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RP pode definir horário e local de clube de tiro 

Por: Adalberto Luque 

Flávio Dino e Lula querem maior fiscalização nos clubes de tiro; estabelecimentos terão 18 meses para se adequarem às novas regras do decreto (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Desde a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 01 de janeiro de 2023, uma grande disputa vem sendo travada entre setores pró e antiarmamentistas. Não houve surpresa nenhuma quando o presidente passou a publicar medidas restringindo acesso às armas de fogo. Durante sua campanha rumo ao Planalto, Lula demonstrou claramente ser contra a política armamentista, setor que teve grande ampliação de acesso no governo anterior, de Jair Messias Bolsonaro. 

O novo decreto em vigor, assinado em 21 de julho, alterou uma série de quesitos para quem tem ou pretende ter uma arma de fogo no Brasil. O Decreto nº 11.615 é a nova regulamentação da Lei 10.826/2003, que trata sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas (Sinarm). 

Entre as principais mudanças estão a retomada da restrição para alguns tipos de calibre, um maior limite na aquisição de armas e munições, o tempo de validade do registro e a necessidade de autorização para o transporte de armas, repassando a fiscalização de armamento e munição ao Exército e à Polícia Federal. Em relação aos clubes de tiro, o Decreto estabelece a criação de regras para instalação e funcionamento de clubes de tiro, como a proibição de funcionar no raio de um quilômetro de escolas e com horário comercial limitado. 

Em uma de suas lives semanais, o “Conversa com o Presidente”, Lula foi enfático: “Eu, sinceramente, não acho que o empresário que tem um lugar de praticar tiro é empresário. Eu já disse para o Flávio Dino: ‘Nós temos que fechar quase todos (clubes de tiro) e só deixar aberto os que são da Polícia Militar, Exército ou Polícia Civil. É a organização policial que tem que ter lugar para treinar tiro. Não a sociedade brasileira”, disse. 

Lei Municipal 

Zucoloto: não é possível que o decreto discipline aquilo que está na esfera de competência do Município regulamentar (Foto: Alfredo Risk)

A Câmara Municipal de Ribeirão Preto aprovou e já encaminhou para o prefeito o Projeto Lei 163/2023, que dispõe sobre a autonomia das entidades e empresas que desenvolvem a prática e treinamento de tiro desportivo no município de Ribeirão Preto, de fixarem horário e local de funcionamento.  

Segundo o relator da proposta, vereador Renato Zucoloto, a medida do presidente foi tomada em meio à polarização. “A questão da disciplina de clubes de tiro tomou proporção na gestão do Governo anterior e daí toda a legislação que dela deriva, contaminada pela polarização da sociedade com o tema e, por isso, contaminada a premissa, contaminou-se também a conclusão”, redigiu no texto da Lei. 

De acordo com o vereador, há total legalidade e constitucionalidade na Lei Municipal que dá à Prefeitura a atribuição de definir local e horário de funcionamento dos clubes de tiro, como de todos os comércios em geral. Ele cita várias jurisprudências a respeito.  

E justifica: “Imagine-se o empresário que superou todas as dificuldades para empreender o abrir um negócio ao lado de um estabelecimento de ensino, fez latas somas de investimento, sem que houvesse qualquer restrição ou limitação na lei territorial e com a superveniência do decreto presidencial tem que fechar o seu comércio. Desta forma, entendo que não é possível que o decreto discipline aquilo que está na esfera de competência do Município regulamentar. O Legislativo Municipal aprovou em passado recente a Lei do Parcelamento Uso e Ocupação do Solo, Lei Complementar 3.1765/2023 e nela não fez constar nenhuma restrição quanto a localização de clubes de tiros, e também não impôs condições”, conclui. 

Mudanças 

Ruiz: decreto presidencial infringe a liberdade comercial de empreender (Foto: Arquivo Pessoal)

O decreto de Lula estabeleceu mudanças sensíveis para quem é Colecionador, Atirador desportivo ou Caçador (CAC). Uma delas é que a arma só pode ser levada no veículo no trajeto entre a casa do CAC até o clube de tiro e desmuniciada. Além disso, houve grande restrição no número de munições que podem ser adquiridas e restrição de calibres como armas automáticas, independente do calibre, por exemplo.  

Isso causou descontentamento para quem pratica o tiro esportivo. É o caso do professor universitário Evandro Ruiz. Ele vê um grande exagero nessa questão e torce para que haja uma regulamentação para que o setor volte a respirar. Além disso, explica que mesmo nos moldes do governo anterior, nunca foi fácil ter acesso a uma arma no Brasil.  

“Os colecionadores, atiradores desportivos e caçadores fazem a requisição diretamente ao Exército. Ambos passam por um escrutínio bem rigoroso, com laudo psicotécnico, exame teórico e prático sobre armamento, é uma seleção bem rígida. E mesmo depois que, na situação de CAC aprovado, é preciso fazer a requisição para adquirir um item controlado pelo Exército, que pode ser arma de fogo ou munição. Faz a requisição, espera o aceite, depois pode comprar arma que fica na loja. Depois pede-se o registro. Em seguida pede-se a guia para tirar a arma da loja e levar para sua casa, obviamente desmuniciada. E depois faz solicitação de trânsito para poder levar ao clube. Esse processo todo, demora pelo menos seis meses”, explica Ruiz. 

Em relação à limitação de munição, muitos CACs, segundo o professor, não estão treinando porque gasta-se, por prova, entre 300 e 400 munições, sem contar nos treinamentos. E a restrição limita a prática.  

