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PL 529: uma aula contra a utopia do almoço grátis

O dinheiro é uma invenção da humanidade que não existe na natureza. As primeiras moedas apareceram por volta de 640 a.C. na Lídia – curiosamente um reino que não existe mais. A despeito de sua história, muita gente (liberais de oca­sião e a esquerda festiva) maldosamente insiste em maltratar um dos ensinamentos mais célebres da economia, expresso no ditado popular “there ain’t no such thing as a free lunch” (TANSTAAFL, no acrônimo em língua inglesa).

Não à toa, o prêmio Nobel da economia Milton Friedman (1912-2006) escreveu um livro em 1975 chamado Não Existe Almoço Grátis no qual mostra este conceito básico de que tudo, em economia, tem um custo – e empresas deficitárias, por exemplo, são um custo bem inútil. Talvez por esta con­cepção simples, o dinheiro é a única unanimidade universal, pois hoje é aceito em todo o mundo, a despeito de diferenças ideológicas, de crenças religiosas e cores partidárias.

Exatamente por prezar a máxima popular e principalmen­te se tratar de dinheiro público, o governador João Doria en­viou à Assembleia Legislativa o PL (projeto de lei) 529/20. Re­sumidamente, o plano de reforma administrativa e financeira do Estado defende a extinção de dez fundações, autarquias e empresas, o corte de 5.600 vagas no funcionalismo através de um programa de demissão voluntária e o encerramento de benefícios fiscais de vários setores.

Embora o governo paulista reconheça que, em condições normais, de não pandemia, não proporia uma reforma deste porte, é preciso lembrar dois aspectos: estamos falando de diversos órgãos deficitários e, o mais importante, o déficit de 2021 será de R$ 10,4 bilhões.
Apenas alguns exemplos.

A Furp (Fundação para o Remédio Popular) produziu e vendeu em 2019 apenas um terço de sua receita: R$ 94,4 mi­lhões de R$ 277,8 milhões. Pior: seus produtos ainda são mais caros do que os produzidos pela iniciativa privada.

Na EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Ur­banos), os prejuízos somam R$ 1 bilhão. Vale dizer inclu­sive que os projetos específicos de mobilidade urbana nem estão nesta empresa, mas sim na Secretaria de Transportes Metropolitanos.

Já no Zoológico, outra fundação a ser extinta como prevê o PL 529, o déficit anual é de R$ 6 milhões. Com um valor três vezes maior de prejuízos, com R$ 20 milhões, está o Da­esp (Departamento Aeroviário do Estado de SP).

Fundamental esclarecer duas coisas: 1- todos os serviços essenciais prestados serão mantidos, seja com a absorção pela própria administração pública ou pelo setor privado – caso do Daesp, que realiza um plano de desestatização a ser anun­ciado no momento oportuno pelo Governo; e 2- O resultado disso tudo é a maior capacidade do Estado de investir mais em projetos sociais e em infraestrutura, o que garante uma sociedade mais inclusiva e mais justa.

Na Alesp, já há cerca de 600 emendas, a maior parte delas contrárias ao PL. Natural haver debate e mais normal ainda discutirmos o assunto. O que não podemos esquecer é que re­almente não existe almoço grátis. Em se tratando de dinheiro público, o ditado deveria valer em dobro.

A não ser que a oposição festiva (aquela que não sabe quem foi Friedman e adora “verdades alternativas”) queira que as finanças do Estado de SP tenham o mesmo que fim que o Reino da Lídia.

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