O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) afirmou na tarde desta quarta-feira, 30 de outubro, que quem autorizou a entrada de Élcio Vieira de Queiroz no condomínio em que moram Ronnie Lessa e o presidente Jair Bolsonaro (PSL) foi o próprio Lessa, acusado de matar a vereadora Marielle Franco (PSOL) e o motorista dela, Anderson Gomes, em março de 2018. Élcio é quem teria dirigido o carro durante o ato do crime.
As promotoras do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) explicaram que, apesar de o porteiro do prédio ter dito, em depoimento no início deste mês, que a autorização para Queiroz entrar no condomínio no dia do crime teria sido dada por alguém da casa de Bolsonaro, planilhas e áudios comprovam que foi o próprio Lessa. “(O porteiro) mentiu. Pode ser por vários motivos. E esses motivos serão apurados. O fato é que as ligações comprovam que quem autorizou foi Ronnie Lessa”, afirmou Simone Sibilio, coordenadora do Gaeco.
Apesar de a declaração do porteiro conter, em tese, alegações falsas, o depoimento foi enviado para o Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 10 de outubro, junto com as planilhas e os áudios. Isso porque a simples menção ao presidente Jair Bolsonaro, deputado federal à época do crime, já faz com que seja necessário subir o caso, por causa do foro privilegiado.
O áudio do interfone do condomínio foi cruzado com outro áudio de Lessa pelo MP, a fim de comprovar que aquela era sua voz. Além disso, o horário batia com o que constava na planilha de entrada no Vivendas da Barra, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. “Todas as pessoas que prestam falsos testemunhos podem ser processadas”, disse Sibilio. “Se ele esqueceu, se ele mentiu… qualquer coisa pode ter acontecido. Ele pode esclarecer. Simples assim.”
O caso estava em sigilo até esta quarta-feira. Mas, segundo as promotoras, o vazamento de informações e o fato de os réus presos Lessa e Élcio já terem prestado depoimento fizeram com que as informações fossem tornadas públicas. Elas convocaram uma coletiva de imprensa para fornecer as informações. Na coletiva, o MP-RJ também divagou sobre a hipótese de que o governador Wilson Witzel (PSC) teria tido acesso ao depoimento do porteiro. Bolsonaro o acusou de ter vazado o relato para o prejudicar.
Outro ponto comentado pelas promotoras foi a suposta ordem dada pelo ex-deputado e conselheiro do Tribunal de Contas do Rio, Domingos Brazão, acusado de integrar milícia, de ordenar o crime. O inquérito da Polícia Federal o aponta como mandante. O MP do Rio de Janeiro, porém, disse que na investigação estadual “não há nenhuma prova concreta que envolva o Domingos Brazão no crime.”
Na noite de terça-feira, 29 de outubro, o Jornal Nacional veiculou reportagem mostrando que o porteiro do Condomínio Vivendas da Barra, onde reside o presidente da República, falou no depoimento (que oficialmente está sob sigilo) que horas antes do assassinato da vereadora, um dos acusados de participar do crime, o ex-policial Élcio de Queiroz, entrou no local, dizendo que iria na casa 58, de Bolsonaro, e que ao interfonar para a residência, o “seu Jair” autorizou a entrada.
Neste dia e horário, contudo, Bolsonaro, que era deputado federal, estava em Brasília e tinha, inclusive registrado presença e participado de votação na Câmara dos Deputados. No depoimento, segundo mostrou a reportagem do Jornal Nacional, o porteiro disse ainda que o carro de Queiroz, ao entrar no condomínio, seguiu para a casa de Ronnie Lessa, sargento da Polícia Militar, apontado também como participante do assassinato da vereadora, e que mora no mesmo local. O porteiro disse que voltou a ligar para a casa 58 e que o homem que o atendeu anteriormente disse que sabia para onde Queiroz estava indo.
Sérgio Moro
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, enviou um ofício ao procurador-geral da República, Augusto Aras, no qual pede a abertura de um inquérito para apurar se houve “tentativa de envolvimento indevido” do nome do presidente no caso.
Wilson Witzel
O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), negou que tenha interferido nas investigações sobre o assassinato da vereadora ou vazado detalhes do inquérito à imprensa. Em comunicado publicado no Twitter, em resposta ao presidente Jair Bolsonaro, afirmou que em seu governo, “as instituições funcionam plenamente e o respeito à lei rege todas as nossas ações”. Ele também negou ter vazado qualquer informação das investigações sobre o assassinato da vereadora e de seu motorista.
Rede Globo
Em resposta aos ataques desferidos pelo presidente, a TV Globo afirmou que “não faz patifaria nem canalhice”, mas “jornalismo com seriedade e responsabilidade”. “A Globo lamenta que o presidente revele não conhecer a missão do jornalismo de qualidade e use termos injustos para insultar aqueles que não fazem outra coisa senão informar com precisão o público brasileiro”, diz o comunicado da emissora.