O pagamento do auxílio emergencial evitou, mesmo que apenas momentaneamente, um agravamento da miséria no Brasil em 2020, em meio ao choque provocado pela pandemia de covid-19. Apesar da injeção bilionária de recursos extraordinários, praticamente um em cada quatro brasileiros ainda viveu abaixo da linha de pobreza no ano passado.
São quase 51 milhões de pessoas, segundo os dados da Síntese dos Indicadores Sociais (SIS) divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta sexta-feira, 3 de dezembro. Não fossem os programas de transferências de renda para enfrentar a pandemia, incluindo também programas estaduais e municipais complementares, os 10% mais pobres da população teriam sobrevivido com apenas R$ 13 por mês.
Esse valor é equivalente a R$ 0,43 por pessoa a cada dia. Com os benefícios governamentais, esse grupo de 21 milhões de brasileiros mais pobres sobreviveu em 2020 com R$ 128 mensais por pessoa da família, ou R$ 4,27 por dia, o maior valor já registrado na série histórica da Pnad Contínua, iniciada em 2012.
Embora ainda insuficiente para uma vida livre de restrições básicas, o montante representa uma alta de 14,9% ante os R$ 111 mensais recebidos em 2019. Sem essas transferências de renda, o rendimento médio por pessoa dos 10% mais pobres teria tombado 75,9%, demonstrando a importância da continuidade da política.
Mesmo com o pagamento do auxílio emergencial, 12,046 milhões de brasileiros, o equivalente a 5,7% da população, viveram abaixo da linha de miséria no ano passado. Se excluído o recebimento de programas sociais, esse contingente de miseráveis teria subido a 27,313 milhões, ou 12,9% dos habitantes do país. Em 2019, a proporção de brasileiros na miséria era de 6,8%.
Sem os recursos obtidos através das transferências de renda, o total de brasileiros abaixo da linha de pobreza iria de 50,953 milhões (24,1% da população) para 67,729 milhões (32,1% da população). Em 2019, a proporção de brasileiros vivendo na pobreza era de 25,9%.
Pelos critérios dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas e recomendações do Banco Mundial, a pobreza extrema é caracterizada por uma renda familiar per capita disponível inferior a US$ 1,90 por dia, o equivalente a um rendimento médio mensal de R$ 155 por pessoa em 2020.
Esse cálculo considera a conversão pelo método de Paridade de Poder de Compra (PPC) – que não leva em conta a cotação da taxa de câmbio de mercado, mas o valor necessário para comprar a mesma quantidade de bens e serviços no mercado interno de cada país em comparação com o mercado nos Estados Unidos. Já a população que vive abaixo da linha de pobreza é aquela com renda disponível de US$ 5,50 por dia, o equivalente a R$ 450 mensais por pessoa em 2020.
As crianças foram, proporcionalmente, as maiores vítimas da escassez de recursos: mais de 17 milhões de crianças e adolescentes até 14 anos viveram abaixo da linha de pobreza no país, o equivalente a 38,6% da população nessa faixa etária. Nesse contingente, 3,9 milhões estavam em situação de miséria, ou 8,9% dos brasileiros dessa idade.
Além dos mais jovens, a pobreza também atinge com mais força as pessoas de cor preta ou parda. Havia quase três vezes mais negros do que brancos entre as pessoas na extrema pobreza. Cerca de 8,8 milhões que estavam abaixo da linha de miséria são pretos ou pardos, quase 75% das pessoas nessa condição, ou seja, três a cada quatro dos que estavam nessa situação. Os brancos vivendo na miséria totalizavam cerca de 3,2 milhões.
Entre os brasileiros abaixo da linha de pobreza, aproximadamente 36,8 milhões eram negros, também perto de três quartos do total, enquanto que os brancos somavam quase 13,6 milhões vivendo com esse tipo de restrição financeira. As desigualdades regionais também chamam a atenção.