Mais de 200 casos de hanseníase foram notificados em Ribeirão Preto durante o ano de 2021. A alta expressiva de cerca de 215% em relação ao ano anterior coloca o município, de 720.116 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no primeiro lugar em número de casos no Estado.
Em 2017, foram 66 notificações de casos de hanseníase em Ribeirão Preto; em 2018, 73 casos novos; em 2019, mais 96 casos; em 2020, outros 93. A cidade comportou-se na contramão do restante do país e do mundo durante a pandemia do novo coronavírus. Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Hansenologia (SBH), Claudio Salgado, em 2019, os diagnósticos de hanseníase “despencaram” em todo o planeta.
O dermatologista e hansenologista Fred Bernardes Filho foi o responsável por cerca de 60% dos diagnósticos de hanseníase em Ribeirão Preto em 2021. No ano anterior, diagnosticou 37 casos (29 em Ribeirão Preto e oito de cidades vizinhas), e no ano passado foram 144 casos (120 em Ribeirão Preto e 24 de cidades vizinhas).
Em seu consultório, mantém uma detalhada planilha com cruzamento de informações de mais de 500 indivíduos, considerando pacientes e comunicantes, dados epidemiológicos e clínicos, resultados de exames complementares (sorologia, ultrassom de nervos, eletroneuromiografia), avaliações mensais, além da distribuição geográfica dos casos.
Ele avalia todas as pessoas que mantêm contato próximo com o doente, conforme protocolo da Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, menos de 50% dos comunicantes são avaliados, o que compromete a estratégia de controle.
No mundo
Em todo o mundo, 228 mil novos casos/ano, em média, foram diagnosticados entre 1989 e 1998 como consequência dos esforços em treinamento de profissionais de saúde. Mas em 2019 os números já tinham caído para cerca de 202 mil novos casos e, no ano passado, apenas 127 mil. “O pior momento dos últimos 20 anos para o controle da hanseníase”, segundo o presidente da SBH.
Anualmente, são notificados cerca de 30 mil novos casos no Brasil, que ocupa segundo lugar no ranking da doença, atrás da Índia. Mas o Brasil já alcançou o primeiro lugar em taxa de detecção (percentual de diagnósticos em relação ao número de habitantes). A SBH estima que o número real de doentes em território nacional seja três a cinco vezes maior que os dados oficiais – são doentes sem diagnóstico por falta de avaliação de contatos, campanhas educativas e capacitação de profissionais de saúde.
A SBH defende que é preciso empenhar esforços para aumentar os diagnósticos e quebrar a cadeia de transmissão do bacilo como fizeram os países que conseguiram o controle da hanseníase. A OMS entende que a hanseníase está sob controle quando o coeficiente de prevalência é de 1 caso para cada 10.000 habitantes. No Brasil, esse coeficiente foi de 1,5/10.000 em 2019, ano anterior ao do início da pandemia do coronavírus.
No Estado de São Paulo
Em Ribeirão Preto, os 210 casos confirmados no ano representam um coeficiente de prevalência maior que 3,0/10.000 habitantes e uma taxa de detecção de casos novos de 29,49/100.000 habitantes.
Outro dado que acende um alerta é o número de municípios paulistas sem diagnóstico da doença no ano passado: 423 cidades fecharam 2021 sem qualquer caso novo de hanseníase e seis são vizinhas a Ribeirão Preto (Cássia dos Coqueiros, Guariba, Guatapará, Pradópolis, Santa Cruz da Esperança e Santo Antônio da Alegria).
Hanseníase pode se manifestar com poucos sintomas ou casos assintomáticos, mas também tem as formas em que a doença está estampada em sinais evidentes pelo corpo. As formas dimorfa ou virchowiana muitas vezes são confundidas com alergia, acne tardia etc. Neste cenário, o presidente da SBH denuncia que quatro milhões de pessoas aguardam diagnóstico da hanseníase no mundo.
O Brasil tem ainda que vencer a problemática do diagnóstico de casos com poucos sintomas ou assintomáticos, a falta de estrutura e capacitação dos profissionais de saúde para identificar, classificar e definir aqueles que precisam de tratamento precoce, como abordar os comunicantes de pacientes de hanseníase, como solucionar os casos de pacientes que precisam de tratamento estendido ou outras drogas disponíveis, porém não reconhecidas pela OMS para uso em hanseníase, dentre outros desafios.