Fabiano Ribeiro
Nos últimos anos, por conta da seca, áreas verdes urbanas e rurais têm sido devastadas por incêndios, alguns acidentais; outros por ações criminosas. Com isso, o que era verde e arborizado se tornou cinzas, comprometendo fauna e flora. Um exemplo disso é uma grande área verde localizada no Jardim Nova Aliança, zona Sul. A situação incomodou moradores que pediram, na Secretaria de Meio Ambiente, para fazer o reflorestamento, mas o rigor de exigências da pasta está inviabilizando a ação.
A área verde, que era uma mata com vegetação nativa, está localizada entre o Anel Viário Sul e o Jardim João Rossi e foi vítima de incêndios nos últimos dois anos. O último deles em julho passado. Moradores do Condomínio Nova Aliança se sensibilizaram, fizeram uma ação e contrataram uma engenheira ambiental que elaborou um Projeto de Recuperação Ambiental, protocolado ano passado na Secretaria de Meio Ambiente.
“Há um ano, quando demos início ao projeto, já não existia basicamente nenhuma vegetação ou fauna nativa ali. Quase toda a área estava coberta por um capim colonião com mais de dois metros de altura. Após o último incêndio em julho deste ano, o capim foi consumido pelo fogo e a área ficou apenas coberta por cinzas”, relata moradora Mariana de Moraes Olivio, que assina o pedido.
Ela informa que a área está comprometida e completamente desprotegida. “Sem um reflorestamento adequado e a manutenção da proteção da região, a cada ano, novos incêndios vão destruir o mínimo de vegetação que ainda resta por ali. Hoje ainda conseguimos contornar a situação, mas talvez no futuro seja impossível retornar a vida ao local”, acrescenta.
“O Poder Público ainda tem colocado empecilhos impossíveis de serem atendidos. O projeto está sendo realizado de forma voluntária pelos moradores para o benefício de todos, mas na verdade deveria ser de responsabilidade da Prefeitura. “Não havendo a manutenção correta, a tendência é que todos os anos os incêndios destruam o que resta da área”, completa a engenheira ambiental Mariana Kato, contratada pelos moradores para elaborar o projeto.
Kato destaca a falta de manutenção na área. “Como é uma área institucional, os moradores não podem realizar a manutenção por conta própria, sendo necessário o apoio da Coordenadoria de Limpeza Urbana e esse apoio não foi dado. Após muita insistência e após um novo incêndio ter atingido a área, foi realizada uma roçada, porém, de forma muito insatisfatória”.
Exigências inviabilizaram o projeto
Após um longo período de tramitação na Prefeitura, a Secretaria de Meio Ambiente encaminhou uma resposta aos moradores no início do mês, com exigências (ver nesta página) que desmotivaram o grupo e inviabilizaram a proposta.
“É no mínimo absurdo. Estamos unindo forças entre os moradores da região para trazer vida de volta para a área, mas só encontramos obstáculos por parte do Poder Público. Nosso objetivo é plantar árvores da maneira mais correta possível – e ainda nos comprometemos a acompanhar a área para que as árvores realmente vinguem. Mas o que nos está sendo exigido é um projeto de urbanização, e não de reflorestamento”, diz Mariana Olivio.
A moradora ainda comentou a demora no processo. “Como a área é institucional, ela teve que passar por diversas secretarias para análise, em caso de algum plano futuro para a área. Isso nós entendemos perfeitamente que faz parte do processo. O problema é que depois que o projeto tramitou por todas as secretarias, ele ficou meses parado no Meio Ambiente. Desde janeiro eles já haviam recebido o parecer positivo das secretarias e não deram sequência ao projeto. A área foi sequer visitada até dois meses atrás, depois de muita insistência nossa, sendo que o projeto está nas mãos deles desde novembro passado”, finalizou.
Uma iniciativa tolhida pela burocracia
No último dia 21, Dia da Árvore, o jornalista Eduardo Ferrari, morador do Nova Aliança, gravou um vídeo mostrando a sua indignação quanto às exigências do Poder Público em relação à tentativa de reflorestamento por parte dos moradores. O vídeo, intitulado “Uma boa iniciativa tolhida pela burocracia”, viralizou.
Ferrari faz críticas à resposta da Secretaria de Meio Ambiente alertando que ela não esclarece as compensações ambientais. “Compensar a compensação?”, indaga.
“Dizem que não houve preocupação com a fauna. Não sobrou nada no lugar”, completa, ressaltando que na área há apenas restos de árvores queimadas e algumas plantas que resistiram aos incêndios, mostrando em seguida um vídeo comprovando sua fala.
“Pedem pra informar as diretrizes de interação com a comunidade… Seria um ar mais respirável depois?”, ironiza. “Pedem um plano de retirada de lixo e entulho. Até parece que se a gente não fizer nada, a Prefeitura vai fazer amanhã”, ressalta.
