Depois de duas horas de debate, a Câmara de Vereadores aprovou nesta quarta-feira, 19 de setembro, em sessão extraordinária, o decreto legislativo de autoria da Mesa Diretora que tenta suspender o reajuste de 6,33% na tarifa do transporte coletivo urbano, em vigor desde a zero hora de domingo (16). Desde então, a passagem de ônibus na cidade custa R$ 4,20, acréscimo de R$ 0,25 em relação ao valor cobrado anteriormente, de R$ 3,95. Quem faz duas viagens por dia tem que desembolsar R$ 8,40.
A proposta foi aprovada com 17 votos favoráveis e sete contra. Três vereadores não compareceram – Maurício Gasparini (PSDB), afastado até outubro porque é candidato a deputado estadual, Fabiano Guimarães (DEM) e Paulo Modas (Pros).O presidente Igor Oliveira (MDB) só vota em caso de empate. A sessão foi polêmica e teve algumas discussões mais acaloradas.
Renato Zucoloto (PP) argumentou que juridicamente o decreto não tem efeito prático. Outros parlamentares seguiram a mesma linha e ressaltaram que a tarifa não vai cair. Alguns defensores da propositura insinuaram que quem não fosse a favor estaria contra a população. No final, a proposta foi aceita.
Para justificar a aprovação e a legalidade jurídica da propositura, os parlamentares usaram como argumento o artigo 80 da Lei Orgânica do Município (LOM), especificamente o que diz o inciso XIX do item Competência Privativa – “cabe ao Legislativo sustar os atos normativos do Executivo que exorbitem do poder regulamentar”.
O próximo passo da Câmara será a publicação do decreto no Diário Oficial do Município (DOM), o que deve acontecer nesta quinta-feira (20), e depois aguardar o posicionamento do Executivo sobe o assunto. A expectativa de parlamentares ouvidos pelo Tribuna é que o prefeito Duarte Nogueira Júnior (PSDB) revogue o ato do Legislativo através da edição de outro decreto, com comunicação ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que recentemente autorizou o reajuste.
O passageiro de ônibus de Ribeirão Preto gasta mais com transporte do que quem mora na capital São Paulo, onde a tarifa custa R$ 4, ou R$ 0,20 a menos – 5% abaixo do valor autorizado pelo decreto do prefeito Duarte Nogueira de 26 de julho e que estava suspenso desde o dia seguinte (27) por decisão do juiz Gustavo Müller Lorenzato, da 1ª Vara da Fazenda Pública, que concedeu liminar ao Partido Rede Sustentabilidade, do vereador Marcos Papa.
No entanto, na semana passada, no dia 13, o presidente do TJSP, desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, liberou o reajuste. A Mesa Diretora da Câmara é formada pelo presidente Igor Oliveira, os vices Orlando Pesoti (PDT) e Alessandro Maraca (MDB) e os secretários Lincoln Fernandes e Fabiano Guimarães. Entre as argumentações dos vereadores que compõem a Mesa Diretora da Câmara está o fato do valor da passagem em Ribeirão Preto ser superior a de cidades como São Paulo (R$ 4) e Rio de Janeiro (R$ 3,95).
Há ainda a citação feita pelo próprio presidente do Tribunal de Justiça em sua decisão, onde Pereira Calças admite que existem várias obrigações contratuais não cumpridas pelo Consórcio PróUrbano. Para os parlamentares, esses motivos justificariam o “congelamento” da tarifa. O Partido Rede Sustentabilidade estuda a possibilidade de recorrer da decisão do Tribunal de Justiça. O juiz de primeira instância chegou a impor, em caso de descumprimento da decisão judicial, multa diária de R$ 100 mil a ser revertida ao Fundo Estadual de Interesses Difusos e Coletivos.
O percentual de reajuste concedido ao Consórcio PróUrbano, de 6,33%, está bem acima da inflação dos últimos doze meses, de julho do ano passado a junho de 2018, com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que é de 2,5%, igual ao reajuste salarial dos 9.988 servidores municipais e dos cerca de 800 motoristas de ônibus de Ribeirão Preto.
