Um fato histórico envolvendo Ribeirão Preto e a Cruz Vermelha, entre 1939 e 1945, período da Segunda Guerra Mundial, foi descoberto por pesquisadoras da USP – Universidade de São Paulo. Nesse período, a entidade internacional formou socorristas para que trabalhassem em caso de necessidade.
A Segunda Guerra Mundial durou de 1939 a 1945 e envolveu a maioria das nações do mundo — incluindo todas as grandes potências. O conflito foi dividido em duas alianças militares opostas: os Aliados e o Eixo. Foi a guerra mais abrangente da história, com mais de 100 milhões de militares mobilizados. O Brasil passou a participar a partir de 1942.
A descoberta do fato aconteceu no dia 22 de outubro de 2012, pela professora Luciana Barizon Luchesi quando estava ministrando uma oficina sobre análise do texto jornalístico realizado no Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto. Quando foi analisar a lista de materiais disponíveis, a pesquisadora verificou uma pasta descrita como Cruz Vermelha e pediu para ver a mesma. Dentro da pasta havia ampla documentação sobre o Curso de Socorros Urgentes, da Cruz Vermelha Brasileira, filial de Ribeirão Preto, de 1942, configurando a primeira provável tentativa de formação de profissionais de enfermagem, no município de Ribeirão Preto. A documentação pertencia ao fundo denominado Legião Brasileira de Assistência. “Por isso pode-se dizer que a descoberta foi acidental, não era esse o propósito da visita ao acervo, mas o nome da pasta despertou curiosidade”, diz a pesquisadora.
A descoberta proporcionou um trabalho feito pela pesquisadora Adriana Saturnino Mazziero, que se debruçou em documentos do Arquivo Municipal de Ribeirão Preto, da Cruz Vermelha Filial São Paulo e da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, durante seu mestrado na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP, sob orientação da professora Luciana Barizon.
Segundo elas, as dificuldades encontradas no estudo foram “a grande extensa massa documental, e os diferentes acervos pesquisados”. Mas que permitiu confirmar a existência do Curso de Socorristas Urgentes da Cruz Vermelha de Ribeirão Preto (CSUCVB-RP), desafios e formandas.
Outra dificuldade que o estudo apontou foi sobre o Livro de Recortes de Jornais, onde algumas notícias sem adequada demarcação temporal, que dificultaram a análise, ou mesmo a inexistência do documento original do acervo de Ribeirão Preto. “Nesse sentido, essa lacuna não pode ser reduzida, pois, dos quatro jornais locais à época, apenas dois encontram-se disponíveis no arquivo histórico da cidade e com falhas temporais. Os demais jornais existem apenas no Livro de Recortes de Jornais, fonte que permite um olhar sobre notícias, que não mais existem em seus conteúdos originais”, explica.
As pesquisadoras dizem que o que mais chamou a atenção delas é que a iniciativa de Ribeirão Preto teve repercussão nacional, envolveu autoridades militares e civis de Ribeirão Preto. “Mas pouco tempo depois, passada a segunda guerra mundial todo o trabalho ficou esquecido e não se tinha conhecimento desses fatos, nem da existência de uma filial da Cruz em Ribeirão Preto”.
Material quase incinerado
Outro fato interessante apontado pelas pesquisadoras é que o estudo só foi possível, pela rebeldia de alguns funcionários da Legião Brasileira de Assistência de Ribeirão Preto, em 1994, que mesmo após notificação de obrigatoriedade de incineração para todo o material da instituição, pelo Governo brasileiro, após sua extinção, se recusaram a destruir essas fontes e fizeram a doação para o Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto em 1996.
Localização das socorristas
A tentativa de localização das socorristas não estava prevista na etapa de mestrado, mas existe a possiblidade de continuidade no doutorado. “Mas a média etária das alunas que concluíram o curso era de 26,8 anos, portanto, a maioria estaria com mais de 100 anos hoje”.
Empoderamento feminino
Segundo as pesquisadoras, apesar do fato ser em uma década, onde o poder masculino era dominante, não só pela figura masculina, mas também pelo próprio militarismo, a figura da mulher ganhou destaque registrado pela impressa, sua presença nos hospitais, nas casas de saúde, na guerra, mesmo que ainda a sua imagem seja associada como maternal, como em muitas ocasiões, pois os nomes não constavam em documentos oficiais.
“Entretanto, deve-se destacar que a palavra de ordem era patriotismo, nação, Brasil, tudo girando em torno da Segunda Guerra mundial e não do feminismo. O discurso no entorno da mulher era baseado em suas características maternas, o que não as impediu de acumular capital científico, que muitas delas podem ter aproveitado em suas vidas profissionais futuras”.