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Personagem: 60 anos com Corauci Neto animado no rádio

O radialista Corauci Neto - Foto Alfredo Risk

Radialista completa seis décadas trabalhando ininterruptamente com boas histórias

Ainda criança, com menos de dez anos de idade, Corauci Neto tinha uma certeza: iria ser artista. Sua maior paixão era o rádio. Com 18 anos estreou na profissão e não parou mais. No próximo dia 2 de outubro completa 60 anos empunhando microfones.

Passou pelas principais emissoras AMs de Ribeirão Preto. Neto não quis deixar a cidade para trabalhar em grandes centros e construiu um legado. Falar sobre a história do Rádio na cidade, sem mencioná-lo é esquecer um dos principais capítulos radiofônicos do interior paulista.

“A gente era criança. Ele subia num caixote de sabão e ficava discursando como o Getúlio (presidente Getúlio Vargas). Ficava apresentando cantores e cantava músicas do Orlando Silva, Carlos Galhardo e outros cantores da época. A gente não sabia na época, mas hoje é claro pra mim que ele nasceu para fazer isso”, conta o irmão mais novo de Neto, o ex-deputado federal Valdemar Corauci Sobrinho.

Neto diz que não sabe como começou sua paixão pelo rádio. Mas tinha certeza que nascera com o dom de comunicar. “Eu na juventude fiz vários testes. Gravava algumas chamadas, mas acredito que nem os donos das emissoras e nem quem contratava ouviam”, brinca.

Começou a trabalhar com nove anos de idade na fábrica de sapatos Castaldelli. Ficou lá quase dez anos. Foi quando viu um anúncio de jornal que uma nova emissora estaria abrindo as portas na cidade, a Rádio Brasiliense.

Escondido dos pais foi fazer o teste. “Havia uma fila enorme. Dobrava quarteirões. Mais de 300 pessoas. Resolvi ir ao cinema e esperar o meu horário. Lembro do filme, era Lucrécia Bórgia”.

Das centenas de candidatos, oito passaram pelo crivo do diretor Sebastião Porto. Dos oito, quatro foram contratados, sendo Corauci Neto um deles.

Com a possibilidade de realizar o sonho, Neto enfrentou um dilema. O dinheiro que ganhava na fábrica de sapatos era fundamental para a sobrevivência da família. “Na época a gente tinha a tal da estabilidade. Se você completasse dez anos na empresa, a adquiria. Ele estava prestes a ganhar e resolveu apostar na rádio. Mas nossa mãe ficou muito preocupada”, lembra o irmão Sobrinho.

“Eu conversei com o dono da fábrica e ele me deixou tranquilo. Dizendo que se eu precisasse, as portas estariam abertas. Fui pra rádio, mas minha mãe rezava todos os dias, pois ouvia na emissora que ela era de caráter experimental”, conta com bom humor.

Em 2 de outubro de 1959 ele estreava o programa “Em Busca do Sucesso”. Não parou mais. Neto diz que seu grande ídolo no rádio foi Porto Alegre, um radialista que tinha muitos conhecimentos gerais e musicais. “Eu ficava ouvindo o Porto. Ele não era sisudo. Tinha um jeito diferente e foi influenciado por ele”, revela. “Eu peguei isso do Porto Alegre e procurei ser mais alegre. Um dia, o senhor Antenor Pimenta, pai de Helton Pimenta, disse que eu era alegre, que eu era o palhaço  do rádio, no sentido de levar bom humor. Acho que isso me diferenciou dos demais. Hoje a gente ouve esse tipo de programa nas rádios FMs”.

Depois de um ano na Rádio Brasiliense foi contratado pela Rádio Cultura, onde ficou sete anos. Fez enorme sucesso e despertou o interesse da renomada PRA-7 (hoje Rádio Clube). Foi para a emissora e o sucesso foi maior. Os estúdios ficaram pequenos pelo tanto de ouvintes que iam acompanhar os programas. Teve que fazer programa no auditório, que sempre ficava lotado. Depois da PRA-7, foi para a Rádio 79, onde permaneceu 12 anos. Da 79 voltou para a Clube e depois novamente para a 79, ficando período igual de quatro anos em cada. Há 19 anos está na Rádio CMN.

Programas marcantes

Nesses 60 anos muitos programas marcantes. Corauci Neto respirava rádio. Tinha programa pela manhã, tarde e noite. Corauci Neto Show, Pick Up de Ouro e É Proibido Falar foram sucessos estrondosos na cidade.

Outro programa de sucesso foi o Clube do Rock. “Eu curto rock. Sou fã do Elvis Presley. E naquela época não tinha outro caminho. Ou era ouvir disco ou rádio. Não é como hoje, era muito mais difícil”.

Mas o expediente não terminava a meia noite, no fechamento da rádio. “A gente saia todos os dias para fazer serenata”, conta o radialista Helton Pimenta, que herdou o programa Clube do Rock de Corauci Neto. “Fizemos serenatas de 1963 a 1966. Só paramos porque casei e ai não dava mais”, brinca Pimenta.

Pimenta e Neto formaram uma dupla que além das serenatas fazia apresentações em circos e cinemas. “Viajamos a região inteira e sempre lotava”, lembra Pimenta. “Além de Corauci Neto e Helton Pimenta, a gente pintava o rosto como palhaços e éramos o Pim Pim (Helton) e Pim Pão”, lembra Neto.

