Faz algumas semanas que escrevi uma crônica sobre Raul de Barros, seu trombone e a música que compôs dentro de um taxi a caminho da Igreja da Glória, Centro Velho do Rio de Janeiro. A canção é um belíssimo samba, e em determinado momento os músicos que a estão executando cantam em coro “Na Glória”. Isso acontece várias vezes, o que a torna mais interessante –convido o amigo leitor de minhas escritas a ouvi-la.
Depois que meus filhos partiram, datas significativas pra mim e minha esposa tornaram-se terríveis, principalmente Natal e Ano-Novo, daí tomamos a decisão de não ficarmos por aqui e a melhor opção foi viajar para a praia. Pelo terceiro ano seguido, fomos para a Colônia de Férias dos Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar do Estado de São Paulo, em Caraguatatuba, da qual sou sócio. Fica no centro da cidade, onde tudo acontece, em frente tem um belo restaurante com música ao vivo e laterais abertas.
A colônia tem uma enorme varanda, faz frente pra uma rua que é como se fosse a pista porque é uma das que cruzam a cidade a caminho de Ubatuba. Em outras viagens que fizemos a “Caraguá”, as noites nas ruas e bares da vizinhança eram agitadas com a presença de cinco jovens músicos. Com um trombone de vara, um trompete, um saxofone um surdo e um tamborim – além de um parceiro que passava a sacolinha para coletar a grana – eles espalhavam alegria por onde passavam e não havia quem não colaborasse com uns trocados porque o grupo realmente fazia a diferença, já que são músicos de primeira qualidade e executando sucessos imortais.
Estávamos lá desde 22 de dezembro, antes do Natal, já era dia 27 e nada dos músicos. Minha primeira-dama até comentou: “Será que este ano eles não virão?” Ela mal havia terminado a pergunta quando ouvimos ao longe o som de um surdo e um trombone. O grupo não estava ao alcance de nossos olhos, mas a música ficava cada vez mais próxima até que os visualizamos.
Eram eles, os músicos esperados por nós, e eles tocavam um samba que logo identifiquei. Lá vinha eles cheios de gingados, e no restaurante que citei acima a sacolinha do cachê até encorpou, depois vieram tocar em nossa varanda, e pra minha alegria tocaram “Na Glória”, justamente o samba razão de minha crônica passada… até fiz o coro junto: “Na Glória, Na Glória”.
Na deliciosa varanda, estávamos na companhia de Donizete e Melissa, um casal maravilhoso de Bauru. Ele, assim como eu, policial rodoviário aposentado, cronista do Jornal da Cidade Bauru e ótimo contador de causos. Disse que, certa noite, estava com sua equipe pela rodovia quando foram solicitados para verificar algo estranho num restaurante com posto de gasolina.
Chegando lá, encontraram um casal em desespero que havia acabado de selar o matrimônio. O pai da noiva presenteou os recém-casados com uma Chevrolet Caravan branca “zero bala”, era o carro do ano, e o patriarca pediu aos dois que dessem uma carona pra sua esposa, mãe da noive, até a casa de um parente que ficava no caminho da lua de mel. Ao descerem do carro, a moça percebeu que sua mãe não se mexia no banco de trás, havia morrido.
Imaginem o desespero da filha…
O casal entrou posto adentro para telefonar aos pais, mas ao saírem do estabelecimento o desespero aumentou. A Caravan havia sido roubada com defunto e tudo dentro. Donizete, de imediato, comunicou toda a rede da Polícia Rodoviária o acontecido. Cerco daqui, cerco dali e nada da Caravan. Até hoje, nem o veículo, nem a falecida apareceram. Fico imaginando o susto dos ladrões.
Sempre que um novo recruta chega na região, os mais antigos contam esta história e, para amedrontá-los ainda mais, dizem que em noites de lua cheia a Caravan branca passa buzinando pelas estradas da região. A recrutada arrepia…
Sexta conto mais.