O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP) e o HC Criança farão neste sábado, 19 de agosto, a quarta e última cirurgia nas irmãs siamesas Allana e Mariah. No procedimento, as meninas que estão com dois anos e oito meses, serão finalmente separadas.
A equipe de Neurocirurgia, liderada pelo professor doutor Hélio Rubens Machado, fará a dissecção de cerca de 25% dos vasos sanguíneos restantes. Os demais 75% já foram separados nas três neurocirurgias anteriores, que ocorreram em agosto e novembro de 2022 e março deste ano. A cirurgia deste sábado deve durar cerca de 20 horas e contará com a participação de 50 profissionais.
A equipe da Cirurgia Plástica, liderada pelo professor doutor Jayme Farina Júnior, será responsável pela cranioplastia. O procedimento fará o fechamento da calota craniana e da pele que recobre a cabeça de cada uma das meninas. Nesta sexta-feira (18), as equipes dos hospitais acertaram os últimos detalhes para a cirurgia que ocorrerá neste sábado.
Ao longo de meses, foram feitas diversas reuniões e estudos para que a cirurgia seja feita da melhor maneira possível. Hoje, cerca de 20 profissionais se reuniram na sala do HC Criança para alinhar a jornada e detalhes cirúrgicos: ordem dos acontecimentos, o que será feito por cada equipe e prevenção e manejo de riscos.
A cirurgia para separação definitiva estava agendada para 29 de julho, mas foi adiada por causa do estado febril das gêmeas, com suspeita de dengue. Elas já passaram pela expansão final das bolsas instaladas sob a pele das cabeças, que promovem ganho de tecido para a cobertura craniana que será feita após a cirurgia de separação.
Com esse procedimento, as bolsas atingiram volume de 530 mililitros e 670 ml cada. As gêmeas craniópagas – nasceram unidas pela cabeça – são de Piquerobi, na região de Presidente Prudente, no interior paulista. Allana e Mariah estão sendo cuidadas pela equipe chefiada pelo professor doutor Hélio Rubens Machado.
Os exames e procedimentos de abril vão influenciar na última cirurgia, quando elas serão separadas definitivamente e os médicos farão a reconstituição craniana. As gêmeas fizeram exames de tomografia computadorizada e ressonância magnética.
As imagens obtidas, além de auxiliar no procedimento de abril, foram utilizadas para o planejamento desta nova neurocirurgia. A equipe do professor doutor Jayme Farina Júnior promoveu a inserção de expansores de tecido. A bolsa é feita em silicone e todo o conjunto – junto com catéter e válvula ficam instalados sob a pele.
Periodicamente está sendo introduzido soro fisiológico na bolsa. O objetivo é garantir o progressivo aumento de volume e ampliação da pele que recobre a cabeça das meninas. A equipe do Hemocentro de Ribeirão Preto também participou do procedimento. Eles fizeram a punção da crista ilíaca (osso do quadril) para a coleta das células-tronco. O material será cultivado e preparado para futura utilização.
Inovação
Células-tronco são células colhidas na medula óssea que podem se diferenciar para a produção de diferentes tecidos e formar ossos, cartilagens ou gordura. A partir do procedimento, as células-tronco serão multiplicadas e serão utilizadas para a formação óssea na reconstrução craniana das meninas.
Esta é a primeira vez no mundo que essa tecnologia será utilizada na reconstrução dos ossos de gêmeas craniópagas e é a primeira vez no Brasil em que as células-tronco colaborarão na reconstrução craniana. Em uma simplificação, os fragmentos ósseos são azulejos e o material que vai conter as células-tronco é o rejunte.
Na última cirurgia, quando a equipe da cirurgia plástica for reconstruir o crânio, as células-tronco estarão presentes em dois materiais: o primeiro, uma espécie da massa que preencherá os espaços entre os fragmentos de ossos, e o segundo, um gel que cobrirá e fará uma camada protetora. A equipe e a família das gêmeas estão otimistas. As meninas são filhas de Talita Francisco e Vinícius dos Santos Cestari.
A primeira
A incidência de gêmeos unidos pela cabeça é extremamente rara, representando um caso em cada 2,5 milhões de nascimentos. No Brasil, a primeira separação de siamesas craniópagas, as gêmeas Maria Ysadora e Maria Ysabelle, ocorreu em outubro de 2018, após cinco procedimentos cirúrgicos, pela equipe do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto e HC Criança.
Nos Estados Unidos, uma cirurgia de separação como a delas custa cerca de R$ 9 milhões. O caso foi acompanhado pelo médico norte-americano James Goodrich, referência internacional em intervenções com gêmeos siameses e que faleceu por covid-19 em 2020.