tenhamos acesso em tempo real, usando a internet? Por que essa Administração se agarra a uma licitação e a um contrato condenados pelo Tribunal de Contas do Estado, o TCE? Por que insiste em não auditar a movimentação contábil das empresas – como determinam as cláusulas 28 e 29 do atual contrato – para nos mostrar a realidade? Por que reproduz a conduta cruel de manter 2/3 dos pontos de ônibus sem cobertura, bancos e iluminação, se uma boa licitação, permitindo a exploração publicitária, proveria essa necessidade sem custo algum aos cofres públicos?
São perguntas que já deveriam estar plenamente respondidas e seus problemas solucionados. Estamos em 2022, meu Deus! A pressão das empresas de ônibus sobre a Câmara Municipal diminuiu muito por força dos inquéritos que construímos nas CPIs, que inclusive produziram essas perguntas. A tarifa é cara para o usuário, o operador diz que ela é insuficiente, ameaça com o colapso do serviço e a Prefeitura se cala.
O Poder Público tem o dever de induzir as empresas a tornarem-se parceiras de eficiência e bom atendimento e não sócias do desespero. Nosso sistema de transporte coletivo está na UTI.
Presidindo a Comissão Permanente de Mobilidade, indicamos a harmonização do Plano Diretor à Política Municipal de Mobilidade Urbana, bem aceita pela nova Divisão de Mobilidade da Secretaria de Planejamento. Apontamos a necessidade de criação do Conselho Municipal de Mobilidade e do Fundo Municipal de Mobilidade, que receberá os recursos da publicidade no mobiliário urbano e da zona azul, por exemplo, ganhando capacidade de investimento no sistema sem usar o caixa da Prefeitura, mas tudo isso precisa sair do papel.
Um exemplo inovador vem de São José dos Campos, que criou um novo modelo de concessão, que integra o transporte coletivo sob demanda ao sistema, transferindo atribuições de bilhetagem dos operadores para fintechs e reduzindo outras obrigações das empresas, viabilizando a melhora na qualidade combinada ao barateamento da tarifa.
Há outros exemplos bem-sucedidos, como os de Curitiba e Bogotá. Remodelar o contrato e o financiamento para viabilizar a implantação de infraestruturas urbanas qualificadas e redes multimodais, além de adquirir frotas mais limpas e uma operação moderna, inteligente e eficiente, está ao alcance dessa Administração. Precisa agir!