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Sobre o Centenário da Semana da Arte Moderna

Em todo o país eclodem atividades em comemoração ao Centenário da Semana da Arte Moderna de 1922, consi­derada o marco do modernismo no Brasil. Anita Malfatti, Mário de Andrade, Menotti Del Picchia, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral influenciados pelo que ocorria na Eu­ropa, reuniram uma verdadeira seleção que contou, ainda, com Di Cavalcanti, Yan de Almeida Prado, Victor Brecheret, Hildegardo Leão Velloso, Wilhelm Haarberg, Antonio Garcia Moya, Georg Przyrembel, Sérgio Milliet, Plínio Salgado, Villa-Lobos e Guiomar Novais que com talento e ousadia quebraram os padrões estéticos da cultura nacional.

Um dos acontecimentos mais polêmicos e significativos de nossa história continua trazendo reflexos e aquela agradável transgressão ainda inspira muita gente. Cumpre registar que para muitos o primeiro marco histórico do modernismo seria a Exposição de Pintura Moderna – Anita Malfatti, iniciada em 12 de dezembro de 1917. Existe, ainda, quem destaque que, apesar da sua relevância, a Semana excluiu vários grupos daquele debate cultural.

A Semana também tinha seu lado político, sendo financia­da pela oligarquia de São Paulo interessada em superar o Rio de Janeiro como referência cultural. Foi a efervescência pau­lista se contrapondo ao conservadorismo carioca. A Semana foi bem brasileira, pois durou apenas três dias, outro fato característico foi a incompreensão típica daqueles que ficam incomodados com os movimentos de vanguarda.

O público não gostou do evento e a cada apresentação musical ou declamação de poesia, as vaias ecoavam pelo Teatro Municipal de São Paulo. As pinturas e esculturas rece­beram olhares assombrados e críticas contundentes de quem não entendia aquelas imagens e quadros estranhos, que hoje valem verdadeiras fortunas, como a pintura a óleo “A Caipi­rinha”, de 1923, que retrata a infância de Tarsila do Amaral arrematada em leilão, no final de 2020 por R$ 57,5 milhões.

Passados cem anos, o Brasil enfrenta uma intensa guerra cultural onde a classe artística em geral está desarticulada, es­pecialmente pela necessidade de sobrevivência. Na pandemia foi o primeiro setor a parar e o último autorizado a retomar suas atividades. Se o governo Temer iniciou o desmonte com a extinção do Ministério da Cultura, o atual aprofundou com a mudança desastrosa na presidência da Fundação Cultu­ral Palmares, na nomeação de um secretário da cultura que parece não acreditar em cultura, na demora de aprovação e repasse de auxílio financeiro instituído pela Lei Aldir Blanc e a recente mudança nas regras da Lei Rouanet que cortou pela metade o limite para captação de recursos, além de reduzir os cachês para artistas solo de R$ 45 mil para R$ 3 mil (excetu­ando apenas os maestros).

Através de uma obra de arte é possível transmitir ideias, crenças e emoções que nascem de uma pessoa, mas refletem o sentimento de milhares. Na atualidade existe espaço para todas as manifestações culturais, incluindo a contracultura com seu questionamento, negação e contrariedade às normas e padrões dominantes. Razão pela qual devemos conhecer e respeitar todas as manifestações, mesmo aquelas em que inicialmente não apreciamos tudo para evitar reproduzir os apupos de 1922.

Como dizia o sociólogo e ativista dos direitos humanos Herbert José de Sousa (Betinho), “Um país não muda pela sua economia, sua política e nem mesmo sua ciência; muda sim pela sua cultura.” Que todas as expressões culturais brasi­leiras sejam incentivadas e que a população tenha acesso. Fica o desejo de que em 2122 nossos descendentes tenham boas coisas para lembrar e comemorar não só daquela Semana, mas especialmente dos tempos atuais.

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