Após um debate que durou quase uma hora e meia, a Câmara de Vereadores aprovou, na noite desta terça-feira, 26 de setembro, projeto de lei de Gláucia Berenice (PSDB) que, na prática, proíbe a disciplina educação sexual nas escolas de Ribeirão Preto. Com viés inconstitucional, passando por cima da Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB), da Constituição Federal e do Plano Nacional de Educação (PNE), a proposta foi aprovada por 22 votos a favor e três contra.
De nada adiantou Jorge Parada (PT) passar mais de dez minutos na tribuna explicando a seus pares que o projeto é “violento, contra a democracia e inconstitucional”, que a iniciativa “tolhe o trabalho dos professores”, é um “entrave para a educação” e é “radical, quase fundamentalista”. Também não pesaram as presenças de representantes do movimento LGBT, como Fábio de Jesus, presidente da ONG Arco-Íris, ou de Fábio Sardinha, diretor estadual do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp).
Depois que Gláucia Berenice discursou defendendo o projeto e afirmando que ele apenas vai contra a “erotização da infância”, nada menos que sete vereadores foram à tribuna e fizeram discursos em “defesa da família”. Ribeirão Preto tem, hoje, 70 escolas e cerca de 48,8 mil alunos da rede estadual. Na região, que abrange mais 13 municípios, são cerca de 60 mil estudantes em 102 unidades, mas na macrorregião são 97,3 mil. A rede municipal tem 109 unidades e cerca de 47,4 mil estudantes.
Ariovaldo de Souza (PTB), o “Dadinho”, Maurício Gasparini (PSDB), Igor Oliveira (PMDB), Otoniel Lima (PRB), João Batista (PP) e Lincoln Fernandes (PDT) defenderam o projeto, uma proposta com características criacionistas – gente que só aceita a versão cristã da criação da humanidade e descarta a científica. Fernandes levou até um livro didático para provar que a educação sexual seria prejudicial – na região genital do menino um orifício permite a colocação do dedo para simular um pênis.
Para as pessoas que acompanharam a sessão, além de exacerbar a atribuição do Legislativo ao dar aos pais o direito de exigir que os filhos sejam educados em determinada crença religiosa, o projeto ainda tem caráter claramente homofóbico. O texto estabelece que “servidores públicos municipais (como os professores) podem cooperar na formação moral das crianças e adolescentes, desde que, previamente, apresentem às famílias o material pedagógico, cartilha ou folder que pretendem apresentar ou ministrar em aula ou atividade”.
Ou seja, se um professor quiser abordar uma questão ligada à sexualidade, antes terá de consultar cada pai e cada mãe para obter autorização. Quando, na tribuna, Gláucia Berenice disse discordar que meninas de 12 anos aprendam na escola temas ligados à sexualidade, uma integrante do movimento LGBT desabafou: “Não teríamos tantas garotas grávidas aos doze anos se elas tivessem tido educação sexual aos onze anos”.
O projeto, além de aparentemente homofóbico, ainda traz um artigo cuja prática tem potencial para desmentir a ciência. O artigo 2º tem o seguinte parágrafo: “Os pais ou responsáveis têm o direito a que seus filhos menores recebam a educação moral e religiosa que esteja de acordo com suas convicções”.
Ou seja, se o pai de aluno é um fundamentalista de direita, um criacionista, que considera a “Teoria da Evolução” de Charles Darwin uma balela, ele passa a poder exigir que os professores eduquem seu filho de acordo com suas crenças – por mais estapafúrdias e polêmicas que sejam. Na prática, um pai ou mãe ganha o direito de exigir que sua crença religiosa, por mais extravagante, seja aquela na qual seu filho será ensinado.
Votaram contra o projeto Jorge Parada (PT), Luciano Mega (PDT) e Adauto Marmita (PR). A Coordenadoria de Comunicação Social da Prefeitura de Ribeirão Preto informou que vai aguardar a publicação do texto para analisar sua constitucionalidade e até a viabilidade técnica da proposta. No entanto, tanto a Secretaria Municipal da Educação, quanto a de Estado devem entrar com ações diretas de inconstitucionalidade (Adin) contra a decisão.