Apesar de já ter vacinado grande parte da população temos que lamentar que alguns brasileiros ainda se recusam a receber vacinas, repetindo absurdos do passado, agora estimulados por absurdos vocalizados pelo Presidente da República. Parece brincadeira, mas foi ele mesmo que disse que a vacinação transformaria pessoas em jacarés ou que tornaria os vacinados mais susceptíveis à AIDS.
Não é a primeira vez que os processos de vacinação recebem manifestações de ignorância científica e humanística. Um dos maiores nomes da medicina brasileira, Oswaldo Cruz passou por coisas desse tipo. A grande diferença é que ele nasceu em 1872 e viveu até 1917. Portanto não assistiu grandes milagres da ciência, como os transplantes de órgãos, a chegada do Homem à Lua, a Endoscopia com fibras ópticas, a Ressonância Magnética e tantos outros. De certa forma, todas essas vitórias da Ciência tornam mais incompreensíveis essa nova “revolta” contra a vacina.
Oswaldo Cruz, no início do século XX, mostrou ao mundo a importância do saneamento básico e da vacinação preventiva no combate às epidemias. Capital do Brasil, o Rio de Janeiro, na descrição do Prof. Joffre Marcondes de Rezende, “era uma cidade imunda, doentia, infestada de ratos, de mosquitos, onde grassavam as piores doenças epidêmicas da época: febre amarela, peste bubônica, cólera e varíola. Os navios procedentes da Europa recusavam-se a fazer escala no Rio de Janeiro e iam direto a Buenos Aires”.
Em 1902, Rodrigues Alves foi eleito presidente da República e diante da situação calamitosa em que encontrou o Rio de Janeiro, nomeou como prefeito da cidade o engenheiro Francisco Pereira Passos e como Diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública o médico sanitarista. Deu a eles amplos poderes e autonomia de ação. Oswaldo Gonçalves Cruz era paulista, nascido em Paraitinga. Após ser Graduado em Medicina no Rio de Janeiro foi para Paris, onde, no Instituto Pasteur, se especializou em Microbiologia e Saúde Pública.
Na divisão de trabalho, enquanto Pereira Passos agia na reurbanização da cidade, Oswaldo Cruz lutava contra as doenças epidêmicas, especialmente a febre amarela, a peste bubônica e a varíola. Criou a “Brigada Mata-mosquitos”, para vistoriar todas as residências e eliminar os focos de reprodução do Aedes aegypti, agente transmissor do vírus da febre amarela. Não era tarefa fácil e os agentes mata-mosquitos iam acompanhados de policiais, já que muitos moradores se recusavam a permitir a inspeção.
Para o combate à peste bubônica precisava fazer a desratização da cidade. Oswaldo Cruz apelou para o auxílio da população, “orientando-a sobre a maneira de envenenar os ratos e pagando cem réis por rato vivo ou morto. Houve quem criasse ratos em casa para vender às autoridades sanitárias” (Jofre Marcondes….). A prevenção do cólera foi alcançada com as obras de saneamento básico e medidas higiênicas. Restava a varíola e para combatê-la só havia um meio – a vacinação obrigatória –, pois parte da população recusava a vacinar-se.
A lei da vacinação obrigatória desencadeou uma campanha contra Oswaldo Cruz. A população, médicos homeopatas e muitos políticos de projeção colocaram-se em oposição à lei, que foi taxada de inconstitucional, pois “feria liberdade individual”. Em novembro de 1904 Rodrigues Alves foi pressionado a demitir Oswaldo Cruz, e se recusou a fazê-lo, o que provocou um movimento armado, com a participação de militares, para depor o presidente da República, episódio que ficou conhecido como “Revolta da Vacina”.
Revogada a lei, a população foi, aos poucos, aderindo à vacinação ao constatar a sua eficácia em prevenir a doença. A cidade tomou novo aspecto com a remodelação urbana, a higienização e o desaparecimento gradativo das doenças epidêmicas. O trabalho de Oswaldo Cruz foi reconhecido internacionalmente.
Após o sucesso alcançado com o saneamento do Rio de Janeiro, Oswaldo Cruz lançou-se à sua maior empresa, que foi a da institucionalização da pesquisa médica científica no Brasil, com a fundação do Instituto de Manguinhos, hoje Instituto Oswaldo Cruz. Oswaldo Cruz faleceu em 1917, na cidade de Petrópolis, com 45 anos incompletos (Joffre Marcondes de Rezende).