A Câmara de Vereadores lançou uma força tarefa para cumprir a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP), que congelou os chamados “supersalários” de 35 servidores do Legislativo de Ribeirão Preto. Desde segunda-feira, 22 de maio, cinco funcionários do Departamento de Recursos Humanos trabalham diariamente até a meia-noite para fazer os cálculos.
O esforço é necessário porque a Câmara tem de analisar a vida profissional de cada funcionário desde a data da contratação, os cargos que ocupou e as incorporações recebidas pelo servidor. O Legislativo está checando quais trabalhadores se encontram na situação descrita no acórdão.
Em 2018, de forma antecipada, o Legislativo já havia feito cortes no salário de diversos servidores para adequação legal. A previsão é que, até esta quinta-feira (25), os cálculos sejam finalizados e a folha de pagamento – em tese atrasada – dos 93 concursados seja liberada.
Por lei, o pagamento dos servidores municipais pode ser feito até o último dia de cada mês, mas há muitos anos tem sido feito no dia 20. O vencimento de 110 servidores comissionados, por receberem salário sem incorporações, já foi creditado com o reajuste de 6% concedido pela administração municipal à categoria. A folha de pagamento da prefeitura (somando administração direta e a indireta) terá um acréscimo de R$ 92 milhões por ano.
Outros R$ 7 milhões extras serão gastos com o reajuste de 12% do vale-alimentação de servidores das 16 secretarias, gabinete, comunicação, Fundo Social de Solidariedade e outras repartições. O mesmo percentual vale para o auxílio nutricional pago a aposentados e pensionistas do Instituto de Previdência dos Municipiários (IPM).
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a decisão do ministro Alexandre de Moraes, que em 3 de novembro do ano passado acatou a modulação imposta pelo Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o pagamento de “supersalários” na Câmara de Ribeirão Preto.
O caso foi parar no STF porque a Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) não concordou com a decisão do Tribunal de Justiça de apenas congelar os “supersalários”, mas os onze ministros que julgaram o recurso foram unânimes em acompanhar o voto de Alexandre de Moraes, relator do caso. A decisão data de 15 de março.
Moraes argumenta que o STF segue o mesmo entendimento de que os salários com incorporações pagos aos servidores até a data da vigência da emenda constitucional nº 103, de novembro de 2019, não devem sofrer decréscimo até que a diferença apurada seja absorvida por aumentos futuros. É essa conta que obrigou a Câmara a lançar a força-tarefa.
Embargos
A Corte Paulista decidiu manter o pagamento dos chamados “supersalários” para os cerca de 35 servidores do Legislativo. A decisão consta de acórdão publicado no dia 15 de março de 2022, resultado da análise de embargos de declaração movidos pela Câmara contra a decisão do Tribunal de Justiça, de agosto de 2021, que havia considerado inconstitucionais diversos benefícios e determinado a interrupção desses pagamentos.
Congelamento
Apesar de manter os benefícios, o TJ/SP determinou o congelamento dos salários até que a parcela do contracheque considerada ilegal seja superada. Significa que a Câmara deverá analisar qual é o montante considerado indevido recebido por cada funcionário e congelar os aumentos até esse valor ser alcançado pela parte constitucional do holerite.
Ação
A ação foi impetrada em 19 de janeiro de 2021 pelo procurador-geral de Justiça, Mário Luiz Sarrubbo. Ele acatou representação oferecida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Ribeirão Preto. Em um dos casos, Sarrubo cita que um servidor recebe R$ 23.244,34 em razão das gratificações, sendo que o salário real é de R$ 3.507,74.
O Judiciário declarou a inconstitucionalidade de três leis municipais que permitiam a incorporação de várias gratificações a servidores da Câmara, sendo que muitas delas beneficiavam ocupantes de cargos em comissão (não concursados).
A decisão impede a acumulação das incorporações e barra o recebimento de gratificação por dedicação em Regime de Tempo Integral (RTI) aos funcionários públicos comissionados. Na ação, o MPSP aponta irregularidades nas legislações que permitiram aos servidores incorporar gratificações indevidas, a chamada “incorporação inversa”.
ENTENDA: Polêmica dos supersalários
A chamada “incorporação inversa” elevou os salários de um grupo de 35 funcionários da Câmara a patamares muito acima da média. Quando instaurou o inquérito civil, o promotor Wanderley Trindade chamou de “ilegal”, “inconstitucional” e de “manobra” a incorporação incluída no artigo 50, parágrafo 7º da lei nº 2.515/2012. A emenda foi aprovada junto ao projeto de reajuste salarial dos servidores em 2012, sem alarde e publicidade.
A aprovação permitiu a funcionários públicos antes comissionados em gabinetes de vereadores um privilégio. Ao serem aprovados em concursos públicos para cargos de nível fundamental e salário de cerca de R$ 1,6 mil, puderam engordar o holerite com os valores que recebiam quando eram assessores.
Na Câmara de Ribeirão Preto, servidores aprovados em processos seletivos com remuneração inferior a R$ 2 mil já começavam a trabalhar com vencimentos acima de R$ 20 mil, casos de uma porteira e uma telefonista. Hoje isso já não é mais possível. Porém, a revogação da emenda não retroagiu, e quem foi beneficiado continua a receber altos valores. O Tribunal de Justiça de São Paulo também barrou as incorporações previstas nas leis números 5.081/1987 e 3.181/1976.