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Peteleco, o cachorrinho sambista

Em 1957 uma música começou a fazer sucesso nas rádios de São Paulo. Era a canção Deus Te Abençoe, gravada pela Dupla Ouro e Prata. Mas o público se confundia com o autor da música, um tal de Peteleco. Quem seria o desconhecido compositor, afinal? A dúvida foi desfeita na edição de julho daquele ano da Revista do Long-Playing.

Peteleco era o cãozinho de estimação de Adoniran Barbo­sa. “Por que não teria o conhecido cômico usado seu próprio nome? Tem exclusividade com os Demônios da Garoa ou achou que o samba tão bonito não era digno de seu nome?”, questionou o jornalista Francisco D. Silva na revista.

Os motivos que levaram Adoniran a “lançar” seu fiel amigo na música permanecem obscuros. Pode ser que Adoniran achasse que talvez essas composições não fossem fazer sucesso e para não abalar o seu prestígio, resolveu colocar o nome de seu fiel amigo. Mas a pata do nobre vira-lata seguiu deixando marcas na música popular brasileira. Em alguns casos, para que Adoniran pudesse fazer parceria com artistas de outros sindicatos e associações de direitos autorais.

Contabiliza-se que Peteleco foi “autor” de cinco sambas. Além de Deus Te Abençoe, assinou sozinho as canções Pra Que Chorar e Onde Vai, Leão. Em parceria, está com o nome registrado em É da Banda de Lá (com Irvando Luiz), Nóis Não Usa as Bleque Tais (com Gianfrancesco Guarnieri) e Mãe, Eu Juro (com Marques Filho, como o cantor Noite Ilustrada assi­nava suas músicas à época).

O último caso é fruto de uma das mais importantes polêmi­cas da música brasileira. De acordo com entrevistas dadas por Noite, ele é o verdadeiro autor da melodia de Bom Dia, Triste­za, que foi creditada somente a Adoniran e Vinicius de Moraes. A letra da música foi feita por Vinícius a pedido de Aracy de Almeida, que era muito amiga de Vinícius e de Adoniran. Ara­cy pegou a letra e deu a Adoniran para musicá-la.

Entretanto, pela versão um tanto “nebulosa” de Noite Ilus­trada, Adoniran teria pedido que ele fizesse a música e, na hora de registrar, excluiu seu nome. Há quem discorde. Segundo Ayrton Mugnaini Jr., autor da biografia de Adoniran, é discu­tível essa versão. “Com todo o respeito a Noite Ilustrada, não creio ter sido ele o autor da melodia”, explica.

Numa entrevista a rádio Aracy de Almeida questiona Noite Ilustrada ao vivo e o chama de mentiroso, confirmando a sua versão sobre a autoria da música. Mas o fato é que, logo após a polêmica, Noite – que estava em início de carreira – o convi­dou para terminar um samba intitulado Mãe, Eu Juro. Adoni­ran aceitou, mas registrou o nome de seu cãozinho. Noite ficou magoado e os dois nunca mais se falaram.

O amor de Adoniran por Peteleco, porém, permaneceu inabalável. Mais do que “parceiro musical”, era o seu grande companheiro. O cachorro vivia ao lado do cantor e também tinha jeito de artista. Ele próprio buscava os doces na padaria, numa prateleira mais baixa, para deslumbramento do padeiro. Nas constantes viagens a Santos, gostava de ficar sobre o peito do dono, enquanto boiava no mar.

E foi na cidade que o cachorrinho morreu, após comer um alimento estragado. Acredita-se que o samba “Não quero en­trar”, lançado em 1968, tenha sido composto em homenagem a Peteleco: “Eu voltei somente pra buscar/ Meu cachorrinho, meu cobertor e meu violão…”.

Salve Peteleco, o cachorrinho sambista, salve Adoniran e a música popular brasileira!

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