O Consórcio PróUrbano apresentou um estudo de revisão tarifária em que pedia reajuste de 19,24%, com a passagem saltando de R$ 3,95 para R$ 4,71, aporte de R$ 0,76, que seria o ideal segundo estudos da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). A justificativa do grupo para esse aumento foi devido à queda do número de passageiros que são diariamente transportados, ocasionando um déficit financeiro.
Diz que a quantidade de passageiros caiu 9,1% – de 165 mil em 2012, quando o contrato de concessão foi assinado, para 150 mil por dia hoje. No ano passado, o valor da passagem de ônibus em Ribeirão Preto subiu de R$ 3,80 para R$ 3,95, alta de 3,94% e aporte de R$ 0,15. O PróUrbano – formado pelas empresas Rápido D`Oeste (40%), Transcorp (30%) e Turb (30%) – tem uma frota de 356 ônibus que operam 118 linhas.
Análise
Para Marco Aurélio Damião, advogado especializado em direito público, “a tentativa da Câmara de derrubar o decreto do Executivo não terá efeitos práticos, visto que o ato do prefeito, que autorizou o aumento do valor da tarifa do transporte público, foi legitimado pela decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Ora, se o decreto editado pelo prefeito Nogueira foi considerado ‘legal’ pelo TJSP, um ato do Legislativo não terá respaldo jurídico para suspender os efeitos da majoração da tarifa.”
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Depois de a Câmara rejeitar, por unanimidade, o projeto do Executivo que autorizava a exploração de publicidade nos pontos de ônibus da cidade, o vereador Marcos Papa (Rede) decidiu elaborar uma minuta de projeto de lei com os tópicos que, segundo ele, precisam ser alterados na proposta original. Entre as mudanças está a destinação dos recursos arrecadados com a propaganda como receitas acessórias do contrato de concessão do transporte coletivo. Com isso, segundo Papa, será possível reduzir o valor da tarifa em até 40 centavos. Como não é competência do parlamentar elaborar este tipo de projeto, ele enviará a minuta para a prefeitura em forma de indicação.
Vereador quer ônibus de graça
Jorge Parada (PT) foi mais radical e protocolou na Câmara, na tarde de terça-feira (18), um projeto que institui a gratuidade na tarifa de ônibus coletivo em Ribeirão Preto. O objetivo é democratizar o acesso ao transporte público, oferecendo a isenção de pagamento das passagens e oferecendo maior qualidade para os usuários. Ele propõe oito formas de fontes de financiamento para custear esse benefício, como multas de trânsito, vendas de créditos de carbono, taxas pagas ao município, publicidade em pontos e abrigos, terminais e nos próprios veículos, dotação orçamentária, utilização do gás obtido do lixo, aterro sanitário e do tratamento de esgoto como combustível e outros tópicos.
Além disso, a proposta cria o Conselho Municipal de Transportes com poderes deliberativos e composto por onze membros eleitos entre os cidadãos residentes em Ribeirão Preto há mais de três anos e maiores de 18 anos na mesma eleição dos vereadores. Parada diz que “já existem no mundo 86 cidades, em 24 países, que aboliram a cobrança pelo transporte coletivo. No Brasil já são várias experiências bem-sucedidas, como é o caso das cidades paulistas de Agudos, Jardinópolis e Paulínia, que implantaram modelos próprios de transporte gratuito e operam com sucesso esse novo sistema”
Ele ressalta que “essa experiência também foi bem sucedida em outros países, como Estônia, Estados Unidos e França, que aboliram as tarifas de todo o transporte público e, segundo as regras adotadas, os cidadãos podem viajar quantas vezes quiserem sem desembolsar nada”, justifica o vereador. O projeto aguarda parecer das comissões de Constituição e Justiça e Orçamento e Finanças para entrar na pauta da sessão ordinária e ser votada em plenário. Mas mesmo que seja aprovado, a prefeitura deve alegar inconstitucionalidade e questionar a ideia no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).