“Pedem o controle de pragas. Hoje está abandonado, mas se plantarmos árvores, vamos ter que catalogar as cigarras e lagartas? Pedem a substituição das árvores exóticas invasoras. Ou seja, se a gente não fizer nada fica tudo igual, mas se fizermos, teremos que fazer todo o manejo sobre o que a natureza construiu até hoje. Por fim, claro, avisam que a área é pública e que o Poder Público pode a qualquer momento modificar, edificar ou consignar a área a quem bem o poder público desejar, ou seja, pessoal, um recado claro. Melhor deixar como está, pra ver como fica. Triste!”, finaliza.
Calçada está entre as exigências impostas
O cumprimento de uma lista com 13 itens foi exigido pela Secretaria de Meio Ambiente para a execução do projeto de recuperação ambiental.
Em um deles a Secretaria exige a separação do projeto em cinco subáreas. “Deverá conter mapeamento de cada área, processo de identificação e erradicação de espécies invasoras, indicação de espécies para plantio, tratos culturais (retirada de lixo e entulho, controle de plantas daninhas, controle de pragas como formigas, abertura de covas, correção de acidez e adubação do solo com adubo orgânico, períodos de irrigação ou utilização de gel de plantio de uso agrícola, adubação de cobertura e substituição de mudas mortas)”.
Em outro a construção de calçada pavimentada paralela à Rua da Pedreira com, no mínimo, 2 metros de largura e com acessibilidade conforme NBR 9050/2020; Planta com desenho das subáreas, calçadas e indicação de caminho ou pista de caminhada interna da área.
A resposta da Secretaria do Meio Ambiente
A reportagem do Tribuna pediu à secretária de Meio Ambiente, Catherine D’Andrea, por meio da Coordenadoria de Comunicação Social da Prefeitura de Ribeirão Preto, uma explicação sobre as exigências para o reflorestamento que, segundo os moradores, inviabiliza o plantio de árvores.
Em nota, a resposta foi que “o parecer emitido teve como base a necessidade de complementação e correções do material anexado pelo interessado”, sem entrar em detalhes.
O Tribuna perguntou ainda se, com os moradores não realizando o reflorestamento, a Prefeitura irá realizar? Se sim, quando?
“Esclarecemos que a área em questão é de uso institucional sendo destinada a implantação de equipamentos públicos comunitários. Assim, por se tratar de área institucional, do ponto de vista das ações do poder público, não há previsão para execução de plantios na área. Porém, a partir da solicitação do interessado, foi construído a nível processual, a possibilidade de realização do plantio pela sociedade”, responde em nota.
Questionada sobre ações de reflorestamento realizadas neste ano pela Prefeitura, onde e quando. A resposta foi que “as ações de reflorestamento, recomposição da cobertura vegetal, recuperação de áreas verdes públicas e incentivo a plantios de acompanhamento viário no município se dão, eminentemente, por meio de processos de compensação ambiental. Durante este ano a Secretaria já firmou 136 Termos de Compromissos direcionados a estas ações em diversos pontos da cidade. Dentre as ações realizadas, foram feitos plantios nos bairros Jardim Florestan Fernandes e Ribeirão Verde”.
Entrevista
Na quarta-feira, dia 22 de setembro, a secretária do Meio Ambiente, participou de uma entrevista no programa Thathi Repórter, do Sistema Thathi. Ela concordou que a iniciativa de reflorestamento da área deveria partir do poder público. “É correto, a Prefeitura que deveria fazer”, disse, e elogiou a atitude da população do bairro.
D’Andrea comentou alguns itens do parecer emitido pela Secretaria de Meio Ambiente, como compensação e construção de calçadas. Ela disse que a exigência de compensação ambiental era uma questão de interpretação e concordou que o que seria feito pelos moradores “já era uma compensação”. “[O termo] compensação está incorreto no parecer… uma palavra que acabou saindo de maneira inadequada”. “Eu concordo com a colocação que pedir calçamento, talvez não fosse adequado, mas foi um parecer técnico”.
Sobre o fato da demora no processo, a secretária informou que além da sua pasta, o requerimento teve que passar por outras secretarias pelo fato da área devastada pelo fogo ser parte Área Verde Pública e parte Área Institucional, destinada a construção de equipamentos públicos.
A secretária disse ainda que os requerentes, no caso os moradores do Condomínio Nova Aliança, podem pedir uma contra argumentação das exigências. “Já pedi para a diretoria convocar os requerentes. Encontrar solução, fazer um alinhamento e encontrar um equilíbrio do que é possível e o que é permitido pela legislação. Estamos abertos a uma discussão”, afirmou D’Andrea.