Sobre os clubes de tiro, Ruiz conta que sua estrutura física é onerosa. “O funcionamento é caro. O Exército sempre vigia com rigor, não faz sentido limitar, por exemplo, um clube de tiro de uma escola. Há todo um dimensionamento que garante não fugir nenhum projétil, nenhuma arma, é tudo extremamente controlado. Não entra no clube quem não seja atirador. Não é possível entrar para experimentar, o chamado ‘tiro recreativo’. O clube que frequento tem reconhecimento facial. Ninguém ouve do lado de fora, tem barreira de som. Aliás, se na escola houver algum problema, as formas mais seguras seriam chamar a Polícia ou correr para o clube de tiro. Esse decreto infringe a liberdade comercial de empreender”, lamenta Ruiz, que completa: “A primeira medalha olímpica de ouro que o Brasil ganhou foi justamente no tiro esportivo”. 

 

Mentira digna de nota 

Para Minto, é mentira digna de nota tentar imputar no pensamento da sociedade que armas de criminosos provém dos CACs (Arquivo Pessoal)

O professor universitário André Minto, que é CAC desde 2018 considera absurda a ideia de que os CACs abastecem o mercado clandestino de armas. “A maior mentira – esse é o termo – digna de nota é tentar imputar na cabeça da sociedade que, as armas de criminosos provêm dos CACs, como se criminosos resolvessem, de uma hora para outra, comprar armas com 65% de imposto ou mais. Além do mais, armas legais que vão parar nas mãos de criminosos, não chegam a 1% do total”, analisa. 

Para ele, existem muitas armas legalizadas em circulação e o governo tem acesso a esse total. “O número exato é de conhecimento dos dois órgãos fiscalizadores: o SIGMA, vinculado ao Exército e o SINARM, vinculado à Polícia Federal. Quando se fala em segurança pública, querer controlar o número de proprietários legais, bem como, o número de armas nas mãos desses, criando novos impostos, é como tentar preencher uma garrafa com o funil ao contrário, ou construir uma casa iniciando pela pintura”, acrescenta Minto. 

Ele adverte que as medidas por decreto podem esvaziar um setor que geraria mais de 3 milhões de empregos formais, diretos e indiretos. Ele cita dois pontos fundamentais que envolvem o porte de arma. “O CAC é um cidadão que passou por um processo extenso para obter seu registro e se enquadrar nas categorias de atirador desportivo colecionador ou caçador. Esse processo envolve registro em clube de tiro credenciado, exame psicológico, exame teórico e exame prático com profissionais também credenciados. Só depois da obtenção do CR (Certificado de Registro), emitido pelo exército, ele terá direito à aquisição de uma arma. O tempo decorrido até a aquisição do armamento gira em torno de oito a 12 meses, em condições normais”, explica. 

Desta forma, o CAC só tem direito à posse da arma e ela teria que estar guardada em local seguro e só poderá sair com a arma para se dirigir a local de treino e competição. “Porte de arma só é permitido para civis em condições muito específicas estabelecidas pela lei, que fala em casos de ‘extrema e real necessidade comprovada’, e emitido pela Polícia Federal. Portanto, não existe porte de arma para CACs, e tampouco para o cidadão de bem e que anda dentro da lei”, diz. 

Com ações antiarmamentistas do governo federal, clubes de tiro esperam aprovação sanção do prefeito de Ribeirão Preto para mudar restrições (André Minto)

Para Minto, quando se fala em proteção do cidadão por meio de armas legais, há a ideia de que o cidadão vá partir para o ataque como num filme de velho oeste. “A criminalidade reduziu consideravelmente nos últimos quatro anos, em parte pelo caráter preventivo, em se saber que, em determinado lugar, pode ter alguém armado e que poderá reagir à injusta ameaça. Alguém já teve notícias nos últimos anos de que bandidos atacaram um clube de tiro? Uma base operacional policial? Um quartel? Um local de treinamento militar? Claro que não. Eles atacam escolas, creches, cinemas, shoppings, onde o caráter preventivo não se faz presente.” 

O projeto da Câmara Municipal de Ribeirão Preto foi encaminhado para o prefeito Antônio Duarte Nogueira Júnior. Em nota, Nogueira se manifestou: “O projeto será analisado pela Casa Civil.”. Zucoloto, por sua vez, disse que, em caso de veto, vai orientar aos vereadores sua derrubada. “Assim o projeto segue para o Supremo, que é quem tem o poder de julgar a questão”, finaliza. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

LEGENDAS DAS FOTOS:  

 

FOTO 01:  

Com ações antiarmamentistas do governo federal, clubes de tiro esperam aprovação sanção do prefeito de Ribeirão Preto para mudar restrições (Foto:  

 

FOTO 02:  

Flávio Dino e Lula querem maior fiscalização nos clubes de tiro; estabelecimentos terão 18 meses para se adequarem às novas regras do decreto (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil) 

 

FOTO 03: 

Zucoloto: não é possível que o decreto discipline aquilo que está na esfera de competência do Município regulamentar (Foto: Alfredo Risk) 

 

FOTO 04:  

Ruiz: decreto presidencial infringe a liberdade comercial de empreender (Foto: Arquivo Pessoal) 

 

FOTO 05: 

Para Minto, é mentira digna de nota tentar imputar no pensamento da sociedade que armas de criminosos provém dos CACs (Foto: Arquivo Pessoal) 

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