Balanga Beiço e as apostas

Outro programa famoso Neto fez ao lado de Luiz Mozart, o Tirirca. Foi o Balanga Beiço. “O programa era do Tiririca. Ele produzia tudo. Mas eu tinha facilidade em criar personagens. Fazia vozes de malandro, criança, mulher, idoso. Era uma sátira policial”.

As apostas dos dois apresentadores, nas épocas de clássicos dos times da cidade, o Come-Fogo, eram um dos pontos altos do programa. Tiririca defendia as cores do Botafogo e Corauci Neto do Comercial. “E era pra valer. A gente tinha esse espírito mesmo e o povo gostava das discussões e das apostas”.

Neto, com as derrotas do Comercial, teve que entrar no córrego Retiro Saudoso, comer grama e se vestir de mulher e beijar o atacante Geraldão. “Mas eu ganhei muitas também (ri). Ele (Tiririca) teve que se vestir de margarida e varrer uma praça. Teve que puxar um burro pelas avenidas da cidade, e outras”, ri.

Aliás, familiares dizem que Neto era botafoguense e se transformou em comercialino por conta do programa. “Ele me levou pela primeira vez ao estádio Luiz Pereira para ver o Botafogo. Ele virou comercialino porque os dois eram botafoguenses e tiraram no par ou ímpar”, lembra Corauci Sobrinho. “Na verdade eu peguei um período que só tinha o Botafogo e torcia pelo Botafogo. Mas quando ia no estádio, com o programa no ar, eu era ofendido. Passei a frequentar apenar o estádio do Comercial”, revela Neto.

Gafes

Procuramos alguns amigos do radialista para saber de alguma gafe de Neto no ar. “Impossível, ele é perfeccionista”, diz o radialista Antônio Carlos Morandini. “Não tem. Não me lembro”, fala Sebastião Xavier. “Realmente erros no microfone ele não comete”, diz Corauci Sobrinho.

Além de perfeccionista, ele procurava ser o primeiro a trazer novidades aos ouvintes. Um exemplo é que por anos, quando não havia internet, ele era o primeiro a tocar na rádio o disco de Roberto Carlos. “Meu irmão ia pra São Paulo e a gente comprava no dia do lançamento e trazia para tocar em primeira mão”. “Eu sou detalhista. Acho que a pessoa tem que se preparar e dar o seu melhor seja onde for, no meu caso nos microfones. É o mínimo que posso fazer”, diz Corauci Neto que continua firme comunicando pelas manhãs e tardes na Rádio CMN.

Primeiro animador de TV em Ribeirão e 17 discos gravados

Os programas de rádio no passado eram acompanhados in loco nos estúdios. Os programas de auditório atraiam um grande público. Corauci Neto lembra que quando apresentava seus programas pela antiga PRA-7, dezenas de pessoas iam vê-lo. “Tivemos que começar as apresentações no auditório”. A experiência do auditório o levou à TV. Ele foi, em 1962, pela TV Tupi, o primeiro apresentador animador de TV na cidade.

Outra experiência na TV, na época, eram as participações, também na TV Tupi, do programa dominical Caravelas da Saudade. “Eu cantava uma música. O programa tinha grande audiência”, conta. A participação na TV proporcionou a oportunidade de fazer parte de um especial no Maracanãzinho, cantando para mais de 20 mil pessoas.

Na década de 80, era figura constante nas festas, feiras e exposições realizadas em várias cidades da região. Corauci Neto levava para a cidade artistas convidados, bailarinas, além é claro, de cantar as suas músicas. Durante os 60 anos de rádio, ele gravou 17 LPs, dois CDs e um DVD.

O radialista, que foi vereador por 26 anos, diz que ter aceito entrar na disputa eleitoral foi um dos seus arrependimentos. “Quando eu fui eleito, os shows foram parando. Os prefeitos me ligavam ao partido que fui eleito e eles eram de outros e começaram a me boicotar. Se eu pudesse voltar atrás, isso eu não teria feito. O palco e os shows me davam muito prazer como profissional”.

Quase teve que abandonar os microfones.

No auge da carreira, Corauci Neto passou um sufoco. Um problema na garganta o impediu de falar. Procurou cinco médicos e todos foram unânimes em dizer que era para ele abandonar a carreira.

“Realmente foi um período difícil. Ele ficou muito triste. Imagina, tinha a maior audiência do rádio, amava o que fazia e de uma hora para outra ouve que tinha que parar com tudo”, lembra o radialista Sebastião Xavier.

Neto, com a ajuda o irmão Corauci Sobrinho buscou apoio em São Paulo. Fez uma cirurgia e ficou parado um mês para se recuperar. “Esse é um momento divisor na carreira também. Ele prometeu que se voltasse a falar iria usar o microfone para ajudar as pessoas. Voltou e cumpre a promessa até hoje. Olha, são milhares de pessoas que ele ajudou pelo microfone. Eu tive a honra na ocasião da recuperação dele de apresentar o Pick Up de Ouro, foi um sonho que realizei”, conta Xavier.

“Foi um momento muito difícil, mas a fé que eu tinha que era grande ficou maior, pois o que aconteceu foi um milagre. Enquanto eu puder, eu vou ajudar as pessoas pela rádio. Vou homenagear Maria, mãe de Deus e o meu padroeiro São Judas Tadeu”, finaliza.

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