André Luiz da Silva *
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Em nossas relações interpessoais, profissionais, diplomáticas ou empresariais, o ato de buscar o perdão de alguém é visto como um gesto de humildade e reconhecimento do erro cometido. Ao pedir para ser perdoado, o indivíduo ou instituição demonstram disposição para aprender com suas falhas, crescer e evitar repetir comportamentos prejudiciais no futuro. Alguns pedidos de perdão não servem para corrigir determinadas situações, mas acompanhados de alguma forma de reparação podem ajudar a estancar feridas históricas.
Em 1992, durante as comemorações dos 500 anos da chegada dos europeus à América, o Papa João Paulo II pediu perdão a indígenas e negros pelas injustiças históricas cometidas em nome da evangelização, o gesto foi repetido de modo mais contundente pelo Papa Francisco em 2015.
Nesta semana, o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa adotou postura semelhante do dizer que o país “assume total responsabilidade” pelos crimes cometidos durante o período colonial, entre os quais a escravidão nos dois lados do Atlântico, o massacre de povos indígenas e o saque de bens em terras estrangeiras. Dos 12,5 milhões de africanos traficados, Portugal foi responsável por cerca de 6 milhões.
A necessidade de reparação por Portugal e outros países europeus em relação à escravização de africanos durante o período colonial é um tema complexo e sensível que tem sido debatido intensamente nas últimas décadas. A escravidão transatlântica foi um dos capítulos mais sombrios da história da humanidade, marcado pela brutalidade, exploração e violação dos direitos humanos mais fundamentais.
Hoje, há um consenso crescente de que as sequelas daquele período histórico ainda reverberam nas sociedades contemporâneas, especialmente nas comunidades afrodescendentes que continuam a enfrentar desigualdades estruturais e socioeconômicas decorrentes do legado da escravidão. Nesse sentido, a necessidade de reparação não se limita apenas a uma questão moral, mas também tem implicações políticas, sociais e econômicas, entre as quais, investimentos em educação, saúde e desenvolvimento financeiro em comunidades afetadas, bem como iniciativas para preservar e promover a cultura e a história africana e afrodescendente.
Holanda e Canadá, já criaram planos para indenizar e compensar comunidades afetadas pelo trabalho escravo de povos originários e em territórios coloniais. Na contramão da história, até hoje em Portugal, pessoas ligadas a partidos de ultradireita costumam tratar aquele nefasto período como uma fonte de orgulho. Por aqui, determinados grupos políticos, econômicos e religiosos, se opõem às políticas públicas reparatórias e às ações afirmativas.
O debate sobre as reparações envolve questões complexas, como quem deve ser responsável por pagar por elas, como determinar quem são os beneficiários legítimos e como garantir que as medidas adotadas sejam eficazes e justas. As reparações não podem ser vistas como uma solução única para resolver todas as injustiças históricas. Elas devem ser acompanhadas por esforços contínuos para promover a justiça social, a igualdade e o respeito pelos direitos humanos em todas as áreas da sociedade.
A questão das reparações pela escravidão colonial é um lembrete poderoso da necessidade de enfrentar honestamente o passado e reconhecer os danos causados, ao mesmo tempo em que se trabalha para construir um futuro mais justo e equitativo para todos. O pedido de perdão apresentado pelo presidente de Portugal é um começo, mas somente surtirá efeito se as palavras se transformarem em ações.
* Servidor municipal, advogado, escritor e radialista