O Campeonato Brasileiro voltou e duas mortes já foram registradas após brigas entre torcidas. Em 2019, ao longo da competição nacional, ocorreram nove óbitos e três estão em investigação de acordo com o sociólogo Maurício Murad. “Podemos chegar a 12, o que é uma média alta”, analisa o pesquisador que há 30 anos estuda o comportamento e a violência entre os torcedores de futebol. “Precisamos de um plano estratégico com ações de curto, médio e longo prazo. Ele deve envolver repressão, prevenção, educação e a criação de uma cultura de paz, na qual se veja o time contrário como adversário, e não um inimigo a ser aniquilado”. Entre as medidas elencadas, a criação de um disque-denúncia especializado, monitoramento das redes sociais, campanhas com ídolos do passado e do presente e inteligência para identificar e punir os bandidos.
Professor aposentado da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Murad alerta que grupos criminosos infiltraram-se nas torcidas organizadas, assim como em outras manifestações populares que reúnam multidões. “São minorias violentas e cruéis, cerca de 5% dos integrantes dessas associações, que precisam sofrer a mão dura do Estado. O cidadão não pode perder o direito ao lazer e ao ir e vir, ficando à mercê dessa turma que tem armas e drogas. É preciso separar o joio do trigo”, aponta, criticando as políticas paliativas das autoridades, como adotar torcida única ou dissolver as facções organizadas. “Em 94% das vezes, os conflitos ocorrem longe dos estádios. Agora, com a pandemia [de covid-19] nem há público, mesmo assim as tragédias seguem ocorrendo entre jovens na faixa etária dos 16 aos 2.5.
No último domingo (23), a cerca de 38 quilômetros de distância do estádio Morumbi, onde jogavam Palmeiras e Santos, duas pessoas morreram após confronto entre torcidas. As vítimas baleadas tinham 22 e 21 anos e o suspeito dos disparos, 21. “Hoje com a covid-19, fala-se muito em ouvir as ciências médicas, mas também precisamos respeitar as ciências sociais. Esta violência no futebol insere-se dentro do contexto brasileiro em que as milícias e o Primeiro Comando da Capital (PCC) espalharam-se pelo país, assim como o tráfico. O crack, por exemplo, está presente em 99,9% dos 5.570 municípios brasileiros”, afirma Murad, lembrando que as redes sociais potencializam os choques entre as gangues e que o Campeonato Brasileiro é o momento em que se acirram as rivalidades e acontecem parcerias entre torcidas de diferentes estados.
“Elas se unem para lutar contra algum inimigo em comum. Sob o anonimato da internet, com perfis falsos, adicionam provocações e, inclusive, enganam a polícia marcando confrontos fakes para despistar. Esse campo virtual precisa ser ocupado pela segurança pública, que necessita receber investimentos para prevenir os problemas, porque vai trazer mais economia e eficiência. Não pode ter paternalismo com esses caras, mas só a repressão não basta. Esta sangria precisa ser estancada e o futebol, um patrimônio coletivo da nossa cultura, preservado e livre desses grupelhos delituosos”, acrescentou.
Edição: Cláudia Soares Rodrigues