Diretor estadual do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), Fábio Henrique Granados Sardinha, afirma que o retorno obrigatório de 100% dos alunos da Rede Estadual às salas de aulas é algo irresponsável. A obrigatoriedade foi estabelecida pelo Governo do Estado de São Paulo na semana passada e começou a valer no dia 18 de outubro.
Sardinha, que é professor de História e Sociologia e Projeto de Vida em uma escola da Rede Estadual, na zona Norte de Ribeirão Preto, diz que para pagar as contas os professores são obrigados a lecionarem nas redes estadual, municipal e privada, de manhã, tarde e noite. “Essa sobrecarga faz o profissional adoecer e perder sua qualidade de vida comprometendo o seu futuro como pessoa e como profissional”, garante.
Tribuna Ribeirão – Qual a avaliação sobre o retorno presencial obrigatório de todos os estudantes da Rede Estadual?
Fábio Sardinha – Prematuro e irresponsável, pois estamos no 4° bimestre. Obrigar alunos ao retorno presencial – mesmo os que não tomaram todas as doses – e sem um calendário de vacinação, sem distanciamento, é algo que não existe na literatura médica. Este é o caso dos estudantes do estado de São Paulo que não completaram o ciclo vacinal e estão tendo que voltar às salas de aula.
Tribuna Ribeirão – As escolas de Ribeirão têm condições adequadas para receber todos os alunos?
Fábio Sardinha – Infelizmente não. Dados da própria Secretaria Estadual de Educação de São Paulo apontam que das 5.130 escolas estaduais, apenas 1.251 estão aptas a receber 100% dos alunos sem revezamento. O total representa apenas 24% das unidades de ensino e as escolas estaduais, em sua maioria, não tem laudo do Corpo de Bombeiros e o quadro de funcionários de limpeza é insuficiente. Nas escolas estaduais Dom Alberto Gonçalves e Francisco Bonfim, por exemplo, o contrato de licitação para limpeza é confuso e quem define a quantidade de funcionários é a empresa terceirizada e não a unidade escolar. É um contrato que amarra os diretores e a gestão colocando em riscos a saúde sanitária e limpeza adequada das unidades escolares.
Tribuna Ribeirão – Em relação às medidas preventivas, neste retorno, qual é a sua avaliação?
Fábio Sardinha – O retorno é prematuro e irresponsável, pois, prevê o fim do distanciamento para alunos não vacinados de forma completa. Com isso você coloca toda comunidade escolar, como os pais, alunos, professores e outros profissionais da escola, em risco. Muitos pais não têm segurança para mandar os filhos para escola, na atual conjuntura.
Tribuna Ribeirão – O que a Apeoesp tem feito para garantir a segurança dos alunos e dos profissionais do setor?
Fábio Sardinha – A Apeoesp apresentou um estudo chamado “Escolas Seguras”, que foi feito em parceria com o Dieese e o Instituto dos arquitetos do Brasil. É um documento orientador para o Estado sobre como deveria ser a estrutura da sala de aula e também dos prédios das escolas dentro desse novo contexto. É um estudo técnico orientador para as mudanças estruturais a serem realizadas por engenheiros e arquitetos do Instituto. Desde março do ano passado a Apeoesp, através de nossa presidenta e deputada estadual, professora Bebel, realiza cobranças e envia requerimentos ao governo do estado para garantir a vacinação de todos profissionais e alunos de forma urgente. Aqui em Ribeirão Preto e em todas 94 subsedes realizamos uma campanha de doação de cestas básicas aos professores e comunidades carentes. Campanha que continua até hoje. Agora, estamos lutando pela aplicação da terceira dose nos educadores e o fim da obrigatoriedade do retorno sem a vacinação de todos os estudantes.
Tribuna Ribeirão – O Governo de São Paulo anunciou esta semana o pagamento de um abono para os profissionais do magistério estadual. Abono é a solução para a categoria?
Fábio Sardinha – [O governador] João Doria anunciou um abono aos servidores do magistério que não é uma valorização real e que não será dada por mérito do governo estadual, já que serão utilizadas as verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (Fundeb). Ou seja, ele é obrigado a utilizar essa verba. Estamos sem reajuste há mais de três anos, com uma defasagem salarial de mais de 29% e a farsa da bonificação deixou de fora os aposentados, os servidores do quadro de apoio escolar que são os mais prejudicados e marginalizados e possuem o menor salário na educação.
Tribuna Ribeirão – Qual foi o último reajuste dos professores? Qual a média salarial da categoria?
Fábio Sardinha – O último reajuste da categoria foi em 2018. Uma de nossas reivindicações é o reajuste dos salários, que estão abaixo do piso nacional. Os professores que trabalham 40 horas recebem R$ 2.886,24 e infelizmente, esse ano, fomos vítimas de um calote do Governo Federal que anulou o reajuste do piso salarial profissional nacional do magistério, inicialmente previsto para ser reajustado em 5,89%.
Tribuna Ribeirão – Em sua avaliação quais são os grandes desafios do ensino público estadual?
Fábio Sardinha – Investimento é algo primordial. Precisamos reduzir o número de alunos por sala para no máximo 25, equipar as escolas com alterações na estrutura física e equipamentos e valorizar seus profissionais com reajuste salarial, Os salários da categoria estão totalmente defasados. Não é possível que o estado mais rico da Federação pague um salário-base abaixo do piso nacional. É necessário um reajuste de 29,25% para essa equiparação. São Paulo, no quesito valorização dos professores, está na 8ª e 10ª posição em um ranking nacional, atrás de estados como Amapá, Acre, Piauí, Rio de Janeiro e Distrito Federal. Os números são do grupo de Pesquisa do Observatório da Remuneração Docente (PORD), da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Hoje para conseguir pagar as contas os professores são obrigados a lecionarem nas redes estadual, municipal e privada, de manhã, tarde e noite. Essa sobrecarga faz o profissional adoecer e perder sua qualidade de vida, comprometendo o seu futuro como pessoa e como profissional.
Tribuna Ribeirão – Na escola em que você leciona o ensino remoto funcionou adequadamente?
Fábio Sardinha – Leciono em uma unidade escolar que fica na periferia da cidade, no bairro Quintino Facci II. A realidade da minha escola é a realidade da pesquisa realizada em 30 julho de 2021 que demostrou que cerca de 90% dos alunos do ensino médio da Rede Pública de São Paulo não recebeu equipamentos tecnológicos para acompanharem o ensino remoto.
Ainda de acordo com o levantamento, cerca de 15% dos alunos das escolas paulistas deixou a escola durante a pandemia. A falta de acesso à internet e a equipamentos tecnológicos adequados estão entre as principais causas da evasão escolar no estado. Na unidade escolar que leciono – com mais de mil alunos – temos apenas 13 computadores, por exemplo. Outro ponto observado é que muitos alunos precisaram deixar de frequentar as aulas para ajudarem os pais a complementarem a renda da casa.
De acordo com a pesquisa, 44% das famílias dos alunos da Rede possuem renda mensal de até 2 salários mínimos. Dos três grupos entrevistados, todos acreditam que as escolas não oferecem a estrutura adequada para o ensino remoto. A falta de equipamentos adequados para o aprendizado a distância é uma das principais razões apontadas pelo levantamento para o aumento da evasão escolar.
Entre os professores, 50,5% disseram que as escolas não possuem estrutura adequada para o ensino a distância. Cerca de 70% dos pais também acreditam que não há oferta de estrutura e entre os alunos, esse percentual foi de 61,5%.