O ouvidor em exercício da Polícia do Estado de São Paulo, Walter Forster Júnior, abriu procedimento e pediu que o Departamento de Polícia Judiciária do Interior (Deinter-3), a Corregedoria da Polícia Militar, o Ministério Público Estadual (MPE) e até o Instituto de Criminalística (IC) investiguem a ação de PMs na abordagem do último domingo, 7 de janeiro, na Vila Reis, em Jardinópolis – o motorista Antônio Donizete Delbui, de 53 anos, morreu depois de ser atingido por dois tiros.
Os disparos foram feitos por um policial militar que estava sendo agredido com cadeiras, pedras e pedaços de pau. “O caso teve grande repercussão. Vamos acompanhar e avaliar se houve abusos. Pedimos, inclusive, exame de balística e outros procedimentos periciais”, diz Forster Júnior. A notícia publicada na edição do Tribuna desta terça-feira (9) alertou a Ouvidoria da Polícia.
O major Marco Aurélio Gritti também conversou com o Tribuna. Segundo ele, dois inquéritos já foram instaurados, um pela Polícia Civil e um Inquérito Policial Militar (IPM) pelo Comando de Policiamento do Interior Três (CPI-3) – a Corregedoria da PM já investiga o caso. Assim que for concluído, o civil será encaminhado ao Ministério Público. O IPM será avaliado na esfera da Justiça Militar. “A Corregedoria da PM é automaticamente notificada, é um procedimento padrão quando uma operação envolve lesão de civis, está no Código de Processo Penal Militar”, explica o major.
Todo IPM passa obrigatoriamente pela Corregedoria. O prazo para conclusão da investigação é de 40 dias. O PM autor do disparo fraturou o braço e teve outras lesões mais leves. O parceiro dele também está de licença médica. Nove testemunhas foram ouvidas pela Polícia Militar no mesmo dia, ainda no local da confusão. Segundo a corporação, o filho de Delbui foi abordado pela dupla da Polícia Militar e ficou constatado que o licenciamento do veículo venceu havia três anos.
Os dois PMs comunicaram que o carro seria apreendido e, nesse momento, o rapaz teria jogado um líquido inflamável para atear fogo no automóvel, mas algumas pessoas estariam no veículo. Enquanto um dos policiais retirava uma criança, o outro passou a ser agredido pelo motorista de 53 anos e outras pessoas. Já no chão, Delbui teria agredido o PM com uma cadeira de plástico várias vezes. Quando ameaçou pegar uma cadeira de ferro, o policial efetuou os disparos. Ele alega legítima defesa.
A Secretaria de Estado da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) emitiu nota ao Tribuna. “A Polícia Civil informa que a ocorrência é investigada por meio de inquérito policial. O caso foi registrado como morte decorrente de oposição à intervenção policial, incêndio, lesão corporal e localização e apreensão de objeto na Delegacia de Jardinópolis. A Seccional de Ribeirão Preto informa que até o momento não recebeu nenhuma comunicação oficial por parte da Ouvidoria”.
E finaliza: “A Corregedoria da Polícia Militar acrescenta que acompanha o caso e que instaurou IPM para apurar a conduta dos policiais militares na ocorrência. O policial diretamente envolvido no confronto teve afastamento médico após fraturar o braço e seguirá em atividades administrativas durante a apuração.” A versão da família de Delbui e dos moradores da Vila Reis diverge da oficial. Além do motorista e dos dois PMs, mais três pessoas ficaram feridas.
O tumulto começou quando o filho da vítima – dono do carro averiguado por suposta condição irregular – foi comunicado que o veículo seria apreendido. Ele reagiu com ofensas e depois, agressões. “Alguns populares, vizinhos e amigos se insuflaram também contra os policiais e passaram a agredi-los. Eles foram atingidos por cadeiradas, pedradas e pauladas. Durante as agressões, a viatura também foi danificada”, disse o tenente PM Ronaldo Nogueira Júnior.
Antônio Donizete Delbui, pai do proprietário do carro, teria, segundo o tenente Nogueira, participado das agressões. “Enquanto tomava cadeiradas, um dos policiais, que já estava no chão, continuou sendo agredido e não teve outra forma de se defender, senão realizar disparo de arma de fogo. Um dos agressores tomou dois tiros, um no pé e outro no abdômen e foi socorrido”, afirma o policial.
O motorista foi levado ao Pronto-Socorro de Jardinópolis, mas não resistiu aos ferimentos. O corpo foi trasladado para necropsia no Instituto Médico Legal (IML) de Ribeirão Preto. Os policiais militares foram atendidos no mesmo hospital com escoriações e um deles, com luxação no braço, foi imobilizado. Em seguida, todos foram liberados.
A família do motorista questiona os disparos realizados pelo policial militar, afirmando que a ação foi desproporcional. Filho da vítima, Celso Donizete Delbui diz que o pai apenas empurrou o PM porque queria proteger o irmão. Ele diz que não havia a necessidade de revide com disparos. “Está certo, empurrou, deu desacato, prende, é um serviço deles. Deu desacato, tem que prender. É o serviço deles, não sou contra, mas não tinha a necessidade de matar meu pai”, diz.
Mulher do motorista que foi abordado, Carla Gisele de Souza foi atingida na testa por um tiro de bala de borracha e também afirmou que os PMs agiram com violência, principalmente porque havia crianças no meio do tumulto. Ela diz que também apanhou.
Segundo balanço da Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo, no primeiro semestre de 2017, na área do Deinter-3 e do CPPI-3, que envolve Ribeirão Preto e mais 92 cidades, foram registrados cinco homicídios em que policiais civis e militares aparecem como suspeitos.
Outras quatro são de autoria desconhecida. Também foram denunciados nove casos de constrangimento ilegal, sete de abuso de autoridade (agressão), cinco de ameaça, um de assédio moral e duas invasões de domicílio. No ano passado, dois PMs morreram assassinados em Ribeirão Preto.