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Surpresa

A pequena cidade na região de Ribeirão Preto era sufocada por um mar de cafeeiros. A maioria de seus habitantes morava nas fazendas ao redor, mas, muitos cafeicultores mantinham casa na cidade. Aos domingos, os colonos vinham se abastecer no pequeno e florescente comércio da localidade.

Embora pequena, quase uma vila, a cidade era limpa, organizada. Seu jardim cheio de flores e de estudantes, quando saíam do grupo escolar.

O Prefeito era o Coronel Aureliano, que a governava com gosto, sempre trazendo um circo, uma nova atração para dis­trair alguns fins de semana dos moradores.

Tomando ciência de que bravo aviador gaúcho estava reali­zando voos de demonstração de seu avião, chamou o secretário e mandou que assuntasse possível visita do mesmo à cidade. Seria um grande feito, pois o avião havia sido criado por San­tos-Dumont há pouco tempo e a exibição em Ribeirão Preto, tinha sido um sucesso incomum.

No sossego da casa da cidade, o Prefeito comentou com D. Emerenciana, sua esposa, a ideia de convidar o aviador, o que causou o espanto da mulher. “Aureliano, isto é muito perigoso! E se o avião cair”?

O Prefeito, cuidadosamente, mudou de assunto, pois a pers­pectiva do voo já entusiasmava o pequeno pessoal da Prefeitu­ra e logo seria comunicado a todos, através do alto-falante da Praça da Matriz.

Tornada pública a novidade, agitou-se a pequena popula­ção, na expectativa de ver a extraordinária invenção.

No começo da semana, por telefone, o secretário acertou a exibição, combinou os honorários do aviador e informou o prefeito de que ele seria convidado a dar uma volta no avião, pioneirismo único, que o tornaria ainda mais admirado pela população.

O prefeito reagiu imediatamente: “Não subo nessa gerin­gonça. Não sou candidato ao suicídio”. E seguiu-se uma discus­são, o secretário insistindo, o prefeito refugando.

Para evitar constrangimento, o prefeito combinou com a mulher que, quando o convite fosse feito para voar, ela interviria, proibindo o marido, em nome dela e das crianças pequenas do casal.

No dia aprazado, o pequeno campo de pouso improvisado na entrada da cidade fervia de gente. Com suas roupas domini­cais, famílias inteiras disputavam espaço para ver a novidade.

No horário fixado, um pequeno ponto preto vai crescendo no céu. Murmúrio geral e a pequena aeronave, depois de fazer uma curva sobre todos, pousa, aos trancos, na pista de terra. Delírio geral. Como pode o homem voar?

O aeroplano vai se aproximando devagar do ponto onde se localizava a comitiva do prefeito. Dele, desce o piloto, logo cercado pela multidão, que o aplaude. Muitos querem tocar em sua jaqueta grossa de couro.

O prefeito faz pequeno discurso, saudando o visitante e realçando a importância da visita. Este agradece e como era de costume, convida o chefe do executivo para voar sobre sua cidade.
O prefeito olha para a mulher, esperando a sua intervenção.

Ocorre que D. Emerenciana se deixa contagiar pelo entu­siasmo do povo e pela beleza da novidade. E incentiva: “Vá Aureliano, experimente o avião. Você vai gostar”

Sem outra possibilidade, o Coronel Aureliano se aboleta no aeroplano e, aplaudido pelo povo, lança-se sobre os céus de seu feudo político, morrendo de medo.

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