Sérgio Roxo da Fonseca *
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As horas e os dias não são suficientes para trancara memória de alguém em cofres ou para guardar ou resguardar todos os passos dados pelos caminhos e pelos descaminhos de sua existência. O tempo é acusado de todos os sucessos e construtores de todos os tombos registrados e não registrados nos seus computadores.
Por esses caminhos, especialmente aqueles que davam os rumos das escolas públicas, pelos quais quase todos passavam, converteram-se nas marcas definitivas na memória, como se construídos com pedras solidificadas por eternas aplicações sensoriais.
Por muitos desses caminhos dobrei curvas e subi ladeiras nos momentos vividos no Otoniel Mota, então conhecido como Ginásio do Estado.
Reingressar naquele templo exige um grande esforço como se tratasse do lago de Lamartine, que transformou-se em palavras a dor da perda do tempo eternizado: “Assim sempre levados para novas margens, na noite eterna levados sem retorno, jamais poderemos lançar âncora, um só dia, no oceano das idades”.
A primeira aluna da classe, desde os primeiros passos, sempre foi a Walderez de Mathias Martins, filha de um ferroviário. Em nenhum momento de sua passagem pelos degraus do ensino deixou de ser a primeira aluna da classe. Hoje é conhecida como Walderez de Barros, atriz da TV-Globo, apresenta-se como a avó da novela “Almas Gêmeas”.
Outro extraordinário amigo foi e ainda é o Feres Sabino que, estacionado perto das áreas adversárias, marcava todos os gols da nossa equipe. Perdão, até hoje, mesmo movimentando-se mais do que naqueles tempos, foi elevado a chefe de todos os advogados públicos do Estado de São Paulo, durante o governo de Franco Montoro.
Da turma toda o Rubens Ely de Oliveira, o Rubinho, desde muito jovem transformou-se no nosso orador oficial. Tardiamente completou seu curso jurídicopara ingressar na carreira de Juiz de Direito, e assim encerrar seus brilhantes dias de vida.
O Laudo Costa, que nas horas vagas, estudava os possíveis idiomas estrangeiros, formado médico, especializou-se no tratamento de câncer dos olhos, que atacava, quase sempre, as crianças.
Sidney Beneti, filho do construtor dos nossos móveis, tornou-se Juiz de Direito. Foi presidente tanto da Escola Nacional de Magistratura e da União Internacional da Magistratura em Roma. Integrou as comissões de reforma dos Códigos de Processo Civil e Penal. Com a Ministra Nancy Andrighi, escreveu a obra “O Juiz na Audiência”. Viveu e conviveu com seus amigos residindo na casa de seus pais na esquina da Rua Américo Brasiliense com a Rua São José.
O Rui Flávio Guião, nosso então presidente do Parlamento Estudantil, hoje empresário, tornou-se responsável pelo estudo e a publicação da história de Ribeirão Peto.
O José Carlos Arouca também residia nas imediações da Igreja São José. Cursou a Faculdade de Medicina. Deixou trabalhos relevantes na aplicação da ciência médica para atendimento social, sustentando que “onde houver aplicação de dinheiro público, o atendimento deve ser universal”. Foi eleito Deputado Federal pelo Rio de Janeiro e presidente da FioCruz, Fundação Oswaldo Cruz, durante o governo de José Sarney.
A comunidade de Ribeirão Preto mantinha então em funcionamento três Conservatórios Musicais. Tive oportunidade de ouvir uma aluna do nosso então Ginásio do Estado apresentar no teatro Pedro II, o inesquecível 2º Concerto de Rachmaninoff cujas frases finais foram transformadas por Frank Sinatra na música popular “Lua Cheia e Braços Vazios” (“Full Moon and Empty Arms). Hoje músicas clássicas atraem quase sempre músicos orientais, como Lang Lang e Junchan Lin, que não se apresentaram ainda no Pedro II e nem estudaram perto daqui!
* Advogado, professor livre docente aposentado da Unesp, doutor, procurador de Justiça aposentado, e membro da Academia Ribeirãopretana de Letras