Tribuna Ribeirão
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Quanto custa o poder 

Luiz Paulo Tupynambá * 
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► Sionismo: não aceitação da política de dois estados, um israelense e outro palestino. 
 
O advento dos Estados-Nação, entre o final do século XVIII e o início do século XIX, trouxe a concepção de que um povo que habita um determinado território com afinidades culturais predominantes entre seus membros, possui o direito inalienável de posse desse território e cabe a esse povo organizar-se juridicamente para administrá-lo e militarmente para defendê-lo. O Estado-Nação libertou povos e permitiu que se autogovernassem e determinassem seu futuro. 
 
Os judeus sempre reivindicaram a posse de uma determinada região no Oriente Médio, alegando que era “Eretz Yisrael” (Terra Prometida, em hebraico), a região prometida por Deus aos descendentes de Abraão, através de seu filho Isaac e aos descendentes de seu neto Jacó. Segundo a tradição hebraica é uma promessa válida para todos os judeus, inclusive os descendentes dos convertidos. Essa terra, embora haja várias interpretações, englobaria, além do território atual, as duas margens do Rio Jordão, ao norte chegaria até a Síria e ao sul ocuparia a atual Gaza e a Península do Sinai, devolvida ao Egito pelos acordos de Oslo de 1978, depois da ocupação por Israel na Guerra dos Seis Dias (1967). 
 
Benjamin Netanyahu, atual primeiro-ministro de Israel, é do Partido Likud (Consolidação), que surgiu da união de partidos sionistas de direita e centro-direita. A fundação do Likud aconteceu em 1973, liderada pelo antigo partido Herut que representava os sionistas revisionistas. Um dos objetivos declarados do Herut era a conquista, e incorporação ao estado de Israel, dos territórios que completariam a Terra Prometida. 
 
A política israelense é uma das mais complicadas do mundo. Para se ter uma ideia, o partido de Netanyahu, a maioria, tem apenas 36 cadeiras em um parlamento com 120 assentos. O restante está dividido entre outros 12 partidos, num espectro político que vai da direita radical até a esquerda, passando pelo sionismo, liberalismo, ultradoxia religiosa, trabalhismo, populismo sionista e até um partido de representação árabe. O Partido Azul e Branco, liberal e adepto à solução de dois estados, é o segundo, com apenas 17 membros. Para se equilibrar como primeiro-ministro, Netanyahu aliou-se aos partidos sionistas mais radicais, que demandam uma política agressiva de ocupação de territórios e a construção de colonias e “kibutzim” nos territórios palestinos ocupados por Israel. 
 
Quando se fala dos palestinos, é bom lembrar que a Cisjordânia, onde está Jerusalém, é reivindicada como território de Israel pelos partidos sionistas desde antes da criação do estado de Israel, em 1949. Gaza e a Península do Sinai ainda são fortemente reivindicadas dentro do cenário político de Israel, mesmo após os Acordos de Oslo, que selaram a paz com os egípcios. E quando se fala em controle da Cisjordânia, a maioria das pessoas não sabe que a Autoridade Palestina con
trola apenas vinte por cento desse território. Quarenta por cento do território já foi colonizado por radicais judeus e são controlados por milícias fortemente armadas que não permitem a presença árabe na região. Os quarenta por cento restantes estão sob o controle direto de Israel. Palestinos que querem circular por lá, mesmo que seja a caminho do trabalho ou em busca de atendimento hospitalar, tem que passar por vários pontos de controle.
 
 
O atual primeiro-ministro de Israel já escapou de procedimentos parlamentares para derrubá-lo, driblou condenações por mau uso de dinheiro público e ultimamente vinha enfrentando as maiores manifestações de rua já vistas no país, com seu projeto de consolidação de poder, diminuindo o papel dos tribunais superiores. Ao mesmo tempo, ampliou o apoio de seu governo para a expansão das colônias na Cisjordânia. Foi surpreendido justamente naquilo em que mais se apoiava para garantir a simpatia popular: a segurança da população contra ataques terroristas. O sistema de segurança da fronteira sul, extremamente vigiada e controlada com o uso dos recursos mais modernos de vigilância falhou miseravelmente em 7 de outubro. E isso já está sendo cobrado dele e provavelmente vai significar o fim de sua carreira política. 
 
Mas, a reação de Israel ao ataque terrorista do Hamas passou das medidas. Deixou de ser uma legítima reação de autodefesa e se tornou uma incursão vingativa e desmedida. Um governo desesperado para se equilibrar no poder que lança um ataque selvagem contra uma população desarmada e indefesa não tem como se justificar agora e nem no futuro. 
 
As forças armadas israelenses dizem que as atrocidades são danos colaterais provocados pelas características de uma guerra assimétrica. Assimétrico é o sacrifício de mais de cem funcionários da ONU. Assimétrico é o desdém pela situação e morte dos prematuros nos hospitais sem eletricidade devido à proibição de entrega de combustível. 
 
Assim como vai ser assimétrico o futuro da região. Quem bancará a reconstrução do que foi destruído, quem pagará pelo auxílio que famílias sem lar e civis mutilados vão precisar para viverem uma vida miserável a que foram condenados por uma política de exclusão e extermínio praticadas por um governo usado apenas para que políticos como Netanyahu se mantenham o poder? Quanto vai custar essa sede de poder? 
 
* Jornalista e fotógrafo de rua 

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