Por Adalberto Luque
Sábado, 22 de junho de 2024. Um entregador havia acabado de deixar algumas marmitas na casa de um cliente do restaurante onde trabalhava. Retornava para fazer novas entregas. Ao passar pelo túnel do Complexo Viário Manoel Leão, na Avenida Meira Júnior, Jardim Paulistano, zona Leste da cidade, o rapaz de 20 anos perdeu o controle de sua motocicleta.
Atingiu em cheio um poste de iluminação. Seu corpo ficou pendurado na mureta. A moto ainda percorreu cerca de 80 metros até parar totalmente. Morreu antes que pudesse ser socorrido. A cena do corpo sem vida dependurado na mureta chocou.
Para a família, uma enorme dor pela vida interrompida tão prematuramente por acidente com motocicleta. Para as estatísticas, a confirmação de quem mais morre nas ruas e estradas que cortam Ribeirão Preto: jovem (entre 20 e 24 anos), conduzindo moto e do sexo masculino. O perfil pode ser confirmado em consulta ao Sistema de Informações Gerenciais de Sinistros de Trânsito (Infosiga-SP).
Em alta
De acordo com o apurado, entre janeiro e junho de 2024, o trânsito matou 50 pessoas em Ribeirão Preto. Uma letalidade no trânsito a cada 87 horas, ou três dias e meio. As mortes ocorreram em ruas e avenidas da cidade e nos trechos de rodovias que cortam o município.
Foram seis em janeiro, oito em fevereiro, seis em março, sete em abril, dez em maio e 13 em junho. No primeiro semestre do ano passado ocorreram 42 – sete em janeiro, dez em fevereiro, nove em março, três em abril, dez em maio e três em junho. Houve, portanto, crescimento de 19,05% no número de mortos, de acordo com o Infosiga-SP.
Em apenas seis meses, Ribeirão Preto registrou 66% do número total de mortes ocorridas durante todo o ano passado. Motociclistas lideram o ranking. Em 2024, 28 condutores de moto perderam suas vidas nas ruas, avenidas, pontes, viadutos, alamedas, travessas e rodovias que cortam a cidade.
Em seguida estão os pedestres, com nove óbitos, as vítimas em acidentes envolvendo automóveis com sete casos e três mortes de pessoas que se acidentaram enquanto se locomoviam de bicicleta.
Um motociclista morreu a cada 156 horas, em 2024. Durante todo o ano de 2023, 35 condutores de moto morreram no trânsito ribeirão-pretano. O número de vítimas fatais nos acidentes de moto na cidade aumentou 64,7% de janeiro a junho de 2024, quando 28 motociclistas (44%) morreram. No mesmo período do ano passado foram 17 registros de vítimas fatais.
Distração ou desrespeito
Manoel Neris de Oliveira, de 48 anos, seguia com sua moto pela Avenida Dom Pedro I, na tarde de domingo, 26 de maio. Descia a avenida no sentido ao Centro. No cruzamento com a Rua Pará, o motorista de um carro fez conversão proibida e entrou na frente de Oliveira.
O condutor da moto foi atingido e, com o impacto, seu corpo foi projetado vários metros adiante, batendo em um poste de iluminação até parar. Morreu antes que pudesse ser socorrido, com hemorragia interna e politraumatismo.
Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Medicina do Tráfego apontou que a imprudência, a desatenção e a imperícia dos motoristas, são os principais fatores que causam mortes no trânsito. Das 10 principais causas dos acidentes registrados, nove foram por falha humana.
Foi o que ocorreu no caso de Oliveira. O motociclista, muitas vezes, é considerado imprudente. Neste caso o condutor da moto fazia tudo certo, até um carro entrar em sua frente e causar aumento na estatística do Infosiga-SP.
De acordo com o apurado em Ribeirão Preto, 68% dos mortos no trânsito foram condutores de motos, veículos, ônibus e caminhões. Os pedestres foram 18% das vítimas fatais. Os passageiros correspondem a 6% dos casos.
Os dias em que mais ocorreram mortes foram as noites de sexta-feira e sábado, com 10 cada. As faixas etárias que lideram as estatísticas são de 20 a 24 anos, com oito mortes e de 40 a 44 anos, com seis mortes.
Os sinistros com vítimas fatais ocorreram, em sua maioria, nas vias urbanas. Foram 50% dos casos. As rodovias registraram 36% dos acidentes e 14% não tiveram local exato apurado pelo Infosiga-SP.
