O número de suicídios entre os policiais civis de São Paulo aumentou 150% nos últimos cinco anos. Segundo dados da Academia de Polícia Civil de São Paulo, revelados durante a “Palestra de Prevenção ao Suicídio, realizada pelo delegado professor Roberto Santos da Silva, enquanto em 2014 foram registrados quatro casos, em 2018 esse número saltou para dez. Durante esse período, 33 policiais tiraram a própria vida.
A incidência do suicídio no período analisado foi maior entre investigadores de polícia (12 casos), carcereiros (cinco), cargo extinto em 2013 e transformado este ano em agente policial, e escrivães (quatro). As menores incidências estão entre os papiloscopistas e os atendentes de necrotério, com um caso cada. As carreiras de agente policial, agente de telecomunicações, delegado, auxiliar de papiloscopista e fotógrafo técnico-pericial computaram, cada uma delas, dois casos. A maioria das vítimas é do sexo masculino, com 26 ocorrências.
Os dados revelam que, em São Paulo, o suicídio mata mais policial civil do que o confronto com criminosos. Segundo relatório enviado ao Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp), pela Secretaria de Segurança Pública (SSP), o número de suicídios registrados entre os anos de 2014 e 2018 foi 150% maior que a incidência de mortes em ações de combate ao crime. Os dados foram obtidos em resposta ao ofício encaminhado pela presidente da entidade sindical, Raquel Kobashi Gallinati.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 90% dos casos podem ser evitados se o paciente tiver atendimento especializado adequado. Buscar ajuda é fundamental. Mas a Polícia Civil de São Paulo oferece um serviço de apoio tímido destinado à classe, que está historicamente mais propensa ao suicídio, conforme revelam estudos feitos em várias partes do mundo.
Raquel Kobashi Gallinati, que é especialista em Ciências Penais, acredita que essa realidade é um reflexo direto do sucateamento da Polícia Civil ao longo de décadas e a desvalorização dos policiais paulistas, que recebem os piores salários do Brasil.
“Percorremos todo o interior de São Paulo e em todos os dez Deinters (Departamentos de Polícia Judiciária de São Paulo Interior) visitados colhemos relatos de policiais que estão acumulando funções em jornadas ininterruptas, desrespeitando normas internacionais do trabalho. Temos policiais desempenhando a função de até cinco colegas e a consequência disso é o aumento dos problemas relacionados ao estresse, síndrome de burnout e a depressão”, afirma a sindicalista.
Outra reclamação constante é o aumento do número de afastamentos por doenças psiquiátricas, como a depressão. “Não foram poucas as vezes em que um policial nos procurou para falar que muitos colegas estão adoecendo por sobrecarga decorrente do deficit de profissionais que, hoje, chega a 14.206 profissionais, o equivalente a 34% de todo efetivo da Polícia Civil no Estado”, completa a presidente do Sindpesp.
Por causa dessa situação, o Sindpesp enviou uma reclamação à Organização Internacional do Trabalho (OIT), denunciando as precárias condições na Polícia Civil de São Paulo. Esse cenário se soma à já desgastante carreira policial, que encabeça a lista de profissões mais propensas a cometer o suicídio. Uma pesquisa recente feita por cientistas norte-americanos publicada no American Journal of Preventive Medicine revelou que o local de trabalho tem grande influência na decisão de tirar a própria vida. De acordo com um levantamento, policiais, agricultores, médicos e soldados são as profissões que mais estão relacionadas ao suicídio.
E é justamente para enfrentar essa realidade que o Sindpesp defende que o efetivo da Polícia Civil do Estado de São Paulo tenha acesso a um atendimento psicológico mais amplo e que este serviço seja mais divulgado. “O bem-estar emocional do policial deve ser prioridade do governo, já que sua atividade é de risco. Os gestores da Segurança Púbica não podem medir esforços para que eles tenham o atendimento adequado, condizente com os riscos da profissão e com a atual situação da Polícia Civil. É preciso amplificar o tímido serviço existente e investir em campanhas de conscientização e prevenção ao suicídio, para que colegas de profissão de todo o Estado tenham acesso a informações e serviços que têm o poder de salvar vidas”, finaliza Raquel Gallinati.