Tribuna Ribeirão
Economia

Sem insumos, indústria já atrasa suas entregas

MIGUEL ÂNGELO/CNI

A falta de insumos e a alta de preços de matérias-primas ameaçam comprometer a re­cuperação da indústria, pas­sado o período de isolamento social e retração econômica provocado pela covid-19. Em­presários relatam dificuldades para adquirir itens como pa­pelão, plástico e aço, o que tem levado algumas companhias a postergar entregas ou mesmo recusar novos pedidos.

Essa escassez também ba­teu nos preços dos bens inter­mediários consumidos pelo setor: a estimativa é de aumen­tos de até 30% nos últimos me­ses – com risco de repasse para o consumidor no varejo. Esse cenário aparece em duas pes­quisas diferentes encomenda­das pela Confederação Nacio­nal da Indústria (CNI) e pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

No primeiro caso, foram ou­vidas 1.855 empresas de 27 seto­res, entre 1º e 14 deste mês. Já a sondagem da Fiesp reuniu 414 companhias, entre os dias 7 e 13. A pesquisa da CNI mostra que 68% dos empresários já encon­tram dificuldades em adqui­rir no mercado doméstico os materiais usados na produção.

A importação desses insu­mos, que poderia ser uma saída, também está complicada para 56% das fábricas. Ainda pela sondagem, 82% das indústrias estão pagando mais caro pelas matérias-primas do que antes da crise. Para 31% delas, o aumento dos valores é “acentuado”.

O resultado da enquete da Fiesp vai na mesma direção. Dos consultados, 59,5% rela­tam dificuldades, por exemplo, para comprar papelão. E, quem encontra, tem de pagar até 30% mais do que antes da crise. No caso do aço, a escassez é maior e afeta 67% dos entrevistados.

Os efeitos da falta de bens intermediários para alimentar a produção da indústria já che­gam à ponta final do consumo. De acordo com a sondagem realizada pela CNI, 44% das fábricas consultadas relataram problemas para atender seus clientes, atrasando entregas ou até mesmo recusando novas encomendas. Em 8% dos ca­sos, uma parte grande da de­manda já não tem condições de ser atendida.

Entre as razões dadas pelos industriais, estão a falta de esto­ques (47%); uma demanda su­perior à capacidade de produção (41%); impossibilidade de pro­duzir mais (38%) e problemas de logística (13%). Apenas 4% indicaram a inadimplência dos clientes como uma razão para recusar pedidos.

Ainda pela pesquisa, 55% das indústrias só vislumbram uma normalização da oferta a partir de 2021, sendo que 16% não esperam voltar ao normal nos próximos seis meses. Ape­nas 8% delas acreditam que a situação pode se reverter em até um mês. Os setores mais pessi­mistas são os de papel e celulose, têxteis, alimentos, extração de minerais não metálicos, produ­tos de metal e móveis.

Para o presidente da Socie­dade Brasileira de Varejo e Con­sumo (SBVC), Eduardo Terra, a indústria brasileira vive um “desabastecimento crônico” de insumos. “Por enquanto, não percebemos o cenário de desa­bastecimento na ponta. O va­rejo e o atacado têm trabalha­do para que isso não aconteça.”

Repasse de preços
Além do entrave na dis­tribuição de produtos, um outro risco ronda o varejo: um possível repasse dos au­mentos de preços registrados nos últimos meses pelas prin­cipais matérias-primas. Pela sondagem da Fiesp, o reajus­te ponderado de custos foi de 22,8% de janeiro a agosto deste ano.

Já o percentual das empre­sas que pretendem repassar esses preços ao consumidor varia de 37,4% (vão repas­sar totalmente o reajuste) a 58,5% (repasse parcial). Uma alternativa apontada por 60,9% dos consultados foi “buscar outros fornecedores por menor preço”.

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