Perci Guzzo *
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Há muitos anos atrás aprendi uma noção básica entre esquerda e direita. Me refiro aqui ao espectro político-ideológico. Em uma entrevista ao Programa Roda Viva, TV Cultura, Luis Carlos Bresser Pereira, economista, liberal, ex ministro da Fazenda, disse: para a direita, o mais importante é a “ordem”; para a esquerda, a “justiça”. Entre as pontas do espectro, suas nuances.
Ao longo do tempo, sempre exercitei esse conceito com partidos políticos, posicionamento das pessoas, manifestações de grupos organizados e textos de articulistas, e sempre encaixou como uma luva. Por isso compartilho com vocês. Sem a intenção aqui de dizer que um é certo e o outro, não.
Renato Janine Ribeiro, filósofo, progressista, ex ministro da Educação, disse em uma palestra aqui em Ribeirão Preto, que política é sim discutida e exercida entre esquerda e direita. Concordo. E disse mais, que no Brasil nós precisamos que a direita se mantenha democrática, deixando isolada a extrema-direita e seus arroubos golpistas.
Jogar- se nos braços de declarados extremistas para somente satisfazer sua base eleitoral foi atitude inconsequente e oportunista de muitos homens públicos na última eleição presidencial. O brio e a nobreza de um político são construídos em sua trajetória com o compromisso de discernir e ser portador do discernimento de cada momento histórico pelo qual passamos. Assim agiu Simone Tebet (PMDB) nas eleições de 2022. Ela e tantos outros sabiam do risco de um segundo mandato comandado pela extrema-direita.
O movimento mais importante a ser feito neste momento, politicamente falando, é nos dirigirmos às pessoas que prezam pela democracia, independentemente da posição ideológica, e sairmos juntos às ruas para dizer em alto e bom tom que queremos mantê-la e intensificá-la.
A polarização existiu, existe, e é saudável. Mas em que grau ela passa a ser tóxica às pessoas e perigosa à nação? Respondo: no momento em que o sentimento é aniquilar, exterminar o adversário. Nós precisamos pensar diferente: se é nosso adversário, por isso, também, tem o nosso respeito.
Mas não é apenas o alto grau de polarização que ameaça a democracia. O Brasil, por suas dimensões e suas oportunidades, faz parte das nações onde uma onda de extremistas da direita – uma ola fascista – desejam ocupar o centro do poder para submeter o regime democrático ao interesses de enormes empresas e o mercado financeiro.
O que tem levado as pessoas a optarem pelo extremo? Em um mundo em profundas transformações, quase desabando, as certezas entram em colapso. Para muitos, o modo de lidar com essa angústia, é reforçar a ordem. E salve-se quem puder.
Imbuídos desse sentimento, líderes populistas e reacionários, conseguem capturar mentes e corações, sobretudo nos pleitos eleitorais. Com medidas de enfraquecimento dos órgãos de controle e decisões que desequilibram os poderes constituídos, inicia-se o estabelecimento de uma plutocracia. As instituições públicas são erodidas e o Estado é comandado por uma casta de privilegiados. Aqui não, Elon Musk!
O líder populista reacionário é aquele que parece dar voz a setores populares, sobretudo os conservadores, mas institucionalmente decide e age reforçando a estrutura de dominação. Tiranos e suas famílias deitam e rolam em situações onde as regras constitucionais são subvertidas, o Judiciário enfraquecido e o Legislativo cooptado.
Quero acreditar que não é isso que desejamos para o Brasil, tão pouco para o mundo.
Diante de tamanha ameaça, cada um de nós em nossas instâncias coletivas, devemos deixar clara nossa posição e nossa conduta a favor do regime político que liberta as pessoas e não que as subjugue. Nada acima de ninguém.
Cabeça no lugar, meus amigos! Prudência, discernimento e coragem! Nos antecipemos e caminhemos lado a lado pela manutenção e o fortalecimento da democracia brasileira.
Fé na solidariedade.
(Igreja Nosso Senhor do Bonfim, Salvador, Bahia).
* Ecólogo e Mestre em Geociências. Autor do livro “Na nervura da folha”, lançado em 2023 pelo selo Corixo Edições