A determinação do juiz Reginaldo Siqueira, da 1ª Vara da Fazenda Pública, para que a Câmara de Vereadores e a prefeitura de Ribeirão Preto suspendam o pagamento da incorporação que gerou os chamados “supersalários” no funcionalismo público municipal, criou um clima de incerteza em vários servidores dos dois poderes. No entanto, a população é favorável ao fim da gratificação.
Duas entidades de classe também se manifestaram a favor da extinção da chamada “incorporação inversa”: a Associação Comercial e Industria de Ribeirão Preto (Acirp) e o Instituto Ribeirão 2030. Segundo fontes ouvidas pelo Tribuna, é visível o clima de tristeza entre os servidores. A decisão foi publicada no Diário Oficial Eletrônico de quarta-feira, 1º de agosto, e atinge quem já tenha exercido cargo em comissão, antes de ter sido aprovado em concurso público, seja do Legislativo ou do Executivo.
Entretanto, a decisão da justiça só deverá afetar o bolso dos servidores atingidos pela lei no salário de agosto. Isso porque, o salário de julho já foi pago. A prefeitura realiza o pagamento no dia 30 e a Câmara, no dia 25 de cada mês. Com a determinação judicial, o vencimento de vários servidores pode diminuir drasticamente, já que o magistrado barrou a gratificação de quem já exerceu cargo comissionado e depois incorporou o valor ao salário. Ele não suspendeu o pagamento das incorporações recebidas por quem exerce cargo em comissão após ser nomeado, que é a outra parte da lei.
Ao deferir parcialmente a tutela antecipada (liminar), o magistrado, apesar de entender que as leis 2.515 e 2.518, ambas de 2012, ferem a Constituição Federal, diz que a decisão final sobre a inconstitucionalidade da gratificação ainda será analisada, depois que o Legislativo e o Palácio Rio Branco apresentarem defesa. Por enquanto, ninguém terá de devolver dinheiro ao erário.
A chamada “incorporação inversa” eleva os salários de um grupo de 35 funcionários da Câmara e outros cerca de 1.460 da prefeitura (900) e do Instituto de Previdência dos Municipiários (IPM) – 500 aposentados e 60 pensionistas – a patamares muito acima da média, mais elevados até do que os subsídios do prefeito e dos vereadores. Também estão no polo passivo o Serviço de Assistência à Saúde dos Municipiários (Sassom) e do Departamento de Água e Esgotos (Daerp).
No Legislativo, o custo dos supersalários, com base na lei nº 2.515/2012, é estimado em R$ 1,64 milhão por ano. O IPM informou que desembolsa R$ 13 milhões anualmente. A administração direta não tem um levantamento, mas o Sindicato dos Servidores Municipais de Ribeirão Preto (SSM/SRP) estima que o número passe de três mil servidores, com gasto mensal de R$ 10 milhões – R$ 130 milhões por ano, contando o 13º. No entanto, trata-se de uma estimativa. A lei que autorizou o pagamento no IPM é a nº 2.518/2012.
Em seu despacho, o magistrado pontua que “presentes a probabilidade do direito e o perigo de dano, defiro em parte a tutela antecipada para determinar que a ré se abstenha de pagar aos servidores públicos municipais a incorporação relativa a ‘cargo em comissão’ prevista no §7º do artigo 50 da lei nº 2.515/2012.)”. Em seu parecer, o promotor Wanderley Trindade, do Ministério Público Estadual (MPE), chama de “ilegal”, “inconstitucional” e de “manobra” a incorporação incluída nas leis nº 2.515, de 2012.
O Sindicato dos Servidores Municipais de Ribeirão Preto acredita que neste momento a decisão da Justiça atingirá apenas os funcionários da Câmara. Mesmo assim, a entidade está realizando reuniões com o seu departamento jurídico para decidir como poderá ajudá -los. “Como não somos parte desta ação, temos que analisar e encontrar uma maneira jurídica para agir em nome destes servidores”, afirma o presidente do SSM/RP, Laerte Carlos Augusto. Procuradas para falar sobre o assunto, tanto a prefeitura quanto a Câmara informaram que ainda não haviam sido notificadas, mas que vão tomar as medidas legais cabíveis quando isso ocorrer.
Acirp, instituto e professor de Direito criticam as leis
Para o professor de Direito Administrativo da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP), Gustavo Assed Ferreira, a liminar da Justiça sinaliza que a decisão de não pagamento das incorporações deverá ser mantida quando do julgamento do mérito da ação. Devem ser atingidos pela decisão os servidores que foram beneficiados com uma gratificação passada, ou seja, anterior a sua nomeação por concurso público.
“O normal no serviço público é o servidor concursado que ocupa um cargo de chefia incorporar ao salário, depois de certo tempo, o que recebe a mais pelo exercício desta função. O que fizeram em Ribeirão Preto foi o contrário. Algo totalmente inconstitucional”, afirma. O professor não acredita, porém, que os servidores terão que devolver o que já receberam. Isso porque eles receberam o valor a mais no salário de boa fé, acreditando que esta incorporação era legal. “Contudo, as gratificações futuras devem ser extintas em nome da legalidade”, conclui.
O presidente da Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto (Acirp), Dorival Balbino, também defende o fim dos privilégios e acredita que a Justiça está agindo corretamente. “As irregularidades e a ilegalidade que notamos na lei dos supersalários estão sendo comprovadas pela ação do Ministério Público e pela liminar concedida pela Justiça. Esta lei atende a uma pequena minoria e desvaloriza o plano de carreira dos próprios servidores. Iremos continuar pressionando junto com as demais entidades que representam a sociedade para que a ilegalidade seja definitivamente desfeita e que o dinheiro retorne para a comunidade para que seja utilizado da melhor forma”, completa.