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Tibi Dabo

No final de cada ano, as comemorações religiosas ajudam a ressuscitar as linguagens que sempre foram usadas para cavoucar a memória.

Uma dessas expressões refere-se ao nome pelo qual o Cris­to foi rebatizado em Barcelona: “Dame tibi dabo”. Em latim a expressão significa: “Dê-me que te darei”. Com o tempo, os catalães reduziram a expressão para “Tibi Dabo”, ou seja, “para ti darei”.

Caminhando pelas ruas de Barcelona lê-se ou ouve-se a expressão para todo lado. A imagem do Cristo passou a ser co­nhecida como “Tibi Dabo”. Os motoristas, por exemplo, inda­gam, se nós não queremos conhecer o “Tibi Dabo”, expressão, aliás, colocada no frontal de um grande número de ônibus.

Falando em ônibus, vem do fundo da nossa memória que o vocábulo é o ablativo plural do adjetivo “todo” e que, portanto, a palavra “ônibus” deve ser traduzida como “para todos”.
Usamos bastante a expressão, sem buscar na nossa memória a raiz do seu significado.

Ainda na Espanha, o uso de outra expressão consegue chamar a atenção. A história informa que Júlio Cesar, o roma­no, criou uma cidade na região leste daquele país e batizou-a com o seu próprio nome, Júlio César. Ocorre que os árabes invadiram a Península Ibérica, antes da existência da Espanha e de Portugal, vivendo ali durante oito séculos, vale dizer, por tempo superior ao tempo de existência do Brasil. Os árabes tiveram grande dificuldade para pronunciar o nome de Júlio César que assim por eles foi convertida em Zaragoza, nome pelo qual a cidade de Júlio César é assim conhecida até hoje.

Dificuldades há por toda a parte. O calendário romano, originariamente, tinha dez meses, tanto que o décimo cha­mava-se “dezembro”, o nono era o “novembro”, o oitavo era o “outubro”. Ocorre que os políticos foram levados a homena­gear a memória de dois governantes, Júlio César e Augusto. Foram criados mais dois meses, “julho” e “agosto”. Assim o décimo mês, o dezembro, foi arrastado para o décimo segun­do lugar; novembro virou o décimo primeiro; e outubro ficou no décimo lugar.

As dificuldades não param aí. O mosquito “aedes egyptii” transformou-se numa grande praga, inclusive para ver seu nome pronunciado. A palavra “aedes” significa “odioso” em grego. Manda a boa regra ser a palavra pronunciada em latim onde “ae” se pronuncia “é”. O nome do mosquito deveria ser pronunciado “edes” e não “aedes”. O mesmo ocorre com o seu sobrenome “aegyptii”. Pelas mesmas razões ninguém pronun­cia “aegyptii”, mas, sim “egiptii”. E mais, o “tii” final vira “cii” por se tratar do genitivo, ou seja, “do Egito”. Então o nome do mosquito deveria ser pronunciado como “edes egypícii”, ou seja, o “odioso do Egito”.

Winston Churchill, em seu famoso livre “História dos Po­vos de Língua Inglesa”, registra que o porco enquanto é engor­dado no chiqueiro é conhecido como “peag”. Após ser morto e assado, ao ser servido na mesa dos nobres ingleses, já afrance­sados, muda de nome, passa a ser conhecido como “porc”.

Num dia desses participei de um debate com um jovem jurista que pronunciava uma palavra que eu não entendia. Após o término, perguntei a um dos seus auxiliares o que ele dizia. Disse-me que o famoso mestre pronunciava “daisas­cou”. Ensinou-me que se tratava da expressão latina “dies­-a-quo”, ou seja, o “dia que passou” que agora deveria ser corretamente pronunciada em inglês, ou seja, ”daisascou”.

Sai da sala de mansinho, temendo tropeçar nas palavras que ainda completam a minha memória para dizer “até breve” ou “até outro dia”.

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