Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou que as conversações com o Ministério da Saúde sobre a compra da Coronavac “não prosseguiram” em razão da manifestação pública do presidente Jair Bolsonaro de que o imunizante não seria incorporado ao Plano Nacional de Imunização (PNI).
O relato contraria o depoimento de Eduardo Pazuello. O ex-ministro da Saúde disse à CPI que a declaração de Bolsonaro não influenciou as negociações com o Butantan. “Aí no outro dia de manhã (após anúncio do Ministério sobre Coronavac), infelizmente conversações não prosseguiram porque houve manifestação do presidente Jair Bolsonaro dizendo que vacina não seria incorporada”, afirmou o diretor nesta quinta-feira, 27 de maio.
Covas lembra que o Instituto Butantan tem um único cliente, o Ministério da Saúde. Ele ressalta que, até outubro de 2020, as conversas entre governo e o instituto estavam correndo bem, inclusive com o convite de Pazuello para o diretor participar, no dia 20 daquele mês, de anúncio sobre a aquisição da vacina.
“E tudo aparentemente estava indo muito bem, tanto é que no dia 20 de outubro fui convidado por Pazuello para cerimônia no ministério onde vacina seria anunciada, e anunciou naquele momento na presença de governadores e parlamentares”, disse o diretor. Covas citou três ofícios enviados ao governo federal no ano passado.
Um em julho, no qual se ofertou 60 milhões de doses que poderiam ser entregues no último trimestre de 2020, sem resposta efetiva do governo. Por isso, em agosto, a proposta foi reforçada, acompanhada ainda de um pedido de apoio financeiro ao estudo clínico do imunizante. “Todas essas iniciativas não tiveram resposta positiva”, afirma.
Já em outubro, o Butantan conseguiu uma sinalização “muito positiva”, de acordo com o diretor do instituto, de que a vacina poderia ser incorporada ao PNI. Então, no dia 7 de outubro, um novo ofício foi enviado, com a oferta de 100 milhões de doses. “Sendo que dessas 45 milhões seriam produzidas no Butantan até dezembro de 2020, 15 milhões no final de fevereiro e 40 milhões adicionais até maio desse ano”, relata.
Dimas Covas afirma que enxerga a necessidade de uma dose de reforço para todas as vacinas contra a covid-19, principalmente em razão das variantes da doença que circulam atualmente. “Uma dose adicional já com as variantes já está sendo pesquisada inclusive pelo Butantan, que já incorpora variante P.1 nos estudos, inclusive com a Butanvac”, relatou o diretor do instituto.
Covas ainda explicou que o prazo de 28 dias para que o cidadão receba a segunda dose da Coronavac é o “ideal” para completar o esquema vacinal. Ele explicou, no entanto, que se a segunda dose for tomada posteriormente, não há prejuízo, só uma demora a mais para a pessoa ser completamente protegida.
Dimas Covas também admitiu a possibilidade de que a vacina contra covid-19 precise ser aplicada em doses anuais. Segundo ele, “tudo indica” que haverá necessidade do reforço periódico da vacinação. Na sessão, o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), apresentou vídeos envolvendo o caso, tanto das manifestações de Bolsonaro como do então secretário-executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco.
Após a fala do presidente, ele declarou que não havia intenção de comprar vacina chinesa, uma referência à Coronavac. Na CPI, o diretor do Instituto Butantan disse estar “decepcionado” com o tratamento que a instituição teve por parte do governo federal. “Questionar o Butantan significa questionar a saúde pública”, afirmou Dimas Covas.
Covas avalia que “tudo indica” que o país possa ter um recrudescimento da pandemia. Segundo ele, o aumento no número de casos será “turbinado” por variantes da covid-19. A análise veio após o vice-presidente do colegiado, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), perguntar se ele concordava com uma fala do presidente da República de que o Brasil estava “no final da pandemia”. O diretor discordou. Para ele, o país ainda estará lutando contra a pandemia nos próximos anos.