Engana-se quem pensa que os ataques do presidente Jair Bolsonaro contra o Supremo Tribunal Federal e contra o Judiciário são fenômenos distantes e isolados. Em Ribeirão Preto, sob o comando de Nogueira, o governo municipal age como se tudo ao final dependesse, não das regras institucionais e legais, mas da esperteza de cada um. Para o atual governo, o peso da lei e, por consequência, o peso das manifestações judiciais perderam completamente a importância.
Veja, por exemplo, a desconsideração do atual governo em relação a dois despachos do eminente desembargador Jacob Valente, do Tribunal de Justiça de São Paulo. A Lei Orgânica de Ribeirão Preto, uma verdadeira Constituição da nossa cidade, diz que uma entidade da administração indireta do Município é detentora, com exclusividade, da titularidade dos serviços de água e esgotos sanitários. Essa entidade da administração indireta é o DAERP. É o que prescreve a Lei Orgânica do Município, goste ou não.
O prefeito não gostou de saber o que estava escrito na lei e para se ver desobrigado de respeitar o que manda o inciso I do § 2º do art. 160 da Lei Orgânica do Município de Ribeirão Preto, ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça de São Paulo para suspender a aplicação dessa regra.
No entanto, depois de apreciar com atenção e prudência todos os argumentos do prefeito, o desembargador Jacob Valente negou suspender a regra que impede a extinção do DAERP. Mais do que negar, o desembargador apontou a existência de risco de irreversibilidade e danos ao erário público. Nogueira apresentou um outro recurso, insistindo na suspensão. E novamente teve o seu pedido negado.
Em total desrespeito ao Estado Democrático de Direito, em especial a um de seus mais importantes elementos: o Poder Judiciário – que havia recusado o pedido de suspensão da lei, o governo Nogueira simplesmente resolveu dar a si próprio um salvo conduto para descumprir o inciso I do § 2º do art. 160 da Lei Orgânica do Município de Ribeirão Preto e extinguiu, ilegalmente, o DAERP – uma autarquia pública municipal eficiente, sustentável e estratégica para Ribeirão Preto.
Quando tomou posse no cargo, o atual prefeito havia prestado o expresso compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição e observar as leis, conforme determina o art. 78 da Constituição da República. No caso concreto, como se observa, simplesmente ignorou esse juramento.
As afrontas ao Poder Judiciário devem ser rechaçadas – sejam elas feitas de forma mais ruidosa como fazem autoridades do governo federal, sejam elas feitas de forma mais ardilosa – como vem fazendo o atual governo de Ribeirão Preto.
No Estado Democrático de Direito, não há espaço para exercício do poder fora da lei. Num Estado Democrático de Direito, nenhuma autoridade pública está dispensada de governar sem observar o ordenamento jurídico.
A extinção do DAERP traz inúmeros prejuízos para os serviços de água e esgoto de Ribeirão Preto e compromete a médio prazo a sustentabilidade do sistema. Da forma ilegal e ardilosa como foi feita, com o governo sabendo por “a” mais “b” que a lei orgânica que vetava tal extinção foi considerada válida em dois despachos judiciais, a extinção ilegal do DAERP é um ataque direto à própria Justiça.
Poder Judiciário que esperamos sempre sereno, mas firme. Poder Judiciário que eu, nossa categoria, nosso sindicato e uma parte expressiva dos brasileiros devotamos o mais profundo respeito como instância legítima e imparcial de resolução de conflitos sociais, políticos e econômicos.