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Tirando o racismo de campo

Era mais uma partida de futebol entre um clube já clas­sificado contra um eliminado, assim as atenções estavam voltadas para outros confrontos mais relevantes da badalada Champions Ligue. Ninguém poderia imaginar que no dia 08 de dezembro de 2020, no Parque dos Príncipes, em Paris, estaria sendo escrita uma das mais relevantes páginas da história do futebol e da luta contra o racismo.

Um comentário racista do quarto árbitro Sebastian Col­tescu, provocou a indignação de Pierre Webó da comissão técnica do Istanbul Basaksehir, que ao ser expulso, protestou “Por que você me chama de negro?”, recebendo o apoio de toda sua equipe. Em ação solidária inédita, a equipe do PSG liderada pelas estrelas Neymar e Mbappé aderiu à causa exigindo que o árbitro fosse retirado de campo. Como isso não ocorreu, ambas as equipes decidiram abandonar o campo como forma de protesto. Pela primeira vez na história dois times se unem para protestar contra um árbitro racista.

Também marcante a manifestação de Jorge Iggor, do Es­porte Interativo, que narrava o jogo pela internet “Hoje che­gamos ao ponto mais baixo, mais rasteiro, mais inadmissível da intolerância, da estupidez entre as relações humanas”. Ele destacou que o agravante na história é o fato da ofensa racial ser proferida por uma autoridade “Porque o quarto árbitro é uma autoridade, porque tem que aplicar regras, aplicar a lei, ele ofender racialmente um jogador é de dar nojo” completou.

Sabemos que as autoridades esportistas ou civis deveriam combater o racismo, mas geralmente também o praticam ou negam sua existência. Um levantamento da Coordenação Na­cional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Qui­lombolas (Conaq) e da Terra de Direitos, mapeou, entre 1º de janeiro de 2019 e 06 de novembro de 2020, 49 manifestações ou declarações racistas de autoridades públicas, incluindo, o presidente da república, deputados federais e estaduais, verea­dores e integrantes do judiciário.

Reflexo da sociedade, os estádios de futebol foram um dos maiores centros de racismo estrutural, onde a naturalização das ofensas, falas e pensamentos produziu uma falsa impres­são de que tudo pode ou faz parte do folclore do esporte. Cantos racistas e homofóbicos eram entoados pelas torcidas, enquanto gestos e atitudes preconceituosas seguiam banali­zados e aprimorados pelo humor sarcástico. Aos poucos as pessoas começam a perceber que essas “brincadeiras” não tem qualquer graça.

Nos últimos anos as entidades esportivas adotaram me­didas tímidas para combater o racismo no futebol e foram produzidas ações com slogans, camisetas e faixas. Tudo muito bonito, mas na prática, diante de casos concretos as puni­ções aos culpados eram ridículas como jogos com portões fechados, interdição de setores do estádio ou multas insigni­ficantes. Faltava uma atitude consistente como as promovidas por atletas nos Estados Unidos de diversas modalidades que interromperam os calendários esportivos em protesto contra a violência policial.

No futebol mundial, faltava uma ação mais incisiva e o exercício da tão necessária empatia. Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista, pois quem assiste passivamente a um ato de racismo ajuda a validá-lo. O que assistimos naque­la partida não minimiza as dores, mas renova as esperanças.

Mais do que tirar um racista do campo, a mobilização dos atletas deve servir como inspiração para que todos se mobi­lizem em acabar com o racismo, preconceito e discriminação em todos os setores da sociedade.

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