Mais mulheres
Era tarde de sábado, 22 de junho. A professora e conselheira do Sindicado dos Professores do Estado de São Paulo (APEOESP), Vânia dos Anjos, de 40 anos, seguia em seu carro pelo Anel Viário Norte, como é conhecida a Rodovia Alexandre Balbo (SP-328). Próximo ao trevo que dá acesso à Avenida Luiz Galvão César, Parque das Andorinhas, zona Oeste de Ribeirão Preto, um motorista que vinha na pista sentido oposto ao de Vânia tentou desviar de um cachorro.
O homem perdeu o controle do carro, atravessou o canteiro central e invadiu a pista onde a professora trafegava, colidindo frontalmente contra seu carro. A mulher morreu antes que pudesse ser socorrida. A professora era mãe de uma jovem de 16 anos.
Durante todo o ano de 2023, de acordo com o Infosiga, 11 mulheres morreram no trânsito. Em 2024, apenas nos seis primeiros meses, outras 11 perderam suas vidas. Um número bastante preocupante.
Proporcionalmente, em 2023, as mulheres foram 17% das vítimas fatais e, neste ano, já são 20%. Se a média de mortas se mantiver, após 31 de dezembro de 2024 as vítimas fatais do sexo feminino podem representar o dobro das registradas no ano passado.
Menos acidentes
Se por um lado as vítimas fatais aumentaram, por outro o número de acidentes registrados diminuiu. Nos primeiros seis meses do ano foram 2.299 colisões, sendo 1,4 mil com vítimas não fatais, 852 acidentes sem vítimas e 47 sinistros vítimas fatais.
Maio de 2024 foi o período onde mais acidentes ocorreram, com 433 casos, seguido por março, com 405. Nos primeiros seis meses de 2023 ocorreram 2.720 sinistros de trânsito. Uma redução de 15,5%. Em 2023, os meses com maior incidência foram junho, com 526 casos e maio, com 517 ocorrências. Ainda assim, em 2024 foram registrados 12 acidentes por dia em vias urbanas e rodovias de Ribeirão Preto.
R$ 50 bilhões
Preocupados com a questão do elevado número de acidentes de trânsito, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) atualizaram pesquisas de custos de acidentes no Brasil sobre números apurados na década passada. A sociedade perde cerca de R$ 50 bilhões com sinistros de trânsito, de acordo com Ipea e ANTP.
Acidentes de trânsito no Brasil matam cerca de 45 mil pessoas por ano e deixam mais de 300 mil pessoas com lesões graves. De acordo com a pesquisa, em estimativa conservadora, os acidentes em rodovias custam à sociedade cerca de R$ 40 bilhões por ano, enquanto os acidentes nas áreas urbanas, em torno de R$ 10 bilhões.
A conclusão do levantamento indica que a maior fatia desses valores é relativa à perda de produção, seguido pelos custos hospitalares. E quanto mais grave o acidente, maior o custo associado a ele, sobretudo quando há vítimas fatais envolvidas, elevando substancialmente o custo final, em função da perda de produção.
Segurança Viária
O Departamento de Estradas de Rodagem (DER), órgão do Governo do Estado de São Paulo, lançou em maio deste ano o Plano de Segurança Viária 2024-2030. A meta do DER é reduzir, até 2030, ao menos pela metade a taxa estadual de fatalidade no trânsito por frota de veículos e por população. Além disso, o governo quer diminuir em 50% as taxas de acidentes e fatalidades por exposição (por milhão de km percorridos).
O plano é válido para os mais de 13 mil quilômetros de rodovias administradas pelo órgão e incorpora estratégias e melhorias na infraestrutura. Iniciativas educacionais e melhoria de pontos críticos com trechos perigosos serão alvo das ações.
Atividades tecnológicas e práticas inovadoras para aprimorar medidas de segurança serão utilizadas. A proposta pode ser considerada uma sequência da “Década de Ações para a Segurança de Trânsito”, documento elaborado na Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) que, em março de 2010, editou uma resolução definindo o período de 2011 a 2020 para redução de acidentes de trânsito.
Da medida criada pela ONU surgiu o Maio Amarelo, movimento adotado por diversos países, entre eles o Brasil. O objetivo é chamar a atenção da sociedade para o alto índice de mortos e feridos no trânsito mundial, unindo esforços para reduzir drasticamente esses números.
Se na questão dos totais de acidentes Ribeirão Preto está no caminho certo, em relação ao número de mortos registrados neste ano ainda há muito o que fazer para mudar a triste realidade escancarada pelo Infosiga-SP.