Por Maria Fernanda Rodrigues
São muitos – e muito básicos e essenciais – os cuidados com um bebê que acabou de chegar. Com uma rotina minimamente estabelecida, e acreditando que os livros podem ser importantes para a vida daquela criança, como incluir a leitura no dia? Karin Silvestre, que leu para Theo na barriga, ofereceu livros de banho e alguns que haviam sido repassados por outras mães, sentiu logo que precisava de ajuda na seleção dos livros. Foi quando descobriu A Taba, clube de assinatura que também tem o pequeno Cassiano como assinante.
“Com um ano e um mês, Theo recebeu o primeiro livro. Eu sempre ia buscar o pacote na portaria, junto com ele, e, já no elevador, eu mostrava o nome dele no remetente. Era uma satisfação imensa ver, a cada mês, ele rasgando afoitamente o pacote em busca do livro. Assim que pegava nas mãos, ele já me entregava para eu ler na mesma hora. E é assim até hoje.” Além de receber o pacote mensal, Theo frequenta a biblioteca do bairro e livrarias.
PESQUISA. O primeiro contato com a literatura ainda no colo dos pais é decisivo para que essa criança se torne uma pessoa leitora. A Pesquisa Retratos da Leitura revelou, em sua edição mais recente, de 2020, um crescimento no número de crianças leitoras no Brasil, especialmente na faixa dos 5 aos 10 anos. A influência dos pais, sobretudo das mães, e dos professores foi responsável por isso, segundo o levantamento. Na época, Zoara Failla, coordenadora da pesquisa, disse ao Estadão que a família está percebendo isso. “Quando ela lê para o filho, quando lê na frente das crianças, quando a presenteia com livro, isso faz toda a diferença”, comentou.
E quando começar? Em nova entrevista, Zoara cita Bartolomeu Campos de Queirós (1944-2012), importante nome na questão da formação de leitores. “Ao defender que o conhecimento e a leitura acontecem em quatro dimensões (o afeto, a linguagem, a imaginação e a memória), Bartolomeu nos ajuda a entender como a contação de histórias para bebês pode despertar o prazer pela leitura. A leitura de livros de história pela família ou adulto, desde a primeira infância, possibilita compartilhar emoções. Ao ler ou contar histórias, a voz, a escuta, os gestos possibilitam associar o som das palavras à emoção que a história está transmitindo. Aprimora os sentidos e a atenção tão importantes na leitura.” E possibilitam associar ideias à linguagem e despertam a fantasia.
“As crianças não cansam de ouvir uma mesma história, o que nos leva a pensar que mais importante do que descobrir o que está sendo contado, na primeira infância, o prazeroso é o que desperta a memória; a fantasia; ouvir o som das palavras, identificar os personagens, associar imagens ao que está sendo contado, e compartilhar as emoções. Enfim, o que é sentido, como nos ensina Bartolomeu”, diz ainda.
Segundo a pesquisadora, o despertar da imaginação e o desenvolvimento da oralidade, da fala, da escuta e da curiosidade pelas imagens, palavras e o que está escrito tem início nesta fase e depende do contato com materiais, brinquedos e objetos com imagens e palavras e com livros.
COMO ESCOLHER. Os clubes de assinatura têm sido uma escolha de muitos pais que querem contar histórias para as filhos e não sabem por onde começar – mas que sabem que não querem qualquer livro e, sim, bons livros de literatura.
“Assim como o brincar é uma experiência insubstituível para o desenvolvimento cognitivo, linguístico e emocional das crianças, conviver desde cedo com cantigas, parlendas, poemas e pequenas narrativas promove também conquistas importantes por meio das brincadeiras de linguagem e do “faz de conta” das narrativas”, comenta Márcia Leite, idealizadora da Pulo do Gato, uma das mais respeitadas editoras de livros para a infância.
Para ela, os livros também podem ajudar as crianças a falar sobre si e a nomear quando entram em contato com histórias que as convidem a entender o que estão sentindo, o que não conhecem, o que precisam compreender melhor. Por isso, ela explica, é importante oferecer histórias e obras em que os leitores se reconheçam, se projetem e se sensibilizem.
LIVRO PARA BEBÊ. A literatura infantil e juvenil feita no Brasil é bastante desenvolvida, mas a edição de bons livros para bebês é algo relativamente novo.
Daniela Padilha, da Jujuba, que está entre as cinco finalistas do prêmio de editora do ano da Feira do Livro Infantil de Bolonha, na categoria América Central e do Sul, conta que desde 2017 tem estudado livros que incluem o bebê na leitura e percebeu que havia poucos títulos nacionais. “A maioria era importada e mais preocupada com a materialidade (plástico, cartonado, pano) em detrimento da história, da estética. Muitos nem sequer têm autoria. Então comecei a provocar autores brasileiros a pensar nesses livros junto comigo”, diz. “A primeira recepção foi uma negativa, afinal, o que seria um livro para bebês?”
Em 2019, a Jujuba criou a coleção Literatura de Colo, que tem hoje 11 títulos – alguns deles incluídos no catálogo da Taba e de outros clubes infantis que atendem leitores desde o comecinho da vida. Como a Jujuba e a Pulo do Gato, há outras casas editoriais com um olhar atento a este novo público e publicando livros verdadeiramente literários. E outras chegando agora, de olho no Plano Nacional do Livro Didático (PNLD), que incluiu, no edital divulgado em 2021, a categoria livros para bebês. “Estamos percebendo, desde o ano passado, um crescente nas publicações para bebês. Mas muita coisa pautada no que o edital pedia, com temas, quantidade de palavras por páginas, ilustrações com cores fortes e outros pontos que vão na contramão do que se entende por bebê hoje e suas relações com o mundo”, comenta Daniela.
Com anos de experiência em educação e contato com crianças maiores, Denise Guilherme não sabia bem o que fazer com seu bebezinho de um mês quando ouviu de uma enfermeira: “Você não trabalha com livros? Não gosta de ler? Leia para ele”. Fez isso. Leu o que gostava, foi pesquisar e disso nasceu a categoria 0-3 anos do seu clube A Taba. “Muita gente acredita que a leitura é boa para o bebê, mas isso é bom para a gente também. Quando começamos a ler para as crianças, estabelece-se um novo lugar na relação com elas.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.