O Governo Turco acaba de anunciar que Santa Sofia – Hagia Sofia, em grego, – volta a ser mesquita muçulmana, adicionando novo capítulo à sua longa história, que se confunde com a história de Istambul. A antiga capital turca é uma das mais interessantes e belas cidades do mundo. Geograficamente, espraia-se por ambos os lados do Estreito de Bósforo, língua de água que une os mares de Mármara e Negro e que serve de fronteira entre a Europa e Ásia.
De manhã, quando o sol atinge suas pequenas e constantes ondas, parece um panapaná de borboletas azuis esvoaçando sobre a água. Último bastião europeu e primeiro asiático ou vice-versa, a cidade é uma simbiose das duas culturas e oferece grandes e imprevistas atrações. Historicamente, teria sido fundada em 667 a.C., por Bizas, chefe do povo grego de Mégara, daí seu primeiro nome Bizâncio.
O povoado foi se desenvolvendo muito lentamente, sujeito a várias guerras, até a chegada dos romanos, em 191 a.C. Várias batalhas a destruíram e era reconstruída sempre. Em 395, com a queda de Roma, torna-se a capital do Império Romano do Oriente e passa a se chamar Constantinopla, em homenagem ao Imperador Constantino e torna-se depositária de todo o conhecimento clássico, como centro do cristianismo e da cultura e língua gregas e romanas.
Grandes obras são feitas na cidade, como as muralhas que a protegiam e a Hagia Sophia (santa sabedoria), a majestosa catedral de Santa Sofia que por mil anos reinou sozinha como a maior igreja do mundo.
Em 1453, Constantinopla não aguenta o ataque do sultão Maomé II e cai sob domínio mulçumano. O vencedor adentra a Hagia Sophia com seu cavalo e a transforma em mesquita, tornando-a capital do Império Otomano. A cidade sofreu vários cercos e guerras, como as Cruzadas que a retomaram por breve período. Em 1923, com a Proclamação da República da Turquia, que põe fim aos seis séculos do Império Otomano, perde para Ancara sua condição de capital e passa a se chamar Istambul. A cidade tem inúmeros monumentos históricos, destacando-se a grandiosa Santa Sofia.
Foi erguida entre 532 e 537, para ser a Catedral de Constantinopla, sobre escombros de duas outras igrejas antigas. Era o maior templodo mundo, título que reteve por mil anos, até a construção da Catedral de Sevilha. O Imperador Constantino supervisou pessoalmente as obras e é ponto culminante da arquitetura bizantina. Seu interior resplandecia com pilares de granito e mármore e mosaicos de ouro, decorada com imagens da Virgem e dos santos.
Curioso que o seu nome original, Igreja da Santíssima Sabedoria de Deus, indica sua dedicação a segunda pessoa da Santíssima Trindade e não à santa romana de nome homônimo. Em 1453, com a tomada da cidade pelo Sultão Maomé II, foi transformada em mesquita e teve suas paredes cobertas com gesso, pois a religião muçulmana não permite imagens. Ganhou quatro minaretes, de onde eram conduzidos os cinco cultos diários. Em 1931, com a extinção do Império Otomano, foi dessacralizada e transformada em museu. Agora, volta a ser mesquita, para alegria de seus habitantes muçulmanos.
É muito emocionante adentrar o local testemunha de longos anos de história, ver seus desenhos e mosaicos restaurados e imaginar os dramas humanos e religiosos que se desenrolaram no seu interior. Caminhar embaixo de sua cúpula monumental recorda os passos de bizantinos, romanos, cruzados, muçulmanos que ali estiveram e ajudaram a construir sua história. Muito provavelmente os tesouros da mesquita serão novamente cobertos, ocultando um Patrimônio da Humanidade, como reconhecido pela Unesco. Santa Sofia tem resistido por mais de 2.700 anos. Esta decisão turca será somente mais um episódio de sua existência.