Rui Flávio Chúfalo Guião *
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“Procuro pessoa madura, séria e responsável para, junto comigo, toda campainhas e sair correndo.”
De uma prima muito querida, recebi, via internet, o aviso acima. Achei genial a ideia, pois ela evoca a criança que ainda mora dentro de cada um de nós, independente da idade cronológica que tenhamos. Não me candidatei ao posto, pois na minha idade não teria sucesso nas correrias. Mas, pensei bastante na mensagem.
A descoberta e o conhecimento do mundo são a fase mais fértil de cada um de nós. Ela nos prepara para entender a vida e abre a possibilidade de vislumbrar o que gostaríamos de ser. É na vivência lúdica que se forma nossa personalidade.
Passam-se os anos e vamos nos esquecemos da criança que fomos, para nos tornarmos senhores respeitosos, formais, avessos a brincadeiras. Mas, os que sabem realmente viver são aqueles que não permitem que a criança que fomos desapareça para sempre.
A melhor idade é aquela que temos. Se nós acreditarmos nisto, não ficarmos saudosos ou queixando das limitações naturais da vida, seremos felizes e nos permitiremos um viver mais leve, convivendo com o menino que fomos.
Mas, como manter viva a criança que habita dentro de nós?
Por certo, não será preciso deitar de novo na grama, observando as nuvens e percebendo as fantásticas e mutantes esculturas que elas formam, identificando animais, pessoas, países, monstros criados por nossa imaginação, uma infinita coleção criativa.Bastam momentos de observação da natureza que nos cerca e a qual vemos, mas nem sempre enxergamos. Por que não quedar quieto, seguindo o pequeno casal de pássaros que faz ninho numa das nossas árvores ou na planta do vaso, na sacada do apartamento? Por que não pegar a cigarra agarrada na árvore e mostrar aos netos, da mesma maneira que fazíamos na infância? Há quanto tempo não vemos os vagalumes que preenchiam nossas noites e que caçávamos para colocar num vidro, a fim de eles brilharem na noite de nossos quartos?
Por que não voltar a velhos hábitos, como tocar um instrumento, fazer uma pintura, renovar nossa coleção de selos? Ou aprender uma língua nova, frequentar uma academia, levantar da cadeira e caminhar todos os dias?
Por que não romper nossa insegurança e enfrentar nosso computador pessoal, pedindo aos netos que nos auxiliem e abrindo assim um enorme caminho para o contato à distância?
A criança que está dentro de nós procura sempre ser e não parecer. Não precisamos mais investir num personagem, vestir roupas caras. Precisamos ser o que já somos e nada mais. Estamos sorrindo de nós mesmos ? De nossas limitações ou estamos encarando as mesmas como fardo penoso a ser carregado?
A maturidade é importante para olharmos dentro de nós e saber analisar o que somos e o que queríamos ter sido. Temos, todos, os nossos sucessos e os nossos desapontamentos, mas o que importa é nossa tentativa de acertar sempre. E saber quantificar nossas limitações. Felizmente, não somos super-heróis, mas humanos falhos, que estão em constante busca de alguma coisa. E temos a esperança, que nos move a continuar.
Despertar a criança que existe dentro de nós não é sair praticando atos de irresponsabilidade, mas dar a uma vida mais leve e despreocupada.
Vamos achar uma campainha para tocar e sair correndo?
* Chairman da Santa Emília Automóveis e membro da Academia Ribeirãopretana de Letras